Paula Perfeito, PWN Lisbon: «A inclusão é um pressuposto fundamental da liderança»

No dia 29 de Novembro, o Dream Day, encontro anual da PWN Lisbon, vai reflectir sobre a diversidade enquanto factor-chave para a sustentabilidade corporativa, explorando duas jornadas complementares e indissociáveis: das organizações e dos indivíduos.  Para eliminar as desigualdades que subsistem, Paula Perfeito, presidente PWN Lisbon, acredita que, por mais medidas e leis que existam, Portugal precisa de tempo, principalmente para mudar mentalidades. 

Por Tânia Reis

 

Comprovadas as «especificidades da liderança no feminino, como a criação de espaços de trabalho seguros, a valorização e integração de pessoas de diferentes contextos, a consideração do impacto social das decisões de negócio, ou o sentido de justiça face às condições e ao estatuto remuneratório», é responsabilidade das lideranças promover e gerir «a partir e para a diversidade».

 

O que podemos esperar do encontro da PWN Lisbon deste ano?

O PWN Lisbon Dream Day é o momento nobre do ano para a PWN Lisbon, pela capacidade de reunir cerca de 300 pessoas, entre parceiros, membros e voluntários, num encontro único e inspirador, com ampla representação dos sectores e actividades organizacionais mais relevantes da sociedade portuguesa. Este ano com o chapéu temático “Engaging All for Change – A Life Story”, propõe uma abordagem de reflexão da diversidade enquanto chave para a sustentabilidade empresarial.

Com a apologia de que a diversidade se constrói através de valores, vocações, talentos e um profundo sentido de propósito, e sabendo que é um factor determinante da longevidade e saúde das organizações, o evento anual da PWN Lisbon convoca todos para as mudanças do tempo actual. Simultaneamente, ilustrando uma espécie de linha do tempo, revisita através dos diversos momentos do programa os diferentes momentos em que ao longo da vida vai sendo construída e consolidada, do ponto de vista individual, a decisão sobre o que se quer ser e que missão se tem, essa redescoberta contínua. Daí a ideia de ciclo de vida e do contributo que todos podemos dar, nos nossos distintos estádios de desenvolvimento, para um projecto maior do que nós…

Serão exploradas, assim, duas jornadas complementares e indissociáveis da existência corporativa: das organizações, que necessitam do contributo de todos e da sua diversidade no global; e dos indivíduos, na sua singular evolução de vida. O olhar atento sobre ambas as jornadas, sua intercomunicação e dependência, permite às lideranças criarem uma cultura de maior inclusão e multidisciplinaridade, com vista à construção de empresas mais humanas, robustas e sustentáveis.

Para ilustrar estes dois eixos imaginários, o evento parte de um “Think Case – Fundações da Vocação e do Talento”, numa primeira intervenção inspiracional; evolui para o “Use Case – Desenhar o Futuro”, centrado no tempo da juventude, esse lugar com o futuro provisoriamente inteiro nas mãos; faz um retrato científico do estado da diversidade nas organizações com a apresentação do “Case Study | Portuguese Women´s Equality Observatory”; integra a discussão Diversity Think Case | Duas Rotas de Vida, incluindo dois percursos antagónicos, mas igualmente viáveis e plenos; e aborda as “Jornada(s) de Vida”. No fim, desemboca nas missões de vida que se tornam incontornavelmente maiores do que os próprios protagonistas e na capacidade de gerar impacto, transformar a vida das pessoas e deixar uma marca na construção de uma sociedade mais justa, mais sustentável.

 

Que objectivos esperam alcançar?

Os objectivos que, ano após ano, esperamos alcançar neste momento nobre para a organização e seus stakeholders, estão inscritos naquele que é o propósito da PWN Lisbon: ser referência na construção e consolidação da liderança, numa visão inclusiva, assente nos critérios da diversidade, equidade e igualdade e procurando o desenvolvimento da pessoa numa perspectiva absolutamente integral, ao longo da sua vida. É para isso que estamos profundamente convictos que existimos.

Para fazer face a este propósito, e com a missão de promover, incentivar, encorajar e levar à construção de carreiras com sentido e com impacto, a PWN Lisbon definiu uma “3 Growth Strategy”, que se propõe: 1. fazer crescer a PWN Lisbon com alianças e parcerias estratégicas; 2. promover a igualdade de oportunidades de desenvolvimento profissional; 3. e disponibilizar mais evidência sobre o valor económico e social da diversidade.

O evento anual posiciona-se como um contributo particularmente importante para, dentro do propósito acima descrito, serem concretizados estes objectivos.

 

Ainda que tenham sido vários os esforços, do sector público e privado, para promover a igualdade de género no mundo do trabalho, dados mostram que as mulheres continuam a partir em desvantagem no que diz respeito a salários, oportunidades de ascensão e progressão. O que mais falta fazer para eliminar estas desigualdades?

Precisamente por partirmos de uma situação de desequilíbrio, por mais medidas e leis que existam, é preciso tempo. Refiro-me ao tempo das mudanças culturais, que são naturalmente morosas, como nos diz a História. Em toda a Europa, identificamos situações muito díspares, com os países em níveis de desenvolvimento diversos, o que me leva a crer que, na essência, o que tem de ser feito em Portugal não é diferente do que é preciso fazer em vários outros países: educar, formar, comunicar, dar visibilidade aos bons exemplos; garantir que, independentemente do género, o que deve prevalecer é a meritocracia. E, para isso, a discussão deve ultrapassar as medidas de inibição da diversidade, como as quotas, e implicar uma mudança profunda e radical de mentalidades. O que nos leva de novo ao tempo (moroso) que ainda é necessário que decorra. As quotas não podem ser encaradas como um fim, ponto final, mas como um meio que deve promover a mudança cultural. E essa mudança resulta de um trabalho conjunto, de todos os stakeholders.

