Gerir talento é mais do que contratar os melhores

Gerir talento é um dos maiores e mais complexos desafios das organizações, mas um desafio que representa uma vantagem competitiva das empresas e que acrescenta valor às pessoas.

 

Por Pedro Rocha e Silva, CEO da Neves de Almeida HR Consulting

 

Nas organizações, são as pessoas que fazem a diferença e é crítico dar-lhes um propósito e capitalizar todo o seu potencial. A gestão de talento implica olhar para as pessoas e compreender qual a melhor forma de as atrair, desenvolver, motivar e reter, preparando-as para abraçar desafios cada vez maiores e mais complexos. Só desta forma crescem as pessoas e crescem as organizações.

Mas, se é já evidente que as pessoas são os activos mais importantes das organizações, importa ir mais além e reconhecer a importância estratégica que o talento representa, o que implica a tomada de decisões que permitam passar do plano das intenções para a prática, pensando e implementando estratégias focadas na gestão de talento. E as estratégias a que me refiro são bem mais do que o desenho de processos burocráticos e o investimento em contratar os melhores.

Vejo o talento como uma combinação de factores, que vão mais longe do que a capacidade para a realização das actividades inerentes a uma determinada função. A receita para o talento resulta da combinação de hard skills e soft skills, com a motivação e entusiasmo que possibilitam o engagement, o sentido de compromisso e o empenho.

O grande desafio das organizações é criar um ambiente organizacional motivador, no qual as pessoas se sintam bem, que lhes proporcione uma visão de futuro, que as preencha. Para além de todos os benefícios para a concretização da estratégia e para o engagement das pessoas que a integram, uma eficaz gestão de talentos faz com que a organização seja vista como atractiva no mercado de trabalho, uma vez que me parece evidente para todos que as pessoas se sentirão atraídas por uma organização onde possam ser valorizadas e que dê perspectivas de crescimento na carreira.

As vantagens em desenhar programas e estratégias de gestão de talentos são muitas, mas deixo apenas algumas, para reflexão:

  • Potenciar a motivação e o nível de compromisso e engagement dos colaboradores;
  • Reforçar laços emocionais com a organização;
  • Reforçar a cultura organizacional, o seu ADN;
  • Melhorar o clima organizacional;
  • Incrementar a produtividade e os resultados organizacionais;
  • Atrair talentos externos, promovendo uma imagem forte e positiva da organização, enquanto empregador;
  • Reduzir custos associados ao turnover;
  • Melhorar o serviço prestado ao cliente.

 

Mais do que atrair, reter
De pouco ou nada serve ter os melhores, porque atrair talento não é suficiente, é necessário reter esse talento. Não basta conseguir atrair as melhores pessoas, é preciso criar nelas a vontade de permanecer na organização. E desenganem-se aqueles que pensam que o talento se retém, unicamente, com incentivos e recompensas.

Acredito que a questão da atracção e retenção de talento passa pela construção de um ambiente organizacional em que as pessoas queiram entrar (pelas referências que lhe fazem, por informação que recolhem), mas acima de tudo onde queiram permanecer (acima de tudo pelo que sentem).

Importa olhar para a cultura organizacional, conhecê-la e perceber se permite alcançar esse objectivo de atrair e reter as pessoas certas. Enquanto gestor, coloco a mim mesmo algumas questões, quando olho para as minhas pessoas:

  • Sentem-se inspiradas pela visão e pelos valores organizacionais?
  • Sentem-se valorizadas e reconhecidas pelo trabalho que desempenham?
  • Sentem que podem desenvolver-se e crescer profissionalmente?
  • Existe um verdadeiro compromisso entre as pessoas e a organização?

 

O fundamental passa por perceber se a organização possui uma cultura e uma identidade capazes de fazer com que as pessoas de quem mais precisa queiram entrar, mas onde queiram, acima de tudo, permanecer, dando cada vez mais e melhor de si. E isto só se consegue olhando para todo o ciclo da gestão de talento, desde o momento em que as pessoas entram nas organizações até ao momento em que saem.

É importante assegurar uma eficaz estratégia de recrutamento, que possibilite atrair os melhores candidatos, assegurando que as suas motivações, aspirações e motivações encaixam na a realidade e cultura organizacionais. O onboarding assume particular relevância e tantas vezes fica esquecido. É fundamental reconhecer a importância de fazer com que aqueles que chegam são recebidos de braços abertos, são parte integrante e importante na viagem organizacional que vão iniciar. O onboarding coloca à prova a capacidade da organização de captar talento e de ser atractiva no mercado de trabalho.

