Os profissionais de TI são hoje os novos Beatles

Por Tânia Gomes, head of People & Talent da Integer

 

No recrutamento, os profissionais de TI comportam-se hoje em dia como se fossem estrelas rock: cada um tem as suas exigências, algumas delas muito específicas. E o segredo para contrariar a dificuldade de atrair e reter talento nesta área — um problema mundial decorrente sobretudo da escassez de mão-de-obra e do trabalho remoto — é saber estar à altura de atender essas mesmas exigências.

Voltemos à música. Se, por ventura, Paul McCartney há uns anos pedisse para o concerto do dia seguinte em Paris ostras selvagens de Loch Ryan (Escócia), seguramente que a equipa de produção ia concentrar todos os seus esforços em realizar a vontade do artista, certo? E é precisamente esta a postura que se deve ter no recrutamento de TI. Saber servir aos candidatos ostras de Loch Ryan bem frescas e a tempo e horas. Só tratando-os como se fossem Beatles é que é possível atrair e reter talento, pois todos gostamos de ser valorizados e de nos sentirmos como uma estrela rock.

Em termos práticos, para as empresas terem em palco as stars do momento é indispensável que garantam um poderoso Employee Value Proposition (proposta de valor que torna a organização um lugar único para trabalhar). Para isso, é preciso definir uma estratégia, a qual passa pelo processo de recrutamento e selecção e termina na integração e no acompanhamento permanente destes profissionais na organização.

Tudo começa no recrutamento. Primeiro, é necessário mudar a forma de atrair candidatos, dado que, e apesar de a notoriedade e a reputação da entidade serem peças-chave, estas já não são por si só suficientes. Da minha experiência de longos anos no sector, a recomendação de um colaborador e o passa-a-palavra são as melhores soluções para captar a atenção do talento certo. A razão é simples: ter boas referências de alguém que vive diariamente a empresa dá uma segurança extra a quem pretende mudar. Um ambiente positivo, uma cultura organizacional inclusiva, uma liderança forte que estimule o trabalho de equipa e um espírito colaborativo são essenciais para cativar capital humano de excelência.

O recrutamento em si é também uma fase fundamental, pois é quando se cria ligação com o candidato, promovendo um contacto constante e dando feedback ao longo das fases. Deste modo, a pessoa sente que não é apenas mais um nome de um currículo e implementa-se logo uma atmosfera de confiança. Este processo deve ainda ser ágil, sem várias etapas e não muito extenso, no sentido de quem concorreu manter o interesse e de não ser, entretanto, aliciado por outra entidade.

Apesar de o pacote salarial ainda ser determinante no que toca a negociação e decisão — uma vez que este mercado de TI é muito competitivo e a concorrência é elevada —, a verdade é que já verificámos que outras condições começam a ganhar peso e impacto na balança. E neste campo estamos a falar de benefícios como: formação contínua, trabalho remoto, gamificação (disponibilizar jogos físicos ou online para descontrair), parcerias, planos de saúde atractivos, programas de bem-estar, oferta de eventos e de iniciativas que incentivem o convívio… Estes exemplos são, de facto, mais-valias porque os colaboradores percepcionam-nos como compromissos da empresa com o seu conforto e crescimento pessoal e profissional.

Desta forma, é essencial que sejam definidas políticas de Recursos Humanos que incluam programas internos que vão ao encontro das necessidades dos profissionais, bem como programas de mentoria e coaching. Ambos os programas devem abranger logo a fase de integração, com um pré-boarding e um onboarding que seja um mergulho na cultura e nos valores da organização.

Outro tópico muito considerado pelos candidatos de TI — por norma altamente qualificados — são os Planos de Desenvolvimento Individuais (PDI) que asseguram evolução de carreira. E isso passa, claro, por apostar na formação certificada constante e em óptimas ferramentas de e-learning que potenciem quer competências técnicas quer comportamentais.

Por sua vez, visto que uma grande fatia do mercado de TI funciona por projectos, a mobilidade de desafio e/ou de funções, ao proporcionar desenvolvimento humano e profissional, também favorece a retenção de talento. Para este objectivo ser potenciado, deve-se ter em conta sessões de feedback regulares com cada colaborador (para abordar pontos como motivação, satisfação e progressão/ajuste do seu PDI), pois todos gostamos que nos oiçam e de nos sentirmos acompanhados. Se todas as arestas forem limadas nos tempos certos, seguramente que o diamante manterá o seu esplendor.

De referir ainda que, como a pandemia fez aumentar os casos de burnout, acentuou-se a importância que estes profissionais conferem ao equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Como tal, tornaram-se trunfos: flexibilidade de horários e de local de trabalho e também integrar nas condições a oferecer programas regulares de saúde e bem-estar (ginásios, massagens, apoio psicológico).

Em suma, para uma empresa ser bem-sucedida na árdua tarefa de atrair e reter talento na área de TI já não basta ‘acenar’ com um salário acima da média nem com pacotes laborais standard. É imperioso saber tratar cada profissional como se fosse um Paul McCartney e oferecer a cada um as condições que mais valoriza, sejam elas ostras de Loch Ryan ou uma laranja do Algarve. Só desta forma 100% personalizada é que vamos conseguir ter os Beatles a tocar só para nós e a continuar a encantar os fãs quer ao vivo, quer em casa, quer no café, quer onde eles escolham trabalhar e ser felizes.

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