Que a discussão ultrapasse, pois, as medidas de inibição da diversidade e implique uma mudança profunda e radical de mentalidades, com preocupações incorporadas, como:

– garantir que existe uma pipeline de talento e promover carreiras que permitam às mulheres desenvolverem-se e adquirirem as competências e experiências necessárias para ocuparem lugares de decisão;

– promover uma cultura de assunção de risco entre os decisores, no sentido de darem oportunidades a quem ainda não exerceu, contratarem com base no potencial e não apenas na experiência adquirida, no pressuposto dos benefícios aportados por um ambiente de diversidade.

 

A seu ver, onde reside o foco do problema? 

Os desafios são enormes e devem ser permanentemente reavaliados. Começa, do meu ponto de vista, por ser responsabilidade dos líderes a obrigação de promover um ambiente de conciliação das dimensões múltiplas que a vida dos colaboradores tem; e de igualdade de oportunidades no acesso aos vários lugares de decisão. E isso propicia-se quanto maior for a consciência sobre a relevância de acolher nas organizações ambientes de diversidade. Há que ultrapassar preconceitos, modelos de liderança datados e condições de resistência à mudança. Deixo, ainda, uma nota adicional, de igual importância. A família (dos colaboradores) é um stakeholder importantíssimo em qualquer organização. Ora, também aqui cabe aos líderes (nos seus diferentes níveis) promover condições para as famílias dos colaboradores. Relevo, neste contexto, um estudo desenvolvido pela Fundação EFR (empresas familiarmente responsáveis), que refere que há uma perda de mais de 20% de talento devido a obrigações familiares que inibem as pessoas de assumir maiores responsabilidades nas organizações. E, desses, mais de 80% são mulheres sobre quem recaem maiores responsabilidades familiares, com ascendentes ou descendentes. Ora, não percamos de vista estes factores de mitigação do talento. Uma empresa genuinamente comprometida tem de definir e implementar medidas de diversidade, igualdade e inclusão inequívocas.

 

Como podem as lideranças tornar-se mais inclusivas?

A inclusão é, a meu ver, um pressuposto fundamental da liderança. E a este discurso devemos trazer uma visão agregadora da liderança. Um bom líder tem a capacidade de criar novos líderes; tem, para além das competências, um quadro de valores inegociáveis; está ao serviço; pela sua forma de comunicar, envolve o outro, mobiliza em torno de uma meta estipulada para um propósito comum; sabe como enaltecer o valor do outro e (sem humilhar) corrigir erros de forma construtiva; empurra a equipa e vai à frente se tiver de assumir responsabilidades; sabe arriscar e, simultaneamente, continua com humildade a aprender; sabe escutar; sem “cola ao poder”, identifica sucessores; sabe sonhar e incute no outro a importância do sonho. Faz pontes, dialoga, agrega. Une. Independentemente das diferenças.

 

De que forma constituem a diversidade e a paridade de género factores-chave na produtividade e sustentabilidade das empresas?

A pandemia – sem precedentes desde a pandemia de gripe de 1918-20 – e as guerras às quais assistimos – sem precedentes, com esta escala global, desde 1945 – exponenciaram o isolamento e a consciência da fragilidade redescoberta num século XXI pouco preparado para lidar com o imprevisível. E, neste cenário, de acordo com indicadores que podemos recuperar ao Barómetro do Parlamento Europeu, as mulheres são as mais prejudicadas, mais isoladas na discrepância entre oportunidades, lugares de decisão, enquadramentos salariais.

Se considerarmos as especificidades da liderança no feminino, se quisermos designar assim, olhemos para o Pew Research Center, que nos diz que as mulheres se destacam em vários factores decisivos da liderança corporativa, como a criação de espaços de trabalho seguros, a valorização e integração de pessoas oriundas de diferentes contextos, a consideração do impacto social das decisões de negócio, a mentoria e o cuidado com colaboradores mais jovens ou o sentido de justiça face às condições e ao estatuto remuneratório. Quão diferente seria o mundo se as mulheres tivessem mais presentes na decisão e na liderança?

É claro que essa transversalidade que preconizamos exige referências e lideranças que saibam, lá está, agregar, estabelecer pontes, gerar consensos, construir a partir das diferenças e das limitações, encontrar soluções de compromisso, com um olhar simultaneamente no passado, no presente e no futuro. Quem olha só para o futuro perde sustentação. Quem olha só para o passado, perde rasgo. Ora, é esta feliz encruzilhada entre as diferentes dimensões do tempo, do espaço e do ser humano que devemos enquanto líderes saber conciliar quase ao estilo oficinal, artesanal, como se um oleiro fôssemos, ou um artesão, ou um ferreiro, ou um ourives…

Esta liderança a partir e para a diversidade, porém, sabemo-lo, só se faz com coisas que não vêm nos livros: verdade, humanismo, o compromisso de encarar o cargo ou a função como serviço e encontro; a prática de comando como exercício de capacitação dos outros; a aposta na concretização de ideias como criação de valor. Num mundo centrado em egos, falta-nos essa verdade, falta-nos essa empatia, sem as quais a sustentabilidade das empresas fica eminentemente comprometida.

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