Para que uma organização consiga atrair e reter talento, tem de fomentar uma cultura de desempenho. O feedback tem um valor inquestionável em todo o ciclo de gestão de talento e uma avaliação de desempenho formal, com carácter meramente avaliativo, não é suficiente para que se possa dizer que o feedback é assegurado. Feedback não é dizer, é observar, acompanhar, dar suporte, ajudar no crescimento. É valorizar e reconhecer, fazendo com que as pessoas sintam que vale a pena o esforço. É importante que as organizações, mais do que avaliar, assegurem a gestão efectiva do desempenho, com modelos consequentes que permitam assegurar o feedback e o desenvolvimento.

 

Do desenvolvimento à liderança
Hoje, a esmagadora maioria das pessoas não permanece nas organizações para ter um trabalho, as pessoas procuram uma carreira, um propósito, querem crescer. E querem este crescimento centrado na sua individualidade, nas suas ambições e motivações. Assim, é crítico o desenho de programas de desenvolvimento que possibilitem o crescimento ao nível de responsabilidades, alinhadas com a motivação. Estas iniciativas devem ser pensadas para a realidade e cultura organizacionais e para as próprias pessoas, uma vez que desenvolver talento é muito mais do que promover programas de formação. Desenvolver talento é, neste âmbito, construir planos de acção que possibilitem um crescimento individualizado.

O planeamento da carreira dos colaboradores não pode, de forma alguma, ficar esquecido. Que percurso podem as pessoas fazer na organização? O que é necessário assegurar para que consigam evoluir? Que potencial possuem? São apenas algumas questões que devem ser consideradas, sendo certo que sem uma perspectiva de carreira, dificilmente as pessoas vão percepcionar o propósito que procuram.

Muito se fala nas novas gerações, nos novos colaboradores, mas é fundamental olhar para os experientes, para os que conhecem a organização, para os que ensinaram outros ao longo do seu percurso que, um dia, chega ao fim, pelas mais variadas razões. Há que preparar a sucessão, pensar em soluções de forma pró-activa, garantindo que quando os melhores saem, a continuidade é assegurada.

Os últimos tempos trazem, a meu ver, outro desafio para as organizações, no que diz respeito à gestão de talento, relacionado com a crescente necessidade de assegurar o equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional. O contexto em que vivemos, com todas as mudanças que conhecemos ao nível da forma de trabalho, aproximou as pessoas das suas famílias, fez com que a sua vida profissional entrasse na sua casa e a sua vida familiar passasse a fazer parte do dia-a-dia de trabalho. É crítica a atenção que os gestores devem dedicar a este tema, sob pena de comprometerem a eficaz gestão dos seus talentos.

Promover a criação de laços emocionais entre a organização e as pessoas é outra peça que considero chave para a retenção do talento. Seja em que formato for, os laços emocionais podem e devem ser cultivados, para que o compromisso e a paixão permaneçam e se desenvolvam.

E a liderança, que papel assume na gestão de talento? Da minha experiência e da realidade que conheço das organizações clientes, diria que a liderança marca a diferença! Gerir talento passa por ter líderes capazes de respeitar a individualidade, atentos às motivações das pessoas, preocupados genuinamente com o seu crescimento. Porque nenhuma organização consegue gerir talento só por existirem programas estruturados de recrutamento, de acolhimento, de desenvolvimento, de gestão de desempenho ou de sucessão. Porque, de facto, são as pessoas que fazem as coisas acontecer, e sem uma liderança forte, focada nessa gestão de talento, os resultados não aparecem.

A forma como as organizações gerem o talento é um factor determinante do sucesso face à concorrência. Gerir talento não é um desafio das áreas de Recursos Humanos, é um desafio e uma responsabilidade de todos, implicando uma actuação sinérgica e integrada.

Equipar a gestão do talento como o convite que fazemos àqueles que queremos que venham a nossa casa, em que não nos chega que queiram entrar, queremos que se sintam bem, que queiram ficar. Assim é nas organizações, em que os gestores têm em mãos o desafio de fazer com que as melhores pessoas queiram entrar, mas nunca devem esquecer que é crítico desenvolver iniciativas que façam com que tenham vontade de permanecer!

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