
Lançar ou não um podcast
Artigo de opinião de Ricardo Zózimo, Professor Auxiliar na Nova SBE
O que podem as empresas e as universidades contribuir para opiniões em espaços super ocupados
A imagem que tenho destes dias é de uma névoa densa à volta da intersecção entre negócios e política. À boleia das notícias do primeiro-ministro Montenegro e Presidente Trump, muitos comentadores tentam demonstrar as suas opiniões mas parece-me sempre que de uma maneira solta e pouco articulada. Uma certeza temos: estamos em águas nunca dantes navegadas e onde ninguém sabe ao certo o que irá acontecer. Mas todos parecem ter uma opinião a julgar pelas horas intermináveis de programas de debate político na televisão.
O efeito é um conjunto de discussões avulsas e sem dúvida um ruido opinativo em altos decibéis. Vem isto à conversa pois num espaço onde existem muitas opiniões divergentes e por consequência muito ruido faz sentido (re)pensar no papel e responsabilidade da universidade. Uma universidade é um espaço privilegiado de debate onde continuamente procuramos trazer novas formas de avaliar assuntos correntes.
Neste denso espaço opinativo, uma das formas em franco crescimento é o lançamento de podcasts. Tal como outros estou a pensar em lançar um podcast. Mais um podcast? Porquê e para quê? De acordo com o Perplexity.ai (a IA que eu mais gosto) existem cerca de 4M de podcasts no mundo, mas apenas 700k têm mais de 10 episódios (cerca de 18%). Mais ainda, apenas 10% dos podcasts publicados sobrevivem para lá dos seu terceiro episódio. A primeira conclusão que tiro destes números é que o business dos podcasts é duro para quem começa.
Então, como deve a universidade tentar lançar um podcast e mais ainda, para que deve servir um podcast de uma universidade? Muitas universidades portuguesas e internacionais têm podcasts que servem para transferir conhecimento académico para a comunidade conectando o que se passa na universidade com públicos distintos dos seus alunos e staff.
Penso que, por princípio, a universidade deverá fazer um podcast que permita ouvir um conjunto alargado de atores ao longo de um tempo consistente. A temporalidade do debate é uma das características principais da universidade. Na universidade temos tempo para debater o que contribui para a profundidade de argumentos. Trazer este tempo distinto que vai para além da superficialidade parece-me fulcral para um podcast powered by universidade. Por exemplo, faria todo o sentido debater as políticas empresariais que estão neste momento a encorajar as pessoas a voltar ao escritório ouvindo historias reais de impacto nas famílias, comunidades e empresas aliadas aos dados científicos que temos sobre este tema.
Outra razão para lançar um podcast seria mostrar desalinhamento entre setores apelando a que os ouvintes pudessem aprender de opiniões divergentes das suas. O podcast serviria assim para criar pontes e combater a cultura de polarização que tanto prevalece e destrói as bases da nossa sociedade. Iluminar outras partes do fenómeno é importante pois cria empatia e humildade, duas características que penso que os nossos líderes precisam mais que nunca para enfrentar o mundo atual.
Ao refletir nestes argumentos, é justo também avaliar as razões pelas quais a universidade não deveria lançar um podcast. O principal receio é não conseguir criar um conteúdo que seja atraente e que passe os primeiros episódios com sucesso. Ter sucesso num mercado totalmente aberto é totalmente distinto de o ter numa sala de aula onde existe uma ligação intrínseca entre aluno e professor. Porém a principal razão para não lançar o podcast são as consequências do que acontece caso seja um sucesso ou insucesso. Ao expor ao mundo aquilo que pensamos, queremos que o mundo interaja connosco. No entanto essa interação tem custos significativos que nos distraem da função para qual os académicos são chamados. A exposição exige de nós uma resposta que poderemos não ter capacidade de dar.
Quero com este texto encorajar as empresas a considerar o podcast como um meio para difundir as suas opiniões. Penso que mais podcasts institucionais podem servir de instrumentos de aproximação entre públicos diversos e o nosso propósito quer como universidades quer como empresas. Um podcast pode e deve ser uma ferramenta crítica para discutirmos a nossa visão de uma forma estruturada e alargada. Os riscos também são substanciais. Enquanto líderes temos sobretudo de avaliar se esta opção faz sentido para aquilo que queremos ser e transmitir.