
O presente e o futuro da formação, visto pelas empresas e pelos especialistas
O presente e futuro da formação estiveram em discussão na mesa redonda promovida no âmbito da disciplina Formação e Desenvolvimento do mestrado em Gestão de Recursos Humanos do ISEG.
Ana Assunção, directora da Universidade Corporativa TAP; Maria João Ceitil, coordenadora de HR consulting na Cegoc; António Silva Pina, responsável da formação da Confederação de Turismo de Portugal e António Neto da Silva, CEO do Instituto de Formação Bancária foram os convidados, tendo a moderação ficado a cargo de José Manuel Dias Lopes, professor do ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão.
Quando questionada sobre como a questão da formação certificada é gerida na TAP, Ana Assunção fez notar que a actividade da TAP é fortemente regulamentada e tem exigências a nível dos reguladores do sector. E por isso é necessário satisfazer os requisitos normativos que se impõe e a formação está presente em todos eles. «Se por um lado alivia um bocadinho os serviços no sentido da concepção dessas formações porque é de tal maneira regulamentada que a formação tem de ser dada de acordo com aquilo que é exigido. Por outro lado é um peso a nível do controlo porque por exemplo se um colaborador de terra tiver uma formação certificada podem perder-se certificações. Entre 75% e 80% da formação da TAP é formação certificada», esclarece.
Por isso – explica a responsável explica – todos os técnicos que estão obrigados a este tipo de certificação como pilotos, pessoal de cabine, técnicos de manutenção de aeronave têm de ter formação técnica específica obrigatória e não pode ser descurada.
Sobre o mesmo tema, António Neto da Silva referiu que, na banca, as directivas vêm da Comissão Europeia e que desde Julho de 2017, o Instituto de Formação Bancária tem certificado, em média, por ano 30 mil estudantes nestas áreas de certificação obrigatória.
«Nesta área da formação e das certificações estamos enquadrados com a European Banking & Financial Services Training Association (EBTN). As pessoas devem ser formadas e são obrigadas a aprofundar o conhecimento sobre literacia financeira dos seus clientes procurando perceber se estes percebem exactamente o que lhes é explicado. O Instituto de Formação Bancária foi a primeira entidade a estar certificada para dar certificação no domínio de crédito tributário», explica.
José Manuel Dias Lopes questionou depois como é que a Cegoc, a partir de um país pequeno, consegue ter uma presença forte no seio do grupo Cegos. Maria João Ceitil deixou claro que a Cegoc tem capacidade de se reinventar, de inovar e isto tem ajudado. «Por exemplo, esta transformação digital que está na ordem do dia está a ser feita há muitos anos na Cegoc.» E acrescentou «a equipa em Portugal é muito coesa, forte e inovadora. Temos um CEO que nos desafia todos os dias e acho que é isto que nos faz destacar. Apesar da pandemia conseguimos ser uma das únicas filias do grupo com resultados positivos».
Sobre as vantagens da intervenção Confederação de Turismo de Portugal na área da formação e se é replicável para outros sectores, António Silva Pina referiu que «este é um sector tremendamente exposto à concorrência e à globalização, por isso se há inovação, se há mudanças entram rapidamente na área do turismo e por isso temos de nos adaptar. Actualmente a probabilidade de um turista voltar ao mesmo país é extremamente escassa. Se não houver uma tentativa de fidelização de clientes e isso implica uma qualificação da oferta».
O responsável frisou que a formação turística é feita em exclusivo pelo digital e não tem dúvidas que a tecnologia vai introduzir grandes mudanças nas qualificações. «O turismo daqui a 10 anos não vai ter nada a ver com o que é hoje, o que vai ter muitas implicações a nível de formação. Depois da crise sanitária, o turismo vai ter novos desafios, que estão relacionados com a tecnologia, as alterações climáticas, as viagens e a formação».
