Os super-heróis e a transformação do paradigma da liderança

Prometi a mim mesma este fim-de-semana, como em tantos outros que já passaram nos últimos anos, que iria operacionalizar aquilo que postulo, o Work Life Balance”. O que quer que seja isto do equilíbrio entre as exigências do trabalho e o meu bem-estar físico e emocional, dei comigo a pensar «como é que os gestores no contexto actual gerem o seu papel nas empresas, tal como a miríade de desafios que se colocam hoje ao nível dos factores humanos?».

Por Daniela Lima, managing partner na Swaifor; especialista em Segurança no Trabalho, PhD em Comportamento Organizacional e professora convidada no IPS – Instituto Politécnico de Setúbal.

 

Quanto a mim, é uma excelente questão, não porque fui eu que a coloquei, mas porque resulta de um conjunto de preocupações que muitas vezes aparecem espelhadas nos múltiplos almoços, reuniões, tertúlias e convívios com estas “figuras proeminentes” que, de certa forma, também manifestam sinais de bastante cansaço e até mesmo de exaustão emocional.

Temos de compreender que continuamos a falar de pessoas, também elas se desafiam e são desafiadas de forma exigente no domínio profissional e, inclusive na dimensão pessoal, mas são igualmente frágeis e adoecem!

Eu imagino o “gestor actual” à luz das teorias clássicas e modernas da literatura sobre gestão como o “Super-Homem” ou a “Super-Mulher”, ou outro qualquer herói maravilhoso e mais atual da DC Comics ou da Marvel. Mas, a realidade que aparece espelhada em várias publicações internacionais credíveis é inequívoca, estes seres imaginados não existem! E a dura realidade é que todos os dias estamos a levar à exaustão física e emocional os “nossos gestores” com o excesso de solicitações sobre-humanas.

O estudo da Gartner de 11 de Março de 2022 intitulado de “Future of Work Reivented: Managing in a Hybrid World” (tradução livre “Futuro do Trabalho Reinventado: Gerir num Mundo Híbrido”) ilustra bem esta “nova” e “dura” realidade. O estudo coloca a tónica no papel do gestor como o garante para atrair e reter os talentos que as empresas necessitam para atingir os seus objectivos estratégicos para incrementar o negócio. Acrescenta que estes líderes devem desenvolver as suas equipas, independentemente da forma de trabalho que estas adoptem tendo em atenção três eixos fundamentais a desenvolver: (1) Equipas de Trabalho Resilientes, (2) Gestores Focados nos Factores Humanos e (3) Métricas de Performance com Foco na Qualidade do Trabalho e nos Objectivos Traçados.

Contudo, o estudo corrobora que é mais fácil teorizar do que operacionalizar (Gartner, 2022). Muitos destes gestores não têm esta dimensão comportamental tão presente e necessitam de ganhar sensibilidade para desenvolverem o segundo eixo identificado pela Gartner (2022), a orientação para as “Pessoas”.

Os líderes que contribuíram para o trabalho desenvolvido pela Gartner (2022) evidenciam sérias preocupações com o desempenho dos seus gestores. Eles acreditam que os gestores podem não estar devidamente capacitados para gerir a incerteza e as mutações que se registam ao nível do mercado de trabalho.

Posteriormente, a Gartner realizou um inquérito a Directores de Recursos Humanos de primeira linha de várias empresas e 84% destes profissionais identificaram a necessidade de desenvolver programas adequados para dotar os gestores com novas competências.

Estes gestores vêem-se hoje confrontados com um conjunto de desafios em que estão mais expostos aos juízos e avaliações dos seus colaboradores. O conjunto de fenómenos que emergem neste contexto exige uma resposta eficaz e devidamente contextualizada à luz da sua realidade organizacional (e.g: “Quiet Quitting”, o “Work Life Balance”, a Síndrome de Burnout, a Depressão, o Stress, o Assédio, a legislação laboral e as exigências do mercado).

Muitos dos Directores de Recursos Humanos do inquérito anterior entendem que os gestores devem saber liderar conversas difíceis: (1) falar da pandemia de forma objectiva, (2) compreender como se sentem os seus trabalhadores do ponto de vista psicológico, (3) a sua situação económica e (4) social (Gartner, 2022). Por outro lado, neste estudo, os gestores demonstram receio em falhar nestas conversas e “não dizer a coisa certa”.

Entende-se que não se sentem confiantes para abraçar este desafio, ou seja, não se sentem confortáveis para espelhar a inteligência sócio-emocional que os trabalhadores esperam que estes demonstrem para com o seu estado emocional (83% dos trabalhadores esperam ser vistos pela empresa como uma “Pessoa” e não apenas como um número) (Gartner, 2022).

Como em grande parte dos estudos realizados actualmente, o foco centra-se sempre na fragilidade da relação laboral entre os trabalhadores e as empresas, e bem! Todavia, no meu entendimento, o que se deve começar por tentar perceber, do ponto de vista psicossocial, é a elevada exigência e expectativa na figura do gestor que “resolve tudo”. Acredito que este “Super Gestor” na figura de um indivíduo em contexto empresarial levanta muitas questões, porque também este trabalhador ou trabalhadora necessita de ferramentas práticas para se apoiar e, concomitantemente, apoiar as suas “Pessoas” (Cisco, 2021).

Em suma, parece-me adequado pensar em desenvolver fóruns onde os gestores possam partilhar as suas dúvidas e incertezas, ensaiar e aprender com outros gestores e profissionais da área comportamental que diariamente também enfrentam os mesmos problemas reais, decorrentes dos desafios que as “Pessoas” ou que o “Factor Humano” lhes coloca hoje!

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