Entrevista ao DRH da SIVA: «Nada ficará como antes no mundo das organizações»

«É fundamental criar o sentimento de que todos estão a remar no mesmo sentido e o esforço é partilhado em nome de um bem maior.» Na gestão de uma crise como a actual, é isso o mais importante, acredita Paulo Silva, director de Recursos Humanos da SIVA. Leia a entrevista exclusiva à Human Resources sobre como a empresa que comercializa as marcas Volkswagen, Audi e Škoda está a reagir – e a gerir – a situação de pandemia.

 

Quando e quais as medidas prioritárias adoptadas na SIVA? Como foi traçado o plano de contingência?
Logo no início de Março foi criado um Comité de Crise COVID-19, constituído por elementos das várias áreas da empresa e com a responsabilidade de:

1. Definir o plano de contingência e os procedimentos associados;

2. Implementar, assim como divulgar, o plano de contingência;

3. Implementar as orientações da Direcção-Geral da Saúde (nomeadamente o procedimento perante casos suspeitos);

4. Gerir a comunicação externa e interna com os stakeholders.

O plano de contingência que definimos contempla:

Medidas de prevenção: focadas na disponibilização de informação da Direcção-Geral da Saúde, entrega de EPI [equipamento de protecção individual], reforço das medidas de limpeza e desinfecção e implementação de medidas de distanciamento social, nomeadamente na ocupação dos edifícios e horários de acesso à cantina;

Medidas operacionais: teletrabalho nas áreas administrativas e de suporte e turnos desencontrados nas áreas operacionais (armazém e áreas técnicas);

Medidas de continuidade do negócio: definição dos colaboradores chave, identificação das actividades a manter e a suspender e estabelecimento de um processo de delegação de competências.

 

Tinham todos os meios necessários para operacionalizar esse plano? Em quanto tempo o fizeram?
Em termos de Tecnologias de Informação tínhamos as condições tecnológicas necessárias para colocar os colaboradores em regime de teletrabalho e para realizar reuniões em formato remoto. A implementação foi imediata.

A parte mais desafiante foi a aquisição de EPI devido à rotura de stock dos fornecedores. Felizmente adoptámos uma estratégia de procurement assente na diversificação de fornecedores e temos conseguido entregar aos nossos colaboradores os equipamentos de segurança necessários.

 

O que foi mais difícil gerir? Assegurar os meios para empresa continuar a funcionar com a normalidade possível ou gerir a ansiedade criada nas pessoas?
A reorganização operacional foi assegurada rapidamente e com eficácia. Como seria expectável, as pessoas ficaram ansiosas com a evolução da situação pandémica e receosas pela sua saúde e das respectivas famílias. Uma vez que a empresa tomou, e comunicou, em devido tempo, medidas muito concretas para preservar a sua segurança, foi possível manter um ambiente calmo.

 

O que considera fundamental na gestão de uma situação de crise como esta?
Manter a serenidade e a racionalidade das decisões, comunicar muito e de forma transparente com os colaboradores. Tomar boas decisões em tempo útil pode salvar vidas. A gestão da empresa deve ser rápida a tomar decisões, a implementar medidas e a comunicar com os colaboradores. Deve ser claro para as pessoas que medidas foram tomadas e os objectivos das mesmas.

É fundamental criar o sentimento de que todos estão a remar no mesmo sentido e o esforço é partilhado em nome de um bem maior.

 

Qual o papel que os gestores de Pessoas e de Comunicação assumiram na gestão desta situação?
Ambos têm um papel decisivo e por isso fazem parte do nosso Comité de Crise. O responsável pelos Recursos Humanos e pela Comunicação estiveram na linha da frente da gestão da situação, e sempre completamente alinhados. A Comunicação desempenha um papel fundamental na informação de todos os stakeholders sobre a situação da empresa e sobre as medidas tomadas. A gestão de Pessoas deve garantir os sistemas e os procedimentos necessários à segurança e protecção dos colaboradores e à continuidade da actividade empresarial.

 

E quando a crise passar, já conseguem antever algumas consequências?
Acredito que as pessoas vão ter mais consciência de que afinal está tudo ligado e que os eventos noutras geografias têm impacto no “nosso canto”. É preciso pensar global e ser mais flexível na resposta.

O mundo das empresas será diferente no que respeita à organização do trabalho e às competências mais procuradas e valorizadas. A colaboração e cooperação serão mais valorizados na sociedade.

 

Que lições acredita que os gestores vão poder retirar daqui?
Maior consciência de que tudo está ligado e que é preciso estar atento a eventos potencialmente globais. Uma estratégia montada apenas com base no conhecimento das variáveis locais é um erro. As estratégias precisam de ser mais flexíveis na adaptação a mudanças e as empresas necessitam de se munir de novas competências digitais no mercado de emprego.

É fundamental também dar competências digitais aos colaboradores e ter estruturas de TI que suportem trabalho remoto e plataformas colaborativas.

Quem vende produtos terá de repensar a estratégia de vendas, apostando no online e numa cadeia logística capaz de ir ter com o cliente.

 

Inadvertidamente, acabou por se criar a maior experiência de trabalho remoto de sempre no mundo. Acha que, quando tudo passar, alguns hábitos vão mudar?
Na minha opinião, nada ficará como antes no mundo das organizações. A experiência por que estamos a passar irá acelerar as empresas rumo à digitalização e à redefinição de modelos de negócio. Estão a cair alguns mitos sobre o teletrabalho e sobre as redes colaborativas de trabalho.

As estruturas organizacionais futuras serão mais flexíveis e mais diversificadas no que respeita às competências dos seus recursos humanos. Haverá desafios relacionados com a gestão de equipas remotas e teremos cada vez mais equipas multi-regionais a trabalhar nos mesmos projectos.

Esta entrevista faz parte do tema de capa da edição de Abril da Human Resources, nas bancas.

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