Poliarquia – o que é?

Por Diogo Alarcão, Gestor

Confesso que não sabia o que era, até ler um texto de Nick Obolensky, fundador da Complex Adaptive Leadership Ltd. É muito interessante perceber como este pensador aplica o conceito de Poliarquia ao contexto empresarial: o exercício da liderança por muitos. A liderança é dinâmica e deixa de ser vista como um atributo ou função atribuível apenas a alguns. A poliarquia, para Nick Obolensky, não significa o fim das oligarquias, mas apenas mais um passo na evolução do exercício da liderança e recorda-nos que, apesar dos progressos tecnológicos a que assistimos (exponenciais, nas últimas décadas), continuamos a exercer a liderança como concebida há 4.000 anos; isto é, fundada no princípio da oligarquia, em que o poder está concentrado num número restrito de pessoas.

Pergunto-me se é possível liderar uma organização com base na poliarquia. Ao observar o que tem acontecido nos últimos anos, nomeadamente com a chegada dos millennials ao mercado de trabalho, mas também com a hiperconectividade em que vivemos e, mais recentemente, com o crescimento das formas de trabalho flexível, a resposta parece-me óbvia: Sim, é possível e desejável evoluir para modelos poliárquicos de liderança.

Porquê?

Desde logo, porque o acesso e a rapidez com que a informação é disseminada não me parece compatível com lideranças concentradas num número restrito de pessoas. Pretender que se pode controlar hoje numa empresa, e ainda para mais através de um grupo restrito de pessoas, toda a informação, parece-me ambicioso e ingénuo. Por outro lado, é indiscutível que é necessário continuar a ter mecanismos de gestão e de controlo de informação, nomeadamente quando está em causa uma decisão crítica de gestão, por exemplo. Todavia, parece-me possível conjugar ambas as realidades: disseminação e controlo da informação. O recurso a modelos poliárquicos de gestão pode ser uma solução porque, ao envolver todos na definição das regras da empresa, criam-se as condições para maior transparência. Se as pessoas que trabalham numa organização tiverem acesso à informação e sentirem que podem co-construir as políticas e procedimentos que irão reger todas as pessoas, estarão menos predispostos ao boato, à maledicência, ao “bota-abaixo”, à “rádio alcatifa”…

Por outro lado, as novas gerações que estão a entrar no mercado já “nasceram digitais” e, como tal, estão formatadas para influenciaram de forma quase automática, à distância de um clique, tudo o que os rodeia. Influenciam e deixam-se influenciar ininterruptamente, debatem e consensualizam à distância, geram expetativas e mobilizam-se a partir de bites. É, pois, natural que também tenham a expetativa de que esta forma de estar no Mundo possa ser transporta para as organizações onde começam agora a trabalhar. Mais uma vez, parece-me que um modelo poliárquico de gestão, isto é assente numa liderança mais participativa e dispersa, pode dar uma boa resposta a estas expetativas. Creio que é isso que as novas gerações esperam e anseiam ao entrar no mundo do trabalho. Ao responder como modelos poliárquicos estaremos a garantir o seu envolvimento e compromisso. Pelo contrário, se persistirmos em modelos tradicionais de gestão e de liderança, estaremos a desperdiçar o enorme potencial criativo e colaborativo que estas gerações adquiriram na sua aprendizagem e crescimento “sócio-digital”.

Por último, acredito que a adoção de modelos poliárquicos de liderança ajudará a colmatar algumas das dificuldades decorrentes das diferentes formas de trabalho flexível (trabalho remoto, teletrabalho ou trabalho a tempo parcial, entre outras) e, mais uma vez, a estimular o espírito colaborativo e criativo. São inúmeros os exemplos de auto-regulação e adaptação a que assistimos durante estes tempos de confinamento. É certo que muitos dos modelos de continuidade de negócio foram desenhados pelas estruturas centrais, mas é inegável que temos assistido a uma capacidade de inovação na forma como estamos a trabalhar, colaborar e comunicar que surge na base das organizações de forma espontânea. Seria uma oportunidade perdida e uma pena se essas práticas se perdessem ou fossem anuladas por uma decisão do órgão de gestão, sem pelo menos se ouvir e envolver as pessoas.

Parece-me que os tempos que vivemos são propícios a experimentarmos este novo modelo poliárquico de liderança em que as regras são definidas por todos. Não recomendo com isto o fim dos órgãos tradicionais de gestão. Apenas sugiro que se olhe, como Nick Obolensky, para a poliarquia como uma evolução do exercício da liderança nas empresas e organizações, mas também nas instituições públicas que nos regem e na sociedade civil em geral.

Ler Mais