Competências Humanas e a Liderança

Por João Nuno Bogalho, Gestor de Pessoas. Coordenador de pós-graduações no Instituto Piaget
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Penso que será aceitável afirmar que uma das classificações mais comuns de competências assenta nos conceitos de hard e soft skills. De forma simplista, associando as hard às competências mais técnicas, mais relacionadas com o core das funções, e as soft às mais comportamentais e de gestão e relacionamento inter-pessoal.

Também será consensual a ideia de que desenvolvemos métricas cada vez mais aprofundadas, detalhadas e assertivas para aferir níveis de proficiência das hard, porque as entendemos como críticas para o desempenho de cada função. E, até aqui, nada de mal. Pelo contrário.

O déficit surge quando, na realidade, temos uma dificuldade objetiva e assumida de dimensionar, e aferir, a proficiência das ditas soft. Na verdade, continuamos mais focados no saber fazer do que no saber ser.

Quando a gestão evolui para que as pessoas tenham cada vez mais protagonismo em várias dimensões da gestão e da vida organizacional, em que promovemos a capacidade crítica, a inovação, a contribuição, o  empreendedorismo, a liderança, a gestão de conflitos, o assumir de responsabilidades individuais, a confiança, a fidedignidade, a frontalidade, a verdade, precisamos de valorizar um set de competências bastante diferente. Estas competências “humanas” evidenciam-se em dimensões, como por exemplo, escuta ativa, empatia, paciência, capacidade de ter conversas difíceis, e de ter discussões efetivas e produtivas, como dar feedback difícil, de forma construtiva e não destrutiva, confiança e fidedignidade.

A questão é que temos variadíssimas formas de medir o desempenho e tendencialmente muito poucas de medir as “competências humanas”. E como tal perpetuamos aqueles modelos em que valorizamos o desempenho, promovendo o desempenho, não valorizando a Pessoa de forma equitativa. Consequentemente, vamos construir líderes assentes no desempenho – as hard skills – e não nas suas competências humanas.

Numa época em que as competências técnicas estão cada vez mais democratizadas, mais fáceis de disseminar e assimilar, precisamos encontrar soluções que nos ajudem a encontrar, formar, desenvolver e reter as boas pessoas. Porque são as “boas” pessoas aquelas que corporizam os nossos valores, a nossa cultura, a nossa forma de ser e estar, os nossos princípios. São estas que são modelos para os outros, que motivam, ajudam e consolidam a nossa organização. Ajudam na construção da moral da equipa e na performance de todos os outros.

É um erro manter modelos em que se promove à liderança pelo desempenho, sem considerar a dimensão das competências humanas. É um erro entender que pelo fato de desempenhar de forma excelente uma função, a pessoa tem competências para liderar outras pessoas a fazer essa função em que era excelente. O eterno e repetido princípio de Peter, em que a pessoa é promovida até à sua incompetência. Tornando-se até um elemento tóxico na organização.

Os verdadeiros líderes só o são realmente se a sua autoridade for reconhecida pelos pares e pelos elementos das suas equipas. E não porque a autoridade funcional o determina. Todos sabemos isto. No entanto, do alto da gestão, dificilmente conseguimos identificar e potenciar estas pessoas. Mas as nossas pessoas na organização sabem-no muito bem, e com bastante facilidade. Basta perguntar, procurar a sua opinião. E ter coragem para assumir as discrepâncias.

Quando procuramos em quem confiar, a quem seguir como referencial; quando identificamos quem nos motiva, quem nos leva a fazer mais e melhor cada dia, a querer aprender e replicar, não visualizamos as competências técnicas. Identificamos quem melhor corporiza as competências humanas. E esta opinião tende a ser muito consensual nas equipas.

São esses os líderes.

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