Vera Rodrigues, MC Sonae: Quem tem medo da IA?

A inteligência artificial (IA) não veio para matar o emprego, mas veio para ficar e para transformar como as empresas operam e como as pessoas trabalham. Há obviamente riscos que devemos acautelar, mas esses riscos não podem nunca bloquear-nos.

 

Por Vera Rodrigues, head of People da MC Sonae

 

O World Economic Forum publicou no seu “Future of Jobs Report 2023” dados verdadeiramente impressivos sobre o que os próximos cinco anos nos reservam. Numa análise feita a 45 economias e a 673 milhões de postos de trabalho, estima-se que 69 milhões de postos de trabalho sejam criados e 83 sejam eliminados, por força de um conjunto de macrotendências que já se fazem sentir, nomeadamente, alterações tecnológicas e de competências. Nesse estudo, antecipa-se que cerca de 23% das funções actualmente existentes vão sofrer alterações na forma como são executadas, e acrescenta ainda, entre outros elementos, que 75% das empresas inquiridas estimam recorrer à inteligência artificial generativa para superar os desafios de crescimento e gestão da sua actividade e dos seus negócios.

Neste contexto, competências como “inteligência artificial e big data” ou “literacia digital e tecnológica” surgem como duas das 10 skills que terão necessariamente de florescer e despertar no nosso horizonte, de modo a fazermos caminho nesse processo de profunda transformação do mundo do trabalho, à escala global.

Nesta matéria, do meu ponto de vista, os gestores de pessoas e os profissionais de Recursos Humanos terão de assumir especial protagonismo e preponderância, como autênticos “first movers” deste processo de mudança. Devem ser eles, desde logo, os elementos mobilizadores, ajudando as suas organizações a acabarem de vez com a velha dicotomia “homem vs. máquina”, promovendo uma agenda de efectiva transformação nas suas empresas. A tecnologia, a digitalização de processos e/ou a IA não vieram para matar o emprego. Mas vieram, assumidamente, para ficar e para transformar como as empresas operam e como as pessoas trabalham, desenvolvem as suas funções e entregam o output do seu trabalho.

Acredito que as mudanças que vivemos permitirão tornar as empresas mais competitivas e mais eficientes, mas, ao mesmo tempo, irão transformar profundamente muitas das funções que hoje conhecemos, eliminando, designadamente, tarefas repetitivas e rotineiras que ninguém gosta ou, na verdade, ninguém quer continuar a fazer. E por isso, a pergunta que verdadeiramente importa – e que todos temos de individualmente fazer, nos contextos em que vivemos –, é como poderemos tirar partido da complementaridade “homem-máquina” ao invés de ficarmos retidos em discussões – muitas vezes estéreis – sobre até onde vai a IA e quais são os limites éticos que podemos vir a transgredir.

Há obviamente riscos que devemos acautelar, mas esses riscos não podem nunca bloquear-nos, inibir-nos ou impedir-nos de melhorar como trabalhamos e a experiência que proporcionamos aos colaboradores das nossas empresas. A IA irá certamente até onde o Homem quiser levá-la, mas se nos focarmos prioritariamente nos problemas que podemos ajudar a resolver tirando o melhor partido dela, daremos um contributo decisivo e verdadeiramente estratégico para a reflexão que urge e que se exige nas nossas organizações. E, com isso, enquanto gestores de pessoas, seremos verdadeiros aliados da agenda estratégica que se impõe às nossas empresas.

Acredito que a inteligência artificial pode ser a chave, principalmente para a falta de produtividade e para a escassez de talento de que tanto se fala. Numa economia e num país como o nosso, pode ser parte da solução para vencermos o desafio do envelhecimento da população, da escassez de mão-de-obra e da falta de competitividade, como alguns dos principais entraves ao crescimento sustentado da economia portuguesa, no longo prazo.

Neste contexto, deixo a pergunta: “Quem tem medo da IA”?

 

Este artigo foi publicado na edição de Setembro (nº. 153) da Human Resources, nas bancas.

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