E se os bónus dos executivos de topo dependessem de critérios ESG?

A remuneração variável (bónus) dos membros de Conselhos de Administração é, por norma, um tema sensível e alvo de um enorme escrutínio nos media e de um impacto significativo na opinião pública, seja pelos montantes que a remuneração desta tipologia de funções e responsabilidades podem representar, quer pelos critérios de avaliação utilizados.

Por Luís Vinagre, Career associate da Mercer Portugal

 

Por outro lado, a consciencialização das organizações relativamente a questões ambientais, sociais e de governança (sigla ESG em inglês) está cada vez mais presente em todos os sectores de actividade, e os rácios entre a remuneração executiva e a média das remunerações é um indicador muito observado quando se observam critérios de equidade e fair pay.

Nesta perspectiva, por que não incorporar métricas relacionadas com ESG para efeitos de remuneração variável dos administradores executivos? Esta é uma tendência que observamos no mercado em clara expansão.

A inclusão deste tipo de indicadores tem-se acentuado nos últimos anos, verificando-se, no entanto, mais incidência em países onde existe uma maior pressão exercida por parte dos accionistas, investidores, reguladores, clientes e até mesmo dos colaboradores. Em certos mercados, como o alemão e o francês, existem inclusive requisitos de carácter obrigatório por parte do regulador para que as organizações cotadas em bolsa considerem os temas de sustentabilidade, responsabilidade social e ambiental aquando da construção de modelos de remuneração variável de membros executivos. Posto isto, a forma mais óbvia das organizações poderem dar resposta a esta obrigatoriedade é através da integração de objectivos ESG no sistema de remuneração variável.

O que pensam os colaboradores das organizações sobre este tema? A mensagem é clara: com base no estudo Global Talent Trends da Mercer, em 2022, mais de 90% dos colaboradores esperam que as suas empresas (e os seus executivos) tenham objectivos relacionados com a sustentabilidade; por outro lado, um quarto dos executivos reconhece que o foco na sustentabilidade é um factor diferenciador pela positiva para a gestão de talento, podendo ter um papel relevante na capacidade de atracção e de retenção de talentos para a organização. No entanto, para além da sustentabilidade, indicadores relacionados com o S (de “ESG”), representando a componente social, têm sido cada vez mais adoptados, principalmente relacionados com métricas de DEI (Diversity, Equity & Inclusion).

Assim, de que forma as organizações devem agir quando não existe esta obrigatoriedade?  Para já, observamos uma maior adesão por parte das empresas de maior dimensão, derivada da sua maior exposição e impacto, e um sinal inequívoco de que querem transmitir à sociedade sobre o seu propósito, missão e compromisso. No entanto, em termos de resultados, muitos CEOs ainda têm a crença limitadora de que o impacto da estratégia de ESG na sua empresa pode reduzir a performance financeira, quando diversos indicadores comprovam que as organizações comprometidas com uma estratégia de sustentabilidade têm também, regra, resultados que se destacam.

É, no entanto, muito importante garantir um equilíbrio apropriado na forma como as organizações implementam este tipo de indicadores nos seus modelos de remuneração executiva.

Não existindo guidelines específicas por parte das entidades reguladores no mercado Português, muitas organizações (e as suas respectivas comissões responsáveis pelas políticas de remuneração executiva) procuram um alinhamento com as organizações do mesmo sector de actividade, de forma a não ficar “atrás” do mercado nesta tendência.

Por outro lado, a definição de objectivos ESG para efeitos de remuneração variável poderá ser vista como uma forma de definir metas mais “fáceis” de atingir e, portanto, de facilitar a atribuição de remuneração variável para os elementos das comissões executivas. Existe, por isso, a necessidade de um acompanhamento próximo por parte das comissões de remuneração, órgãos de fiscalizações ou outras entidades responsáveis, de forma a garantir a definição de métricas exigentes, impactantes e alinhadas com o plano estratégico de longo prazo das organizações.

Em termos do peso das métricas ESG na avaliação dos membros executivos, prevê-se que pelo menos numa fase inicial este seja reduzido, de forma a não “comprometer” a importância dos indicadores financeiros. Ainda assim, é importante garantir que o peso não é considerado insignificante de modo a não desvirtuar a sua relevância.

Não sendo o tema de ESG, por si, novo nas organizações, mas sim a sua adopção nos modelos de remuneração variável dos executivos, existe a expectativa de que esta inclusão aumente a prioridade e o sentido de urgência na definição e implementação de objectivos ambientais, sociais e de governança nas sociedades.

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