Modelos flexíveis e o futuro do trabalho. Cinco directores de RH de grandes empresas em Portugal abordaram os “elefantes na sala”

No “Crossfire” da XXI Conferência Human Resources reuniu-se um conjunto de especialistas para falar dos modelos flexíveis no trabalho identificando os “elefantes na sala”. Sendo inquestionável que os modelos flexíveis fazem parte do futuro do trabalho, a verdade é que são muitos os desafios, existindo igualmente desvantagens.  Do painel fizeram parte Ana Rita Lopes, directora de Recursos Humanos da Delta Cafés/Grupo Nabeiro; Catarina Horta, directora de Capital Humano do Novo Banco; Carla Caracol, directora de Recursos Humanos do Grupo Renascença; Pedro Ribeiro, director de Recursos Humanos do Super Bock Group; e Sofia Castro, head of People Strategy da Sonae MC. 

Por Sandra M. Pinto | Foto Nuno Carrancho, NC Produções

 

Perante a nova realidade que a pandemia COVID-19 o mundo do trabalho viu-se na urgência de se adaptar. Agora que tudo parece caminhar para o “normal” surgem uma série de questões às quais importa dar resposta. O debate, moderado por Ana Leonor Martins, directora de redacção da Human Resources, e  Ana Porfírio, directora de Recursos Humanos da Jaba Recordat, começou por lançar a primeira delas: será que vai haver mesmo novos modelos de trabalho ou, quando acabarem as restrições vai ficar tudo mais ou menos na mesma, com alguma “maquilhagem” e chavões bonitos?

Catarina Horta, directora de Capital Humano do Novo Banco, começou por responder que, apesar de estar num sector que tem sofrido mais disrupções nos últimos tempos, acredita, efectivamente, que vamos assistir ao cimentar de novos modelos de trabalho. «As tecnológicas estão um bocadinho à frente neste tema, e têm mostrado que é possível fazer este caminho», começa por afirmar, «a verdade é que alguns deste novos modelos de trabalho já existiam antes mas eram pouco ou nada usados pelos colaboradores, muito por receio da opinião dos seus superiores, mas a verdade é que quando foi preciso usar todos usámos e resultou, ou seja, a caixa de Pandora abriu-se e na minha opinião já não se volta a fechar». Para Catarina Horta este caminho será mesmo inevitável, «se há algo de positivo nesta pandemia está é, claramente, uma delas, agora a forma de o fazer é que pode ser diferente». Para Catarina Horta está tudo a acontecer ainda de uma forma muito orgânica, nas funções que o permitem, mas considera que esta situação tem de ser regulada. «Temos que ter mais ordem na forma como o fazemos e não pode ser tão orgânico», defende, «ainda trabalhamos remotamente de uma forma pouco organizada e, naturalmente, vai ter de ser mais organizada».

Respondendo à mesma questão, Ana Rita Lopes, directora de Recursos Humanos da Delta Cafés/Grupo Nabeiro, começa por afirmar que concorda com a opinião antes revelando que «talvez seja um pouco mais conservadora». Para a responsável, vão existir novos modelos mas a cultura da empresa talvez venha a ditar a velocidade que com se vão adoptar esses modelos. «Muitos provavelmente alguns processos vão ser acelerados, mas de forma muito gradual e não de forma disruptiva, sendo que a cultura da empresa vai ser fulcral nestes processos de transformação».

Trabalhando no sector dos media, Carla Caracol, directora de Recursos Humanos do Grupo Renascença, defende que, independentemente do sector de actividade é preciso levar em conta aquilo que é o contexto da própria organização. «Se há organizações que se conseguem adaptar rapidamente a estes novos modelos, há outras em que eles não fazem sentido», afirma. Trazendo para a discussão aquilo que é a cultura nacional do trabalho, Carla Caracol afirma que «a nossa sociedade, onde estão incluídos os decisores organizacionais, tem memória curta, ou seja, aquilo que é rapidamente a resposta  a estes contextos que, tendencialmente, serão mais normalizados, vão voltar aquilo que era no pré pandemia». Para tal sublinha que «estamos em plena crise, não apenas pandémica, mas, sobretudo, económica e financeira, e a adopção  de um novo modelo implica investimento, algo que a maior parte das empresas hoje não tem».

