Alexandra Cesário, Kleya: «Portugal poderá atrair muitos “teletrabalhadores” estrangeiros»

A pandemia veio acelerar algumas tendências, nomeadamente o teletrabalho, a intensificação da distribuição digital e a valorização da experiência e qualidade de vida. Ganha assim nova relevância o corporate worker relocation, que talvez evolua para relocation do teletrabalho, pois «os departamentos de RH vão passar a gerir trabalhadores dispersos por vários pontos do mundo», acredita Alexandra Cesário, Customer Experience Officer da Kleya, que explica em que consiste este conceito, a importância que assume e quais os principais desafios actuais. 

Por Sandra M. Pinto

 

Olhando para as tarefas actuais de um responsável de Recursos Humanos não diríamos que a responsabilidade de executar os “corporate worker relocation” estavam incluídas. Mas a verdade é que estão, pois é esse departamento que procura as soluções para os colaboradores ou, em alternativa, recorre às agências internacionais de relocation das próprias empresas, a maioria delas situadas noutros países.

Atentas a esta situação, começaram a surgir no mercado as agência privadas nacionais, que, apesar de ainda reduzidas em número, vêm preenchem esta necessidade do mercado a qual se acentuou com a pandemia. Falámos com Alexandra Cesário, Customer Experience Officer da Kleya, «consultora one-stop shop que presta assessoria independente e 360º», para perceber as vantagens e os desafios, bem como as tendências que se colocam ao “corporate worker relocation”.

 

Exactamente em que consiste o corporate worker relocation?

A corporate worker relocation consiste no apoio à mudança de país de um trabalhador e da respectiva família, bem como de outros membros do agregado familiar, por exemplo, animais de estimação. Pode incluir alguns aspectos mais óbvios, como o “procurement” de um visto de trabalho, o apoio na embalagem, mudança e entrega dos bens, o registo dos filhos na escola, a acomodação temporária no país de destino, mas cada vez mais inclui o próprio apoio fiscal, a procura do local para morar, a integração cultural, cursos de idiomas, entre inúmeras outras coisas.

 

Quais são hoje as principais dificuldades que se colocam à corporate worker relocation?

Hoje em dia, as expectativas de um trabalhador expatriado são mais elevadas, ou melhor, a procura de experiências e os critérios qualidade de vida são tão ou mais importantes do que o tradicional “pacote” salarial , mas a realidade é a de que algumas empresas não têm recursos dedicados ou suficientemente capacitados para ir ao pleno encontro de tais expectativas, numa lógica de contínuo apoio 360º a esses trabalhadores. O desafio não passa apenas por encontrar uma escola, mas a escola que melhor corresponda ao perfil e tipo de ensino dos filhos, ou em encontrar apenas uma casa para viver, mas a casa que faça mais sentido à luz das necessidades identificadas.

Perante um mundo global onde as empresas têm de gerir forças de trabalho e onde a diversidade é cada vez maior, é impossível encontrar um “fato único” para a relocação dos trabalhadores expatriados. Acresce a isto o facto das empresas estarem presentes também num cada vez maior número de países e regiões. Num cenário de maior globalização, torna-se por isso infinitamente mais importante para as empresas contarem com recursos locais que têm o know-how para encontrar as melhores soluções para o trabalhador expatriado – e isto pode fazer toda a diferença. A “aterragem menos suave” num país estrangeiro pode afectar o foco no trabalho ou a produtividade e, portanto, afectar algo que a empresa verdadeiramente procura.

 

Mudaram elas muito devido à pandemia?

A pandemia veio acelerar algumas tendências, nomeadamente o teletrabalho, a intensificação da distribuição digital e, como já falámos, a valorização da experiência e qualidade de vida. Isso faz com que, por exemplo, a preocupação em assegurar uma casa e boas condições ao trabalhador expatriado seja ainda mais importante. O novo local de trabalho é a própria casa ou uma esplanada à beira mar, pelo que no limite o escritório, como o conhecemos, pode deixar de existir. Surgem, por conseguinte, novos desafios no acompanhamento do trabalhador, em especial do trabalhador expatriado. É por isso que a “corporate worker relocation” não deve estar limitada apenas ao processo de “aterragem”, mas abrir-se a soluções de continuidade.

