Por que existem tão poucas mulheres ligadas ao mundo das tecnologias?

Questionamo-nos por que existem tão poucas mulheres ligadas ao mundo das tecnologias. Está estudado que estes números nada têm que ver com questões biológicas ou de capacidade, mas que se devem à educação que recebemos desde meninas.

 

Por Armanda Machado, Consulting Services director Ibéria & África Lusófona na Cegid

No momento de escolher uma profissão, optei pela Engenharia de Sistemas e Informática. Na altura não sabia verbalizar bem o que me levou a este curso. Talvez o gosto pela matemática, pela lógica. Existem hoje estudos, que mostram que a pouca adesão das mulheres ao mundo das tecnologias tem sobretudo a ver com as condicionanetes do contexto social e familiar. As meninas são menos expostas a brinquedos de «construção», que desenvolvem competências lógicas.

Tive sorte, porque na minha infância, para além dos brinquedos de menina, tinha muitos Lego e vários brinquedos de blocos e de contrução. Hoje, conhecendo os estudos feitos, concluo que a minha escolha pelas tecnologias pode ter sido de facto influenciada por esta exposição que tive em pequena.

Estas apetências que desenvolvemos em criança, aliadas a um forte sentido de dedicação que caracteriza o género feminino, dão-nos as bases para abrirmos mais os nossos horizontes, quer nas escolhas que fazemos ao longo do percurso escolar, quer depois no decorrer da carreira profissional.

Ao longo do meu percurso, fui muitas vezes uma mulher entre homens. Por exemplo, no mestrado que fiz em tecnoglogias de informação no Reino Unido, onde era a única mulher, numa turma de 28 pessoas. No início foi constrangedor, admito! Não esperava esta realidade. Mas com o tempo, e com trabalho, senti que fui respeitada e valorizada.

Já no mundo do trabalho, também enfrentei desafios. Na primeira entrevista que fiz, alertaram-me logo que seria uma posição exigente em termos de disponibilidade. E lá surgiu a pergunta clássica: se, como mulher, estava disposta, a esse sacrifício.

É verdade que conciliar um trabalho exigente, seja ele em tecnologias ou noutra área, com uma vida familiar equilibrada não é fácil. Nem para mulheres nem para homens. Aqui a diferença poderá ser porque chamamos a nós muitas responsabilidades, que até poderíamos gerir de forma mais distribuída. De facto, conciliar estas realidades não pode ser fruto do acaso. Tem de ser um processo consciente, com decisões que ora valorizam uma ou outra vertende, dependendo do momento pessoal e profissional em que nos encontramos.

Recordo-me, por exemplo, que rejeitei uma progressão na carreira após regressar ao trabalho, depois da minha segunda licença de maternidade. Na altura decidi rejeitar a proposta de participar mais activamente em projectos internacionais porque senti que era um momento para estar mais próxima da minha família. E não me arrependo nada dessa decisão, nem sinto que isso tenha limitado a evolução da minha carreira.

Na minha opinião, independentemente do género, o que importa é saber conciliar os dois mundos e isso é perfeitamente possível. Aliás, considero que estamos perante um ciclo vicioso, e que cada vertente, profissional e pessoal, influencia a outra. Sermos bem-sucedidos no trabalho, ajuda-nos a estarmos melhor em família e vice-versa.

Na minha opinião, o foco deve estar no valor que a pessoa agrega e nunca no seu género. No meu caso, tive a sorte de, ao longo do meu percurso profissional, me cruzar com homens e mulheres que eram seres humanos fantásticos, que valorizam as competências profissionais, independemente do género. Felizmente, a esse nível não me recordo de situações muito difíceis. Naturalmente que estamos expostas a contextos onde o número de homens é muitas vezes superior, mas não vejo isso como um problema. Apenas temos de investir na preparação, temos de nos fazer ouvrir, saber mostrar o nosso valor e sermos nós mesmas. O resto virá naturalmente.

Mas não podemos esperar que tudo aconteça por acaso. A educação tem um papel fundamental na eliminação de esteriótipos, principalmente na infância. Resultou comigo e está também a resultar no meu seio familiar. Na educação das minhas três filhas, sempre procurei   mostrar diversidade através de coisas simples como oferecer brinquedos de diversos tipos, mesmo os tradicionalmente mais orientados a rapazes, como um robô programável.

Acredito que esses pequenos gestos tiveram impacto nas suas decisões relativas à área profissional, pois neste momento uma das minhas filhas é engenheira informática, especializada em cibersegurança, e outra quer também seguir uma carreira de engenharia. Mas não somos só uma família de engenheiros, a mais velha seguiu uma carreira na área da saúde. Por isso, acredito que a mensagem da diversidade e de que tudo é possível se assim o quisermos, sempre esteve lá.

A minha história e percurso pessoal fazem-me acreditar que é preciso desenvolver as bases, para se criarem verdadeias condições que não limitem à partida as opções e depois mostrar valor.

Felizmente, no meu caso, não senti essa descriminação que tanto se comenta e que os números mostram que efectivamente existe. Particularmente no mundo ocidental, muito se tem feito relativamente à igualdade de oportunidades das mulheres, embora ainda exista um longo caminho pela frente e para o qual todos podemos/devemos contribuir.

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