Turbinar o mercado sénior

Por Isabel Moisés, directora executiva de Recursos Humanos do Grupo Secil

De 1960 a 1990 a esperança média de vida aumentou cerca de 11 anos. De lá para 2019 voltou a aumentar 7 anos, ou seja nos últimos 60 anos, o aumento total é de 18 anos e as projeções para as próximas décadas apontam para um aumento de 9,5 anos (fonte: Prodata e INE).

Ou seja, em 2019, as Mulheres (que é quem morre mais tarde) tinham uma esperança média de vida de 83 anos e reformavam-se entre os 64 e os 65 anos (64,3 é a idade média de reforma do ano de 2019), ou seja, vivem potencialmente cerca de 19 anos mais depois de deixarem de trabalhar.

O tema é denso, tem vários ângulos macro-económicos desafiantes e preocupantes, pelo que vou reflectir, aqui, apenas sobre um dos lados do problema – o dilema de gestão sobre como assegurar trabalho de valor aos seniores, com condições para que continuem a contribuir com o seu conhecimento, motivação e maturidade, para os resultados? E como garantir o rejuvenescimento  da estrutura sem afastar os seniores da empresa? E que modelos e novas soluções estruturais podem as empresas construir e implementar, que integre e otimize as diferentes fases de vida de cada colaborador e da força de trabalho como coletivo? A resposta a estas questões é fundamental para sermos bem sucedidos na execução dos compromissos de sustentabilidade empresarial.

Em algumas abordagens de coaching de vida trabalha-se o conceito do ciclo de vida comparando-o a um dia, porque ajuda a demonstrar a finitude da vida e a identificar e compreender as diferentes características, exigências, motivações e emoções que atravessam naturalmente cada parte do dia ou da vida.  O conhecimento, a condição física, mental e emocional, a energia, a motivação, a experiência e a produtividade dependem, também, das circunstâncias de cada ciclo de vida. Quer isto dizer, que o maior conhecimento e compreensão do ciclo de vida das pessoas, quer no seu elemento individual, quer no seu elemento coletivo pode ser um auxiliar fundamental para que a gestão obtenha respostas que integrem e otimizem o ativo humano na empresa e na sociedade.

Para entendermos melhor esta analogia do dia com a vida, digamos que ao amanhecer do dia correspondem os anos da infância (até as 9h= 10/11 anos), de aprendizagem intensa, experimentação e dependência, a manhã abarca a adolescência e a formação adulta (das 10h às 11h = dos 11 aos 21 anos) caracterizada por um período de grandes transformações, por sua vez, o horário do almoço (12-13 h) corresponde ao meio da vida (nos anos 60 seríam os 30 anos e atualmente os 40 anos) caracterizado por época de grandes responsabilidades e, depois vem o pós almoço, início da tarde (15h = 50 anos) com a esperança renovada de se fazer o que não se conseguiu fazer de manhã e, de repente, são 17 horas (60 anos) e começa o entardecer e o pôr do sol aparece e desaparece num ápice (19h = 70 anos) e cai a noite (21h = 80 anos).

Normalmente faz-se esta análise dos ciclos de vida em 4 fases – infância, adolescência, vida adulta e velhice. A vida adulta é assinalada pelo marco do 21 anos e o próximo marco, o da velhice, tem vindo recentemente a ser associado aos 75 anos (recomendação da Organização Mundial da Saúde pela permanência no mercado de trabalho de pessoas ativas até aos 65 anos). A fragilidade desta abordagem é que agrega na fase adulta cerca de 50 anos da vida (tomando em consideração os 75 anos como início da velhice) não conseguindo por isso refletir as características, desafios, complexidade e mudanças a que a vida de uma pessoa é submetida durante todo esse período.

Como é que, então, a gestão estratégica pode endereçar este dilema da otimização do emprego sénior? Aumentando o seu entendimento das condições de motivação e realização, perfil de competências e produtividade dos seus ativos pessoas, aceitando que os desafios associados a custo, qualificação, bem como de organização e flexibilidade do trabalho, que têm vindo há muito a ser abordados para enquadrar e aumentar o emprego jovem (tradicionalmente visto como menos produtivo por ausência de experiência), são agora aplicáveis também ao emprego sénior. Essa fase de acumulação de grande experiência e maturidade de vida pode e deve ser potenciada.

No entanto, o modelo de trabalho e as funções exercidas nos primeiros 25 anos de vida ativa adulta podem não ser replicáveis com a  mesma produtividade nos segundos 25 anos, pelo que terão de ser exploradas e equacionadas outras funções e outros papeis,  dos quais alguns poderão assumir a forma de ensino e transferência de conhecimento e suporte à melhoria da eficiência organizacional e das sociedades.

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