Estabilidade e flexibilidade são incompatíveis? Não, e dependerá mais de nós do que de um contrato de trabalho (vídeo)

Quando se fala em estabilidade é comum pensar-se no contrato de trabalho que liga empresa e colaborador. Mas será que esse conceito continua a fazer sentido? Será sequer que é o que os profissionais mais valorizam? Na mais recente RE(talk), Alexandra Monteiro, vice-presidente de People da Outsystems, e José Pestana, senior manager | Shared Services & Technologies da Randstad Portugal, concordaram que a estabilidade é flexível.

Por Sandra M. Pinto

 

No mês de Abril, as (re)talks têm como tema “maior” a estabilidade profissional e na sexta-feira passado o foco esteve na estabilidade versus flexibilidade. Num momento em que se fala da necessidade de flexibilização na relação laboral entre empresas e colaboradores, não raras vezes vamos parar ao termo “precariedade”. Mas com novos modelos de trabalho a surgir, muitas vezes são os próprios colaboradores a querer essa flexibilidade. E isto que se passa no mundo das Tecnologias, por exemplo. Isso mesmo faz notar Alexandra Monteiro, contextualizando: «no sector em que actuamos, há uma grande escassez de talento, ou seja, há muito mais trabalho disponível do que pessoas, o que leva a que as empresas deste mercado e estar sempre uma lógica de esforço e investimento para atrair e reter. Isto tem grandes implicações na forma como se olha para os contratos de trabalho e para a regulação nesta matéria. Queremos ir ao encontro das pessoas, porque o talento é fundamental para nós.

Assim, na Oustystems, não só é perfeitamente compatível a ideia de flexibilidade com segurança e estabilidade, como é o que os profissionais procuram. «Entendemos por flexibilidade, por exemplo, contratar um colaborador remoto ou que esteja num destino onde não temos escritório, e isto num mundo onde não exista precaridade.»

Para José Pestana, noutros sectores que não o tecnológico, este entendimento pode ser o mesmo, dando como exemplo a gestão de marketing  ou áreas financeiras. E faz notar que, para a Randstad, «flexibilidade envolve  factores como o “remote work”, o “work from anywhere”, o definir o seu próprio horário de trabalho e até o trabalhar por objectivos. Esta realidade já não é tão ligada ao contrato de trabalho como era antigamente».

Alexandra Monteiro concorda e defende que «a verdadeira estabilidade está dentro de cada um de nós enquanto profissionais, no sentido de estarmos empenhados em perceber as nossas forças e as nossas fraquezas. Estabilidade é eu ter um plano para mim enquanto profissional, lutar por isso e dar o meu melhor a cada dia.»  Mas ressalva que isto não tira a importância ao contrato de trabalho, pois «um contrato de trabalho sem termo regula um conjunto de benefícios a que o colaborador tem direito, pelo que é melhor e mais seguro ter um contrato de trabalho. Mas o mundo está a avançar de uma maneira muito rápida, que a mudança é uma constante e o consequente necessário ajustamento a ela também.»

Assim, o mais importante será «existir um alinhamento entre o que são as expectativas da empresa e do colaborador», defende José Pestana. «Já não existem trabalhos para a vida e perante o que vivemos hoje temos exacta percepção disso, como mrosta a drástica redição de estruturas na Banca. É preciso que nos valorizemos e que, a cada dia, façamos cada vez melhor,. Isso vai ajudar à nossa retenção na empresa.»

 

Uma nova mentalidade

A verdade é que vários estudos vêm indicado que a estabilidade começa a surgir menos nas prioridades dos profissionais quando decidem onde trabalhar. Talvez porque haja uma forma diferente das novas gerações encarar o trabalho. A VP of People da Ousystems reitera que «estabilidade, entendida como continuar sempre na mesma empresa ou durante um longo período de tempo, é um conceito que não surge amiúde no universo da tecnologia, «provavelmente pela própria nova geração de profissionais, que estão mais abertos à mudança e anseiam por novos desafios, e também pelas próprias características do mercado.»

a flexibilidade é muito procurada, constata Alexandra Monteiro. «A pandemia acelerou muito o tema da flexibilidade, sendo que no lado laboral temos hoje em dia casos, inclusive em Portugal, onde implementámos um contrato de trabalho que suporta a relação em trabalho remoto, principalmente em países onde não temos subsidiárias estamos a contratar.  Do ponto de vista de horas de trabalho também há flexibilidade, e trabalhamos bastante de forma assíncrona, mas ainda é importante que exista uma mancha de trabalho que aconteça no mesmo horário de forma a que todos os colaboradores e chefias se consigam encontrar.»

O senior manager da Randstad considera que estamos de facto a asssitir a uma mudança de mentalidade. «O trabalho remoto a 100% está a chegar a muitas empresas e, sendo que cada vez mais existe meno talento disponível para dar resposta às necessidades das empresas, é preciso ser cada vez mais inovador para os atrair e, sobretudo, para os reter. Se as empresas não seguirem as tendências daquilo que as pessoas efectivamente querem vão perder a “corrida” para outras empresas concorrentes. É verdade que as diferentes gerações têm diferentes vontades relativamente ao mundo de trabalho, mas temos de arranjar modelos que sejam ajustáveis a todos.»

 

É inegável que novas formas de trabalho, nomeadamente da gig economy, trabalho por projecto ou freelance, começam a ganhar expressão no mundo do trabalho em Portugal, mostranto que o tradicional contrato sem termo não é a unica modalidade desejada pelos profissionais. «Na Outsystems estamos a começar a implementar esse tipo de relação com profissionais muito específicos para responder a necessidades de projectos também eles muito específicos», revela Alexandra Monteiro. «Acaba por ser uma forma muito flexível de olhar para o mercado de trabalho.»

O trabalho temporário também é um instrumento que assegura flexibilidade na contratação, mas persiste um estigma que o liga a precariedade. José Pestaca concorda  que há necessidade de uma mudança de paradigma. «A contratação a nível de trabalho temporário não indica que seja mais fácil despedir as pessoas, mas sim o de suprimir uma necessidade temporária. Ou seja, estamos a contratar pessoa porque a empresa tem uma necessidade temporária, seja para um dia, uma semana ou um mês.» Mais uma vez, o que «é preciso é alinhar as expectativas de ambas as partes, profissionais e empresas e conseguir que o colaborador temporário desenvolva outro tipo de competências para conseguir entrar em mais projectos. Assim vai crescer profissionalmente, tornando-se desejado e procurado por mais empresas.»

Sobre que modelos de trabalho irão imperar no futuro, as incertezas ainda são muitas, mas Alexandra Monteiro acredita que, «evoluir para um modelo completamente remoto, não é, para já, e com a informação que existe disponível actualmente, a melhor solução», pelo menos para a OutSystems. «Ainda não sabemos medir qual é o impacto de estarmos sempre em remoto, pelo que nos parece precipitado adoptar essa modelo a 100%. Assim no futuro queremos garantir uma cadência de ida ao escritórios de colaboradores e equipas.» E acredita que esse também não será o modelo desejado pela maioria dos colaboradores, pelo “fear of missing out” e pela necessidade de contacto com os colegas. «Provavelmente vamos ter mais gente a voltar ao escritório do que pensamos.»

 

(re)Veja esta conversa aqui, na íntegra. A moderação foi assegurada por Ana Leonor Martins, directora de redacção da Human Resources.

As re(talks) são uma iniciativa da Randstad em parceria com a Human Resources, promovida desde Março, e estão todas reunidas aqui.

 

 

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