 

A quem, dentro da organização, compete realizar a corporate worker relocation?

Por norma é o departamento de recursos humanos que dá apoio aos profissionais realocados, complementado pelo departamento jurídico, mais em matérias relacionadas com os vistos de trabalho.

 

Que ferramentas possuem os departamentos de Recursos Humanos para executar uma boa corporate worker relocation?

Existem actualmente softwares para fazer a gestão de trabalhadores expatriados, mas estão ainda muito focados na gestão de custos e no controlo desta força de trabalho. Há também plataformas que procuram agregar vários prestadores de serviços, empresas na área da “relocation” e os profissionais de recursos humanos. No entanto, a melhor ferramenta é a pesquisa levada a cabo por agentes regionais ou locais no que diz respeito aos desafios que se colocam, de modo a que o departamento de Recursos Humanos possa fazer uma avaliação das melhores estratégias a seguir e dos recursos a reunir, dentro e fora da empresa, executando com sucesso todo o processo.

 

Não sendo esta uma área de especialização dos Recursos Humanos, são essas ferramentas eficazes? Porquê?

As ferramentas não garantem a eficácia por si, são apenas um recurso para facilitar o trabalho. Em derradeira análise, o que vai fazer diferença é uma forma de assessoria, regional ou local, que faça a avaliação inicial, a execução da estratégia de “relocation” e o seu acompanhamento. Chamo-lhe assessoria porque consiste num conhecimento especializado de agentes ou organizações locais, que compreendem ou dominam as soluções alternativas fundamentais possíveis para os diferentes tipos de perfis dos trabalhadores e respetivas empresas.

 

Uma corporate worker relocation bem sucedida deve estar assente na actuação de agentes nacionais especializados?

De modo geral, sim. Trata-se do famoso paradoxo da globalização: para singrar, são necessários os melhores recursos locais. Por muito que as fases genéricas de “relocation” sejam iguais em qualquer parte do mundo, as particularidades de cada burocracia, a cultura, os costumes locais e, sobretudo, a importância de responder às necessidades específicas do corporate worker em termos de experiências com significado e em qualidade de vida, fazem com que os agentes especializados em cada local sejam activos inestimáveis.

Na verdade, estes estão nas melhores condições para antecipar os desafios de forma mais eficaz, o que permite um melhor planeamento e isso traduz-se numa questão que continua a ser muito importante para as empresas: a poupança de custos. Para dar um exemplo mais concreto, apesar das empresas disponibilizarem agentes globais, com os quais têm contratos para assegurar as necessidades de “relocation” a um custo definido, os próprios trabalhadores por vezes preferem pedir à sua empresa para encontrar um agente nacional especializado, conseguindo não só um custo inferior, mas também um nível de satisfação significativamente mais elevado.

 

De que forma podem estes ajudar os Recursos Humanos nesta actividade?

Em tudo. Começando com a identificação dos principais desafios que emergem de necessidades concretas de relocation – possibilitando um planeamento adequado da mesma. Depois, na própria execução do plano. Aos RH caberá essencialmente monitorizar o processo e recolher o feedback dos seus trabalhadores expatriados.

 

Podem estas agência privadas nacionais ajudar, além de entidades corporativas, pessoas singulares?

Na verdade, sim. Aliás, esse é o percurso da Kleya. Foi o nosso track record com pessoas singulares que chamou à atenção de empresas que necessitavam de dar um apoio mais efetivo e no terreno aos seus trabalhadores expatriados. Uma dessas empresas é o Grupo Ageas. E hoje já fazemos parte do Grupo Ageas como marca Beyond Insurance.

 

Quem procura mais os vossos serviços?

Como continuamos a trabalhar tanto para entidades corporativas, como para pessoas singulares, temos um perfil de cliente muito diverso. Abrange pessoas que vêm para Portugal depois de uma vida profissional bem-sucedida e que se mantêm ativas gerindo os seus próprios negócios a partir de Portugal, empreendedores, pessoas que escolhem o nosso pais como destino de investimento podendo não viver cá a maior parte do tempo e, claro está, os quadros expatriados.

