Entre a esperança e o tédio tecnológico: um olhar para a Internet do passado e do presente
Por Pedro Freire, director da JAKALA Iberia em Lisboa
Diz-se que tudo o que não é novidade perde o brilho e na Internet esta expressão não deixa de ser ainda mais válida. Criadores e consumidores de conteúdo têm-se perguntado nas últimas duas décadas, em várias ocasiões, se a Internet se tornou aborrecida e como podem contrariar essa tendência. Além disso, a aplicação massiva da inteligência artificial em todo o tipo de ferramentas, serviços e até mesmo objectos do dia-a-dia, passou de gerar tal impacto que nos questionamos se tanto brilho não acabará por se esgotar.
É possível que comecemos a cansar-nos do clickbait, da velocidade e superficialidade das tendências actuais, ou do hype que motiva a constante necessidade de disrupção. O futuro já não emociona e deixou de ser alvo de sonho pois a aceleração aborrece. Na Internet de hoje tudo é demasiado efémero, sem transcendência, sem a energia que no passado recente esperávamos. Sem dúvida, esta aceleração provocou a transformação digital, embora com ela por vezes pareça que estejamos a viver de uma falsa sensação de mudança contínua.
Existe uma cultura digital que nos impactou a cada um de uma maneira diferente: videojogos, filmes, música… emocionava-nos tanto o que íamos poder fazer com toda aquela explosão digital, que agora estamos aborrecidos com tanta tecnologia, notificações e oferta de entretenimento. Já não temos a mesma expectativa. A complexidade que exige que a nossa vida agora passe por essas tecnologias digitais e as suas interfaces é enorme e a quantidade de camadas de abstração que fomos incorporando para que tudo isto funcione é incomensurável.
Muitos negócios dependem exclusivamente da internet, o que a foi tornando um terreno cada vez mais complexo. E essa complexidade pesa sobre nós. O truque está em deixar de pensar na Internet como a força transformadora que foi em tempos, mas sim abraçar a sua evolução.
Com o tempo, a tecnologia torna-se tremendamente madura, padrão, uma utilidade básica. Carregamos no interruptor e a luz acende; abrimos a torneira e sai água. A tecnologia como tal já não é uma vantagem competitiva, mas sim uma parte essencial do funcionamento. O interessante de um enquadramento como este é que permite acelerar a estruturação de certas análises.
Do ponto de vista do mercado e da concorrência, a chave é encontrar a forma de deslumbrar os early adopters. Contudo, depois desse segmento mais apetente, entramos em fase de guerra total para conquistar um dos escassos espaços elevar uma solução tecnológica a uma utilidade.
Actualmente temos uma Internet completamente difundida, compreendida, practicamente invisível, com mercados maduros e organizados, estáveis para os utilizadores, que raramente falha, onde as decisões podem basear-se em dados históricos… e, por isso mesmo, a tender ao aborrecimento.
Já lá vão os tempos mais audazes em que tudo parecia possível. Hoje, é um lugar para mentalidades cómodas. Mas é curioso pensar nisso porque, para muitos de nós, a Internet é esse lugar dos pioneiros. A evolução foi vertiginosa até certo ponto no tempo.
Talvez por isso não precisemos que, para já, a Internet nos continue a surpreender. Talvez apenas precisemos de contar com ela para garantir o sucesso dos nossos negócios. E isso é apenas um sinal de maturidade.