Podem as empresas contratar se estiverem em lay-off? (veja estes exemplos concretos)

A lei é clara. Tendo recorrido ao regime de lay-off, as empresas não podem despedir. Mas será que pode contratar? Depende.

Por Ana Ribeiro Ferreira, advogada da Cerejeira Namora, Marinho Falcão

 

O comummente denominado lay-off simplificado, já com cerca de 90 mil pedidos submetidos (à data em que escrevo), parece estar a ser a mão amiga de muitas empresas que actualmente atravessam uma grave situação de crise empresarial.

O seu desidrato é claro – assegurar a manutenção de postos de trabalho. Por essa razão, o regime legalmente consagrado proíbe as empresas que beneficiem de um dos apoios previstos no DL n.º 10-G/2020 de, durante o período de aplicação dos mesmos, bem como nos 60 dias seguintes, fazerem cessar contratos de trabalho, ao abrigo das modalidades de despedimento colectivo ou despedimento por extinção do posto de trabalho, não só no que respeita aos trabalhadores abrangidos pelas medidas, como aqueles que não foram cobertos pelas mesmas.

Mas e o que dizer quanto à possibilidade de uma empresa contratar novos trabalhadores durante o período de lay-off?

Numa primeira interpretação, poderíamos pensar que a resposta seria negativa. De facto, poderá ser o pensamento comum que, se uma empresa recorreu ao lay-off, é porque não tem liquidez para assegurar os vencimentos dos seus trabalhadores. Assim, carecia de qualquer sentido que fosse, posteriormente à apresentação do respectivo pedido de lay-off, proceder à contratação de novos trabalhadores. Não é esta, porém, a resposta que resulta do regime legal, senão vejamos.

Em primeiro lugar, importa clarificar que é pressuposto do recurso ao lay-off simplificado que a empresa se encontre numa situação de crise empresarial. E repare-se que, para este efeito, não é necessário comprovar-se que a empresa não tem liquidez suficiente para assegurar os vencimentos dos trabalhadores, mas sim que se encontra numa das situações previstas no artigo 3.º n.º 1 do DL n.º 10-G/2020. Verificados um destes pressupostos, e independentemente da liquidez da empresa, é possível determinar-se que a mesma se encontra em situação de crise empresarial. Assim, o argumento de que não poderá contratar novos trabalhadores pois, alegadamente, teve de recorrer ao lay-off para encontrar forma de pagar os salários dos já contratados, não colhe.

Concomitantemente, socorrendo-nos do regime do lay-off previsto no Código do Trabalho, verificamos que a alínea e) do n.º 1 do artigo 303.º prevê que, durante o lay-off, o empregador não deve “proceder a admissão ou renovação de contrato de trabalho para preenchimento de posto de trabalho susceptível de ser assegurado por trabalhador em situação de redução ou suspensão.”

No DL n.º 10-G/2020 nada é dito a este respeito. Contudo, atento a ratio da norma, consideramos que a mesma se aplica de igual forma ao lay-off simplificado.

Assim, a proibição de contratação durante o período de lay-off apenas respeita aos postos de trabalho que possam ser ocupados por trabalhador que se encontre em situação de redução do período normal de trabalho ou de suspensão do contrato de trabalho.

Nem outro poderia ser o entendimento.

Para melhor intelecção do exposto, reparemos em alguns exemplos:

Exemplo 1:

Questão: A empresa B dedica-se ao fabrico de calçado. Estando em situação de crise empresarial, recorreu ao lay-off simplificado, encontrando-se mais de metade dos seus trabalhadores, com a categoria de Operário Fabril, com o contrato de trabalho suspenso. Durante o período de lay-off , e de forma a tentar ultrapassar a crise em que se vê envolta, começou a produzir máscaras de protecção. Com o crescente avolumar dos pedidos, os trabalhadores que se mantiveram ao serviço já não são suficientes para executar todo o trabalho existente, sendo necessária mais mão-de-obra. Coloca-se assim a questão de saber se pode contratar novos trabalhadores para esse efeito?

Resposta: Estamos aqui perante uma clara situação em que o posto de trabalho a ocupar pode se assegurado por um trabalhador em situação de suspensão do contrato de trabalho. Por essa razão, não é possível que a empresa contrate novos trabalhadores para executarem tais tarefas, devendo, ao invés, socorrer-se dos trabalhadores que estão em casa com o seu contrato de trabalho suspenso.

Exemplo 2:

Questão: A empresa B dedica-se ao fabrico de calçado. Estando em situação de crise empresarial, recorreu ao lay-off simplificado, estando mais de metade dos seus trabalhadores, com a categoria de Operário Fabril, com o contrato de trabalho suspenso. Porém, durante o período de lay-off , verificou um forte aumento da procura no que respeita às vendas online, sentindo a necessidade de alocar mais trabalhadores a esse departamento. Pode esta empresa contratar novos trabalhadores para desempenharem tais tarefas?

Resposta: Estamos aqui perante uma situação em que, em princípio, o posto de trabalho a ocupar não pode se assegurado por um trabalhador em situação de suspensão do contrato de trabalho. De facto, os trabalhadores que estão em casa, com a categoria de Operário Fabril, com o contrato de trabalho suspenso, poderão não ter a qualificação necessário ao desempenho destas tarefas, pelo que, verificando-se essa falta de qualificação, poderá a empresa contratar novos trabalhadores para serem alocados ao departamento de vendas online.

Em suma, a contratação de novos trabalhadores durante o período de lay-off é possível, devendo, contudo, ser casuisticamente aferida.

 

 

 

 

 

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