Dores de Crescimento

Por João Nuno Bogalho, Gestor de Pessoas. Coordenador de pós-graduações no Instituto Piaget
https://www.linkedin.com/in/jnfbogalho/

De forma muito leiga, diria que as Dores do Crescimento surgem na criança que cresce muito rápido, quando o crescimento muscular não acompanha o crescimento ósseo. Não sendo propriamente uma doença, não deixa de causar desconforto e fases de vida com mais dor. Sendo que não há muito a fazer para além de aliviar a dor, e deixar que o tempo resolva e tudo se ajuste.

Sendo uma sintomatologia do ser humano, ela está bem presente nas organizações, principalmente nos primeiros anos de vida. Mas, ao contrário do ser humano, em que é apenas com o tempo que tudo se resolve, nas organizações, pelo contrário. As dores de crescimento têm que ter intervenção.

O caso que identificaria como mais típico, e crítico também, de dores de crescimento organizacional, é aquele momento em que a “startup” começa a alavancar o negócio, e a contratar mais e mais pessoas. Apontaria a barreira das 20 pessoas como o ponto em que se começam a sentir as primeiras dores de crescimento.

É verdade que chegar a este momento é, em si mesmo, um sucesso da própria startup, e são muito poucas as que chegam a este momento. Mas, as que chegam, deverão ter esta noção e preparar-se para isso.

E porquê dores de crescimento?

O chamado “ambiente startup” é dos melhores que há para os talentos trabalharem e entregarem toda a sua competência.

As estruturas são muito flat; a comunicação acontece a todos os níveis e áreas da empresa; todos se sentem facilmente parte do processo; as possibilidades de crescimento são evidentes e rápidas; o sentimento de pertença e contribuição é permanente; a remuneração variável é muito direta ao desempenho individual; o ambiente é exigente, mas altamente motivador e gerador de satisfação; entre outras dimensões importantes.

Mas à medida que a empresa cresce no número de pessoas, estas realidades começam a dissipar-se e a transformar-se rapidamente, de pontos fortes e agregadores, para ameaças e geradores de stress e até confusão. A sensação de desorganização.

As preocupações de estruturação de políticas e estratégias de gestão da empresa no geral, e de gestão de recursos humanos em particular, tendem a ser deixadas para “quando for preciso”. Porque no seu início a empresa procura focar-se no seu produto/serviço e torná-lo atrativo e viável com a máxima brevidade possível. E toda a gestão tende a ser circunstancial, ao ritmo da necessidade, em função das prioridades do momento e dos ditames do mercado.

Mas, felizmente, as boas startups crescem. E, de repente, passa-se de 10 para 20 pessoas, e logo às 30 ou mais. E exponencialmente daí em diante. De repente, a estrutura flat evidencia as suas limitações; a comunicação já não é tão viável com todos os elementos da equipa; as reuniões de coordenação tornam-se difíceis e prolongadas; surgem as ineficiências e a dificuldade de coordenar e agregar; a dúvida de como crescer e para onde, e tantos outros sintomas de dor nas pessoas e na própria organização.

Há que “organizar a casa”. Começar a estruturar, a criar equipas, coordenações, lideranças, fluxos de comunicação diferentes, a olhar para a equidade interna, e tantas outras dimensões.

É que, contrariamente à recomendação no caso das dores de crescimento na criança ou jovem, em que o tempo resolve, nas organizações o tempo mata. A inação e o prolongar da dor é a pior solução. Temos que crescer, organizar e estruturar para enquadrar, e potenciar, o crescimento. Com a inteligência superior de conseguir fazê-lo sem perder a génese, a cultura, o ambiente que fez com que a organização chegasse aqui.

Defendo eu que o absolutamente crítico nesta fase, assenta em duas dimensões. Uma visão clara de quem somos, para onde e como queremos ir, amplamente partilhada e vivida com e pelas pessoas. Acompanhada da capacidade de saber escutar e entender as pessoas, porque muita da solução estará nelas.

Porque as dores de crescimento existem, são reais e doem. Mas são fantásticas demonstradoras de sucesso e uma fantástica oportunidade para fazer bem.

Venham essas dores de crescimento.

Ler Mais