O impacto da pandemia
Para responder à questão, se com a pandemia, o processo de profunda transformação tecnológica vai acelerar ainda mais ao nível da formação, Ana Assunção não tem dúvidas que «quem não investir na inovação morre. Precisamos de respostas a curto prazo, não temos tempo para pensar antes de agir e é aqui que a tecnologia traz vantagens. A Inteligência Artificial (IA) replica mecanismos da mente humana para resolução de problemas complexos e isso foi uma aceleração brutal para nos permitir responder mais rapidamente às questões do dia-a-dia e por isso é importante que as organizações invistam na inovação.»
Maria João Ceitil concordou e disse ainda que a formação tem-se vindo a transformar e tem que continuar a transformar-se. «A antevisão que se faz dos próximos anos obriga-nos a repensar o que se conhece tipicamente como transformação. A formação tem de deixar de ser centrada no conhecimento, e deve ser concentrada naquilo que é a transformação das skills. As sofs skills hoje e amanhã serão a nossa arma do sucesso. As skills técnicas são fáceis de desenvolver, mas é difícil preparar as pessoas em termos de soft skills para este novo contexto que estamos a viver.»
Já António Neto da Silva deixou claro que no Instituto de Formação Bancária, a transformação digital foi feita muito rapidamente. Muita formação era feita em e-learning mas a partir de Março passou a ser feita por Zoom e Microsoft Teams. «O mundo está a mudar a uma velocidade vertiginosa, o que significa que aquilo que ensinamos e a forma como o fazemos tem de mudar.»
Para o CEO do Instituto de Formação Bancária, há quatro mudanças fundamentais. O estudo vai saltar para um nível de conectividade, colaboração e co-criação. A tecnologia tem que ser completamente plasmada no ensino, tem de agarrar.
Por outro lado, o ensino vai passar a ser customizado, «vamos ter de saltar de um modelo pronto-a-vestir para um modelo customizado.» E os professores vão deixar de ser transmissores de matéria para serem facilitadores para os alunos a chegarem aos patamares que desejam.
António Silva Pina acredita que a aprendizagem será física e virtual e que as aulas e reuniões virtuais vão ficar. «Quando se fala em Inteligência Artificial fala-se em big data, IOT. Aspectos com a gamificação, a realidade virtual, a realidade aumentada vão ser usadas para a formação a muito breve prazo. O futuro da formação vai estar ligado à resolução de problemas».
O responsável explicou que a grande preocupação da OCDE é que a educação e formação quer universitária, quer profissional não está a acompanhar a transformação digital. «A própria CE estabelece competências fundamentais para o futuro, entre as quais se destacam a engenharia, a gestão e a inovação, três áreas fundamentais na transformação digital que se vive. A pandemia só veio acelerar o processo».
Para concluir, os oradores foram questionados como é que a academia pode ser um parceiro activo para os desafios que as áreas de formação vão ter nos próximos anos. António Neto da Silva começou por dizer que é fundamental alinhamento. «Em todas as empresas há um board, a quem compete provocar o alinhamento da economia. É essencial pôr as pessoas a remar para o mesmo lado. Nenhum chefe consegue pôr as equipas a remar para o mesmo lado se não explicar porque é devem remar apara aquele lado.»
Já Maria João Ceitil desafia as universidades a saírem um bocadinho da academia e as empresas a saírem um bocadinho dos negócios. «O conhecimento científico que é promovido nas universidades pode ser optimizado para o mundo dos negócios. É importante as empresas e as universidades trabalharem em conjunto para trazer o conhecimento científico para o mundo das empresas e produzir valor.».
Na opinião de António Silva Pina tem de haver uma grande flexibilidade do ponto de vista curricular e o modelo de ensino universitário dividido em anos e semestres vai acabar. «Tendo em conta que no futuro vão ser eliminadas profissões e vão ser criadas outras, tem de haver da parte das universidades um alerta sobre as necessidades das organizações e a criação currículos adaptáveis.»
Ana Assunção concorda e refere que «são conhecidas experiências de ensino diferentes das promovidas em Portugal e que são mais atractivas por isso é importante reflectir sobre isto para que possa haver uma reinvenção». E conclui referindo que as empresas deveriam ter como prioridade criação de uma relação com as universidades.