Um EVP para relações duradouras

Por Carlos Sezões, Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders

Num artigo recente de Mark Mortensen, professor do INSEAD, é focado um tema com que já me deparei em alguns dos meus projectos de consultoria de engagement, transformação cultural ou mesmo employer branding: a questão da satisfação (curto prazo) versus a dimensão do compromisso emocional (de médio ou longo prazo). Clarifico e aprofundo a questão.
Como sabemos, os últimos anos trouxeram um conjunto de desafios para as organizações. A pandemia acelerou a adopção do trabalho remoto/ flexível e o bem-estar passou a figurar no topo das dimensões de atracção (e retenção) das empresas. O escrutínio sobre o propósito e o significado do que se faz num job-role, e no âmbito da missão da equipa, ganhou igualmente primazia nas expectativas de cada profissional.
Para muitas organizações, a abordagem para garantir uma boa proposta de valor (o chamado EVP – Employer value proposition) tem sido questionar as pessoas sobre o que elas desejam (seja aumentos salariais, mais benefícios e incentivos, mais proporção de trabalho remoto) e tentar, dentro do razoável, satisfazer os seus pedidos.  Tal parece uma atitude de linear bom senso, mas apresenta um downside:  foca-se nos elementos mais básicos que primeiro vêm à mente dos colaboradores (nem sempre os mais impactantes) e confere uma natureza excessivamente “transacional” ao relacionamento empresa-indivíduo. Mesmo como tática mais instrumental, focada em melhorar compromisso, pode não ser a receita para o sucesso. Por exemplo, níveis adicionais de trabalho remoto podem trazer níveis de conforto e satisfação de curto prazo mas, com o tempo, muitas pessoas que antes reivindicavam tal questão, sentem-se menos conectadas com suas empresas e com a sua equipa. Tentar “comprar” a lealdade, de forma directa e acrítica, não é definitivamente eficaz e sustentável.
No seu artigo, e à semelhança de outros modelos propostos recentemente, Mark Mortensen sugere um sistema holístico, composto por quatro dimensões, inter-relacionados, num equilíbrio curto prazo vs longo prazo e individual vs coletivo. A saber: 1) ofertas materiais – compensação fixa e variável, espaço físico das instalações, equipamentos, benefícios diversos, flexibilidade e outros perks;
2) crescimento e desenvolvimento – todas as formas como a organização apoia os colaboradores a adquirir novas competências e experiências, que incrementem a sua empregabilidade e o seu valor no mercado de trabalho;
3) conexão e comunidade – toda a “curadoria” cultural, de fomento do conhecimento mútuo e interação, bem como processos que assegurem apreço, reconhecimento e valorização de indivíduos e equipas; em suma, passar do patamar de team-building para team-bonding;
4) significado e propósito: todas as estratégias (assentes numa visão clara, cultura consistente e comunicação impactante), que enalteçam as razões aspiracionais da organização para existir e proporcionam a noção do que se faz e do impacto que se pretende.
Para conseguir construir um EVP com estas características, integrado e sustentável no tempo, os líderes (de topo e intermédios) e as áreas de gestão de talento devem assumir uma análise e um pensamento mais estratégico. E, em cascata, definirem uma agenda de diagnóstico, planos de acção e monitorização – com comunicação transparente e feedback regular. Na comunicação interna, na reestruturação de alguns processos RH ou na criação de iniciativas de transformação cultural, deve existir uma linha de rumo. Para que EVP’s consistentes possam gerar excelentes locais para trabalhar e relações duradouras, neste volátil mercado de trabalho.