E nada será como antes…

“Esta poderia ser uma conclusão simples para quem, como eu, teve oportunidade de participar na International Conference and Exposition da American Society for Training & Development no passado mês de Maio.” 

Por Filipe Carrera, Consulting, Training & Coaching

Este evento anual reuniu em Orlando, Florida, mais de 8500 participantes, de 80 países na busca do que melhor se faz a nível mundial na formação e desenvolvimento de Recursos Humanos.

A edição de 2011 ficou certamente marcada pela emotiva despedida de Donald Kirkpatrick que após várias dezenas de anos de trabalho abnegado na defesa da necessidade de avaliar correctamente a formação, decidiu fazer a sua retirada de cena justamente neste evento que tantas vezes participou como um dos oradores de referência.

Durante anos, Kirkpatrick defendeu os seus quatros níveis de avaliação da formação, admitindo a dificuldade sentida em fazer com que as organizações fossem para além da avaliação da reacção dos participantes à formação. É um pouco irónico o momento escolhido para se aposentar, pois graças à crise financeira internacional, um pouco por todo o mundo, começa-se a questionar a utilidade da formação, exigindo-se a demonstração dos resultados obtidos, como em qualquer outro investimento. Quase poderíamos dizer que Kirkpatrick está a ver o seu sonho cumprir-se, retirando-se com a noção de dever cumprido.

Apesar do momento marcante que foi esta despedida, uma conferência como a ASTD 2011 vai muito para além do tema da avaliação da formação e quem esteve presente verificou a consolidação como tema da actualidade, o Social Learning. O Social Learning é exactamente o que parece, trata-se de uma aprendizagem que ocorre entre pares, sempre existiu, ocorrendo em locais diversos, como sejam conferências, reuniões, salas de formação, entre outros.

Com a emergência das redes sociais online podemos dizer que estamos perante uma nova realidade que está a permitir a criação de espaços de co-criação e co-aprendizagem. Plataformas como Facebook, Linkedin, Slideshare, YouTube, Twitter, permitem uma fácil partilha de conteúdos em grupos fechados ou abertos.

Muitos de nós ainda vêm estas plataformas como problemas no que se refere à produtividade, pelo tempo que “roubam” aos seus utilizadores, por isso muitas organizações estão a apostar em proibir o acesso às redes sociais online, como forma de resolver o “problema”. O verdadeiro problema é que estamos a viver um momento de viragem em que temos novas e poderosas ferramentas nas mãos para o desenvolvimento individual e da humanidade e a resposta mais rápida e fácil no curto prazo é enterrar a cabeça na areia tal qual avestruz.

Dentro de poucos anos veremos este tipo de proibições como um erro, como foram em seu tempo a proibição do uso do telefone, do telemóvel, da Internet ou do correio electrónico, pois tal como antes, a ênfase deve ser colocada na avaliação dos resultados e não no sistema de trabalho adoptado, temos que terminar de recompensar a presença, para começar a recompensar os resultados obtidos.

O Social Learning baseia-se numa forma de partilha de conhecimento multiplataforma e necessita de campo livre para se realizar no momento e no local que é necessário aceder o conhecimento. Por esta razão, a formação informal encontra-se intimamente ligada ao conceito de Social Learning. Considera-se como formação informal toda a forma de transferência de conhecimento, como parte normal de um dia de trabalho, não sistematizada e sem objectivos definidos. Por exemplo: Um colega explica a outro como fazer determinado procedimento interno. Considerando esta definição de formação informal, é fácil de compreender que a formação informal predomina em qualquer organização e nessa perspectiva todos os dias somos formadores, coaches e mentores.

Autores como Marc Rosenberg chegam mesmo a dizer que o peso da formação informal supera os 90% no total da formação de qualquer colaborador. Tal coloca uma questão interessante à luz do Princípio de Pareto: cerca de 100% dos orçamentos de formação são dedicados a uma componente de formação que representa menos de 10% da formação recebida por qualquer colaborador. O mesmo é dizer que se investirmos em criar condições para que exista uma formação informal de qualidade, teremos um impacto em mais de 90% do processo formativo dos nossos colaboradores.

No entanto, não é isso que vemos diariamente acontecer nas nossas organizações, o peso da formação tradicional é ainda avassalador, as soluções de formação tradicionais ao nível do saber-fazer têm limitações diversas que importa analisar: A falta de nivelamento do conhecimento dos participantes à entrada da formação. Qualquer formação técnica aborda em pouco tempo uma quantidade de passos e procedimentos que são impossíveis de memorizar na totalidade, por essa razão são produzidos materiais didácticos complementares com o objectivo das pessoas os utilizarem posteriormente em contexto laboral.

As acções de formação tradicionais não têm uma lógica “just-in-time”. A utilização de computadores por parte dos participantes numa tentativa de reproduzir procedimentos, fora do contexto do posto de trabalho resulta em vários problemas. Os participantes tendem a tentar não perder de vista o que o formador está a fazer, isto é, a prioridade do participante é não ficar para trás, mesmo que isso signifique não reflectir sobre a razão subjacente a realizar determinado procedimento, tornando a formação num processo mecânico não reflexivo.

Os computadores poderão distrair os participantes se outras aplicações estiverem disponíveis. O computador, quer seja de mesa ou portátil, em frente a cada participante, cria automaticamente uma barreira psicológica ao contacto e troca de impressões que se quer fluida numa sala de formação.

Ao visto, temos que acrescentar que os colaboradores estão cada vez mais móveis, utilizando soluções de formação através de tablets, smartphones e realidade aumentada. O fenómeno das redes sociais online veio para ficar como extensão natural da nossa vida e ontem foi o momento de começarmos a adaptar à realidade do desenvolvimento dos Recursos Humanos.

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