Gonçalo Rebelo de Almeida, Vila Galé: «Os modelos de trabalho terão de ser sobretudo flexíveis»
O tema do trabalho remoto e a sua implementação tem ocupado horas e horas de debate entre os profissionais de Recursos Humanos nos últimos meses, e parece surgir como a grande tendência para o futuro do trabalho nas organizações no período pós-pandemia. Mas é preciso olhar para o tema mais atentamente.
Por Gonçalo Rebelo de Almeida, administrador do Grupo Vila Galé
Como nota prévia, não posso deixar de realçar que esta problemática, podendo ser relevante para muitas organizações e funções, não terá impacto em milhares de empresas e postos de trabalho, que, pela sua natureza e características, não são susceptíveis de soluções de trabalho remoto. Sectores empregadores importantes da nossa economia como sejam comércio e retalho, agricultura, indústrias, restauração, hotelaria, entre muitos outros, não serão particularmente impactados por esta tendência.
Para estes sectores, os temas da atracção e retenção de pessoas e a sua formação e requalificação continuarão a estar no topo das prioridades das equipas de Recursos Humanos.
Nos casos onde, em teoria, não existiriam impedimentos técnicos ou materiais para a implementação de modelos de trabalho remoto, acredito que, ainda assim, existem nesta fase desafios significativos que terão de ser equacionados.
Em Portugal, e no período pré-pandemia, já várias empresas tinham implementado alguns modelos de trabalho remoto que, por norma, passavam por dar ao colaborador a possibilidade de em alguns dias da semana poder desempenhar as suas funções remotamente. Esta prática tinha um carácter mais ou menos informal e era visto pela generalidade dos colaboradores como um benefício ou vantagem, que contribuía para melhorar o seu grau de satisfação relativamente à empresa, que passava a ser vista como uma empresa moderna e flexível.
Em regra, estes modelos não eram alvo de qualquer acordo jurídico ou negociação de condições adicionais, e funcionava como um salutar acordo de cavalheiros com vantagens para ambas as partes.
De forma forçada, a pandemia impôs modelos de trabalho remoto, onde até então não tinham sido equacionados, e teve a capacidade de demonstrar que os eventuais obstáculos ou desafios não se prendem com os equipamentos ou as tecnologias digitais necessárias ao desempenho das funções.
Soluções colaborativas online, como dispositivos móveis ou ligações de VPN, demonstraram que, do ponto de vista técnico, o trabalho remoto poderia funcionar.
No entanto, vejo um conjunto de desafios que poderão vir a ter de ser ultrapassados para que cada empresa e os seus colaboradores possam vir a encontrar um modelo adequado para esta nova realidade, e que aqui partilho:
- Regulamentação legal e/ou colectiva da matéria;
- Processos de integração de novos colaboradores;
- Envolvimento e ligação entre pessoas de diferentes equipas e departamentos;
- Condições de trabalho materiais fora da empresa, em termos de espaço, conforto, iluminação, segurança – digital e física –, tranquilidade;
- Transmissão da cultura empresarial;
- Desenvolvimento de espírito crítico, inovação e criatividade;
- Desenvolvimento humano e partilha de experiências e conhecimento em áreas que extravasam o desempenho de funções;
- Desenvolvimento de relações sociais;
- Detecção de problemas pessoais e emocionais;
- Desempenho das funções de liderança à distância;
- Gestão por objectivos.
Acredito que o modelo de futuro terá de passar por modelos híbridos que possam ter a capacidade de se adaptar à realidade e cultura de cada empresa e às necessidades e condições de cada colaborador.
Será praticamente impossível encontrar modelos que sirvam para todas as empresas, ou, dentro da mesma empresa, para todos os departamentos e pessoas.
Penso que quanto mais flexível for o modelo, melhores resultados ele trará para ambas as partes.
Este artigo foi publicado na edição de Agosto (nº.128) da Human Resources, nas bancas.
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