 

Remoto versus presencial e híbrido rígido versus flexível

A realidade é que estamos nesta situação de pandemia há mais de um ano e meio e as tendências e com mais ou menos cosmética, a verdade é que as empresas, pelo menos as grandes, estão a tentar desenhar novos modelos de trabalho para quando for possível regressar sem restrições. Só que já o estão a fazer há mais de um ano. E entretanto os estudos mostram que as intenções e preferências, quer dos trabalhadores, quer dos líderes, têm mudado, na dicotomia entre presencial e o remoto. Importa então questionar às empresas sobre qual o caminho pensam seguir: mais remoto ou mais presencial, e adoptando um modelo híbrido rígido ou mais flexível. Pedro Ribeiro, director de Recursos Humanos do Super Bock Group, começa por referir que a base da organização é industrial, pelo que durante a pandemia houve funções que tiveram que permanecer no seu posto de trabalho, assim como a força de vendas que se manteve no activo. Relativamente às funções administrativas, todos os colaboradores foram colocados em teletrabalho. «O modelo que nós antevemos implementar será um modelo hibrido, com algumas particularidades», refere. A génese do trabalho dos quadros superiores do Super Bock Group assenta no trabalho em equipa entre vários departamentos esclarece Pedro Ribeiro, «ou seja, este trabalho tem de ser presencial, não funciona da mesma forma feito remotamente, pelo que a base do nosso trabalho futuro será presencial». O responsável reconhece que para algumas tarefas «é muito mais produtivo estar em casa ou num local onde não seja sujeito a interrupções, pelo que o modelo hibrido futuro, sendo flexível, deve ser suficientemente inteligente para tentar encontrar o melhor dos dois mundos».

E numa empresa com a dimensão da Sonae MC, com 33 mil colaboradores e também com realidades distintas, será que já foram definidas quais os modelos a adoptar? Sofia Castro, head of People Strategy da Sonae MC refere que o contexto de cada uma das empresas é critico para a tomada de decisão, sendo que dos 33 mil colaboradores, 30 mil estão nas lojas ou nos entrepostos pelo que não podem nunca fazer trabalho remoto. «Assim o universo de colaboradores sobre os quais se faz esta reflexão esta já delineado, e mesmo nesse existe um conjunto de funções onde, efectivamente, existe uma enorme desvantagem em ter as pessoas remotamente», esclarece. Deste modo, a Sonae MC tem um conjunto reduzido de funções onde entende que as pessoas devem estar 100% presencialmente, sendo que no extremo oposto existem na empresa algumas situações «onde o trabalho remoto, além de ser mais fácil de implementar, acaba por nos dar acesso a talentos aos quais de outra forma nunca teríamos acesso, pelo que fará sentido que, para uma franja pequena de colaboradores, exista a implementação de trabalho 100% remoto». A maioria dos colaboradores da organização que exercem funções no escritório terá modelo hibrido, onde metade da semana estará no escritório e o restante tempo em casa. «Para nós é importante que as pessoas possam usufruir daquilo que são as vantagens e flexibilidade dada pelo trabalho remoto, mas queremos também garantir que estamos a fazer e a implementar aquilo que é  melhor forma de trabalhar em termos colectivos e não apenas em termos individuais».

 

E os CEOs, querem o mesmo que os DRHs?

Os DRHs estão alinhados, um bocadinho “contra a corrente do mais remoto”, mas, ainda assim, mais do que aquele que existia. E os CEOs concordam ou há uma guerra dentro das organizações relativamente ao estabelecimento deste trabalho mais flexível? Para Pedro Ribeiro, director de Recursos Humanos do Super Bock Group, tudo depende das organizações. «A direcção é comum, mas talvez a diferença esteja na convicção com que se faz esse caminho», afirma, «não há duvida de que tanto a administração como os Recursos Humanos acreditam que o modelo hibrido com as nuances próprias de cada organização será o mais lógico.

Para Sofia Castro, head of People Strategy da Sonae MC outro aspecto a ter em conta é a transição cultural e aqui os lideres desempenham um papel importante. «O papel dos lideres nas organizações cresceu de forma significativa e a importância dos lideres estarem próximos das pessoas é ainda mais importante agora que estão presencialmente distantes».

 

As prioridades e o futuro

E perante tanta imprevisibilidade, é possível as empresas preparem-se para o amanhã, e o que é agora prioritário?

Pedro Ribeiro, director de Recursos Humanos do Super Bock Group acredita que sim é possível e como prioridade escolha a capacitação e a explicação dobre o racional por detras do modelo que venha a ser implementado. Sim, foi também a resposta de Sofia Castro, head of People Strategy da Sonae MC, à primeira questão, sendo que identifica como prioridade «a requalificação das pessoas». Positiva foi também a resposta de Ana Rita Lopes, directora de Recursos Humanos da Delta Cafés/Grupo Nabeiro, para quem a prioridade é «mosrtrar que há um caminho e que continuamos a apostar em projectos desafiantes e estruturantes». Na visão de Carla Caracol, directora de Recursos Humanos do Grupo Renascença a proridade deve ser dada à retoma económica «sendo ela a base sobre a qaul depois acresce tudo o resto». Não destoando dos parceiros de painel, Catarina Horta, directora de Capital Humano do Novo Banco, responde afirmativamente, e prioriza a «sustentabilidade: económica, social e ambiental»

 

 

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