 

Quais os serviços disponibilizados por uma consultora one-stop shop?

Focamo-nos no apoio a estrangeiros que desejam viver ou investir em Portugal através de 4 eixos: Property, onde funcionamos como agentes do lado de quem quer comprar ou arrendar; Residency Planning que abarca todas as questões relacionadas com autorização de residência; Relocation, que se ocupa das várias questões práticas, como por exemplo a contratação dos utilities ou o registo no SNS; e Consultoria, para poder aconselhar em questões mais complexas, nomeadamente no planeamento da “aterragem” em Portugal. Temos uma equipa de consultores dedicados com várias valências e backgrounds distintos, e contamos com um ecossistema de parceiros em várias áreas, deste a financeira até ao aconselhamento legal e tributário, para que possamos efectivamente ter uma abordagem 360º orientada para uma pessoa que escolhe o nosso país para viver ou investir.

 

Em que consistem os serviços Kleya Membership e o Life Made Easier?

Tratam-se essencialmente de serviços de continuidade: O Life Made Easier (LME) é uma oferta “premium” onde o cliente, neste caso um cidadão estrangeiro já instalado em Portugal, tem um assistente pessoal dedicado a quem pode recorrer para o aconselhar em várias questões do dia-a-dia e, sobretudo, para poder continuar focado no seu trabalho sem estar preocupado com a coordenação de outros prestadores de serviços ou em resolver questões burocráticas. Dado que muitos destes clientes viajam frequentemente em trabalho ou durantes alguns meses regressam ao seu país de origem, o LME também assegura a gestão da casa do cliente na sua ausência ou simplesmente a verificação do correio e abrir as janelas em casa. O Kleya Membership é uma plataforma onde procuramos dar resposta de uma forma 100% digital às principais necessidades de um estrangeiro a viver em Portugal.

Nesta plataforma, para além de conteúdos sobre o que é viver em Portugal, temos um market place para encontrar vários prestadores de serviços desde um canalizador até a um veterinário, um “legal desk” onde um escritório de advogados dá resposta às questões do foro legal e também uma “calculadora de imobiliário”. Alguém que tenha uma casa alugada em Portugal e está a pensar comprar uma casa pode com o Kleya Membership indicar as características principais da casa e recebe uma estimativa do valor de mercado dessa propriedade. Tendo o Kleya Membership sido pensado como serviço de continuidade, fomos desafiados por alguns parceiros para oferecer esta solução enquanto “porta de entrada” para quem está a pensar vir viver para Portugal. Na realidade, esta plataforma pode ser usada para planear a vinda para Portugal, aceder aos vários prestadores de serviços e, claro, quando se acha que é necessário ter uma ajuda especializada, contratar os serviços da Kleya.

 

Que tendências identificam relativamente ao futuro da corporate worker relocation?

Há três tendências que, pelo seu impacto estrutural e alcance, vão ter um impacto em todo a nossa vida e claramente também irão afetar a “corporate worker relocation”: o teletrabalho, a intensificação da distribuição digital (incluindo o comércio eletrónico, ensino à distância, a telemedicina e as “fintech”) e a regionalização das cadeias de distribuição. Em particular, o teletrabalho vai possibilitar que os trabalhadores de grandes cidades, como Londres ou Nova York, possam vir teletrabalhar para países com condições naturais e infraestruturas essenciais para assegurar um nível elevado de qualidade de vida. Talvez deixemos de falar de “corporate worker relocation” porque os departamentos de RH vão passar a gerir trabalhadores dispersos por vários pontos do mundo.

O foco poderá deixar de ser o apoio na mudança para um novo país para poder passar a dar apoio continuo em vários locais do mundo recorrendo a vários agentes nacionais especializados. Estamos convencidos de que Portugal poderá atrair muitos “teletrabalhadores” estrangeiros e a Kleya estará cá, não só para fazer com que a experiência da mudança e instalação em Portugal corra da melhor forma possível, mas também para assegurar em continuo uma experiência com sentido.

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