Entrevista: «Negócios que eram estáveis e rentáveis caíram em duas semanas», afirma a DRH do Novo Banco

Articulação dos diversos intervenientes, capacidade de decisão rápida e comunicação. Na opinião de Catarina Horta, directora de Capital Humano do Novo Banco, são estes os três elementos essenciais para gerir a crise que se vive actualmente. 

 

Catarina Horta conta à Human Resources como, no Novo Banco, reagiram à crise. E deixa a sua «homenagem aos bancários que estão na linha da frente da segunda de defesa a abrir todos os dias 99% dos balcões do Novo Banco  – estão fechados apenas aqueles em que se verificou um caso de infecção. É por solidariedade com todos estes profissionais que também eu não estou em teletrabalho.»

Quando e quais as medidas prioritárias adoptadas no Novo Banco? Como foi traçado o plano de contingência?
O plano de contingência tem duas vertentes – uma centra-se na protecção das pessoas e o outro na protecção do negócio. Desenvolvemos um plano de prevenção, controlo e vigilância específico para a COVID-19 para protecção e segurança dos colaboradores e actualizámos o plano de business continuity que existia no Banco, em função desta nova situação.

 

Tinham todos os meios para pôr esses dois planos em prática? Como o asseguraram e em quanto tempo?
Foi criado de imediato um comité de crise dirigido por um membro do board, o José Bettencourt, com subcomissões de pessoas, clientes e IT. Foi feito um esforço enorme para termos meios para colocar todas as pessoas em que isso era possível em teletrabalho, sem prejudicar a operacionalidade do banco e mantendo níveis de risco aceitáveis. Não podemos esquecer que a banca tem de se manter aberta e operacional, já que é considerada uma actividade essencial.

Numa semana tínhamos cerca de mil pessoas em casa e no dia útil seguinte ao decreto governamental ter saído, a 20 de Março, tínhamos um regulamento interno publicado com todas as regras e benefícios adicionais sobre ausências em caso de grupos de risco, assistência a menores de 12 anos, entre outros. É um documento vivo que continuamos a actualizar e as pessoas sabem que encontram lá as respostas. O mais difícil mesmo foi encontrar meios de protecção individual no mercado – o álcool em gel, as luvas e as máscaras tornaram-se produtos de luxo.

 

O que foi mais difícil gerir? Assegurar os meios para empresa continuar a funcionar com a normalidade possível ou gerir a ansiedade criada nas pessoas?
A banca faz parte da segunda linha de defesa, já que é considerada um serviço essencial pelo Estado. Os ATM têm de ter dinheiro, as operações bancárias têm de continuar a acontecer, as moratórias têm de ser efectivadas. Por trás dessas actividades estão pessoas. A maioria destas pessoas não pode estar em teletrabalho, ou nem sempre. Não têm a visibilidade dos profissionais da linha da frente – os profissionais de saúde – mas têm, tal como as funções logísticas e da cadeia alimentar, uma função essencial.

Por isso, enquanto a maioria da população está de quarentena ou em teletrabalho e as redes sociais se desmultiplicam em actividades para entreter adultos e crianças em casa, há pessoas que continuam a sair de casa todos os dias, que lavam as mãos de cada vez que entram e saem de casa, que trabalham de luvas porque mexem em dinheiro, que atendem os clientes por trás de um acrílico, que higienizam as superfícies onde trabalham várias vezes ao dia… um sem-número de novas práticas que não estavam em nenhuma descrição de funções.

A minha homenagem aos bancários que estão na linha da frente da segunda de defesa a abrir todos os dias 99% dos balcões do Novo Banco (estão fechados apenas aqueles em que se verificou um caso de infecção). É por solidariedade com todos estes profissionais que também eu não estou em teletrabalho!

A gestão das emoções é talvez o mais difícil de gerir para todos nós.

 

O que considera fundamental na gestão de uma situação de crise como esta?
Essencialmente três coisas: articulação dos diversos intervenientes, capacidade de decisão rápida e comunicação.

 

Qual o papel que a Gestão de Pessoas assumiu na gestão desta situação?
Numa primeira fase, sentimos que todas as pessoas tentavam contactar os Recursos Humanos por todos os meios e conhecimentos que tinham para resolver a sua situação – ou porque eram um grupo de risco, ou porque tinham contactado com alguém infectado, ou porque tinham vindo de uma área de contaminação activa. Sentimos que o tema não podia ser gerido assim e concentrámos as respostas no gestor de pessoas com a máxima autoridade – o director coordenador.

Organizei uma sessão por teams – curiosamente eu estava em isolamento obrigatório no meu quarto, pelo que esta sessão foi emitida de lá, o que é seguramente um sinal dos tempos – com todos os cerca de 30 directores de primeira linha e com os HR business partners para explicar o documento que organiza todas as regras, procedimentos e benefícios para os colaboradores no que respeita à COVID-19. São eles os interlocutores privilegiados nas respostas. A liderança é deles e isso tem sido essencial na gestão da crise. Por trás disso está a equipa de bem-estar dos Recursos Humanos, que tem sido extraordinária e incansável, mas que nunca conseguiria chegar aos quase cinco mil colaboradores do banco.

 

Que lições acredita que os gestores vão poder retirar daqui?
Pessoalmente tiro uma, que acho que já sabia, mas agora tenho a certeza – nada, mas nada é garantido. Esta crise veio como uma avalancha, rápida e silenciosa. Negócios que eram estáveis e rentáveis caíram em duas semanas. Acredito que vamos valorizar mais o que temos no futuro sem nos queixarmos por tudo e por nada, que é uma coisa muito portuguesa. E também acredito que vamos recuperar uma prática do tempo dos nossos pais, que é poupar para “os dias de chuva”.

 

Inadvertidamente, acabou por se criar a maior experiência de trabalho remoto de sempre no mundo. Acha que, quando tudo passar, alguns hábitos vão mudar?
Tínhamos o office 365 e andávamos há meses a tentar que a coisa pegasse, sem um  sucesso visível. Agora fazemos reuniões de conselho de administração por teams, comité de capital humano por teams, harmonização de avaliação de desempenho por teams, one-on-ones por teams, é só escolher. As ferramentas colaborativas vieram para ficar e nem precisámos de formação para que funcionassem. A necessidade é mestra de engenhos e as pessoas foram ao Google para aprender, uns ensinaram aos outros. Esta parte foi bonita de se ver.

 

Esta entrevista faz parte do tema de capa da edição de Abril da Human Resources, nas bancas.

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