Entrevista Gonçalo Rebelo de Almeida: «A nossa prioridade é reter os quadros actuais, contratar profissionais do sector a nível local e recrutar jovens licenciados»

Depois de mais de um ano com perdas de 60% a 70% nas suas receitas, as empresa do sector da Hotelaria  começam a sentir sinais de retoma. Para além do foco em manter o equilíbrio financeiro, há um outro desafio: a atracção de talento. Não é novo, mas, com «a pandemia, muitas pessoas mudaram de zona de residência e foram viver para outras regiões ou até países, outras optaram por mudar de ramo de actividade», constata Gonçalo Rebelo de Almeida, administrador do Grupo Vila Galé.

 

Por Ana Leonor Martins e Sandra M. Pinto

 

Tendo estado em layoff, o grupo hoteleiro português voltou ao mercado para recrutar, algo que não tem sido fácil. Para dar resposta a este desafio, está, sobretudo a reforçar a aposta nos jovens talentos à procura do primeiro emprego, mas também a recrutar no mercado brasileiro, onde a Vila Galé também tem uma forte presença.  Gonçalo Rebelo de Almeida falou Human Resources sobre os actuais desafios e prioridades do Grupo Vila Galé.

 

A hotelaria foi sem dúvida dos sectores mais afetados durante a pandemia. Como estão a sentir o “regresso”? Está a corresponder ao que esperavam?

Sim, de facto, a indústria do turismo foi das mais afectadas. As empresas do sector estiveram mais de um ano com perdas de 60% a 70% nas suas receitas. Mas já começamos a sentir sinais de retoma. No Verão, sobretudo entre a segunda semana de Agosto e até ao início do ano escolar, houve bons resultados, sobretudo graças à procura de portugueses. Mas também começaram a ressurgir os mercados internacionais, embora ainda cerca de 50% a 60% abaixo de um ano normal.

Nesta fase, com a entrada na época baixa, sabemos que enfrentaremos meses de inverno duros. Mas encaramos este momento com esperança, porque temos sinais positivos que parecem mostrar que o turismo e as viagens estão a retomar e a voltar a ter um papel importante na economia. Os fluxos turísticos europeus e dos EUA e Brasil, que são muito importantes para nós e para a procura nas cidades portuguesas, está lentamente a voltar. Também o segmento dos eventos empresariais – reuniões, encontros, congressos – já começa a mexer, com muitas empresas a remarcar e a realizar com rapidez eventos que tinham sido adiados.

Acreditamos que começamos agora a caminhar para alguma normalização.

 

Quais são agora os principais desafios?
Ao nível das empresas, o maior desafio é o equilíbrio financeiro e a capitalização, porque houve muitos meses de paragem e sem receitas. E temos também o desafio de superar este Inverno, já que o Verão não permitiu criar uma almofada para suportar a época baixa, ao contrário do que aconteceria num ano típico. Terão de surgir medidas de apoio ao sector.

Enquanto destino, precisamos de nos empenhar em recuperar a confiança dos clientes e em tirar partido do sucesso que foi o processo de vacinação em Portugal. Isso é uma vantagem de Portugal face a outros destinos que é preciso aproveitar muito bem esse posicionamento. No contacto diário com os nossos clientes estrangeiros, sentimos que escolhem Portugal porque é o país mais vacinado do mundo. Além disso, é essencial continuar a trabalhar para captar novas rotas aéreas, agilizar os processos mais burocráticos, por exemplo relacionados com a renovação de passaportes.

 

A escassez de talento não resultou da pandemia, mas veio agudizar o problema. O que acha que explica este fenómeno, sendo que as taxas de desemprego ainda não baixaram para os valores pré-pandemia?
Acreditamos que a falta de candidatos está relacionada com diferentes factores. Com a pandemia, muitas pessoas mudaram de zona de residência e foram viver para outras regiões ou até países, outras optaram por mudar de ramo de actividade e também há que considerar que neste sector em particular – que vinha crescendo bastante antes da pandemia – há muita procura por parte dos diferentes players.

 

Quais os sectores que mais vos estão a fazer concorrência pelos profissionais?
Da análise que fazemos, o que parece evidente é que a falta de profissionais é transversal a praticamente todos os setores. Além da hotelaria, estamos também na agricultura e na construção e também aí sentimos dificuldades em contratar.

 

O Turismo, e a hotelaria, eram sectores numa fase bastante dinâmica e, atractivos para trabalhar, mas parece que as pessoas perderam confiança. Como é que isso se recupera?
Não creio que se trate de uma perda de confiança ou que esteja directamente relacionado com o sector em si. Mas tendo em conta, como já referido, que o Turismo foi um dos sectores mais afectados pela pandemia, de certa forma, seria expectável que, nesta fase, as pessoas procurassem alternativas, fosse noutras actividades, fosse noutras localizações.

De qualquer forma, acreditamos que com a retoma do sector em pleno, muitos profissionais, que entretanto optaram por trabalhar noutras áreas, vão querer voltar ao sector do Turismo.

 

Dado o actual contexto, o Vila Galé aposta agora na contratação de jovens à procura do primeiro emprego e em trazer profissionais do Brasil. Como estão a desenvolver estas iniciativas? Que resultados esperam obter?
Na gestão de recursos humanos e de talentos, a prioridade da Vila Galé é desde logo reter os quadros actuais, contratar profissionais do sector a nível local e recrutar jovens licenciados nas escolas de hotelaria e profissionais. A expectativa é que estas estratégias representem cerca de 80% das contratações e efectivamente já estão em curso, uma vez que temos estado a fazer muitas contratações, mesmo durante a época baixa. Adicionalmente, e como complemento destas vias, estamos a desenvolver soluções para atrair trabalhadores estudantes, jovens à procura do primeiro emprego e programas de intercâmbio e transferência de colaboradores das unidades do Brasil para Portugal.

 

Que especificidades vem trazer esta aposta? Uma maior necessidade de formação, por exemplo…
Sim, a formação é essencial, mas também a criação de boas condições para acomodar e acolher os novos colaboradores.

 

Em que áreas sentem maior dificuldade de recrutamento? Quer perfis precisam/ procuram?
São sobretudo as áreas operacionais, de restauração, bar, cozinha ou serviços de limpeza.

 

Para além os jovens à procura de 1º emprego e dos profissionais vindos do Brasil, de que outras formas estão a atrair talento?
Estamos bastante empenhados em reter o talento através de vários benefícios para os colaboradores, de formação interna através da academia Vila Galé, partilha de ideias e de inovação nos Vila Galé Labs e de oportunidades de progressão interna.

 

Que plano de recrutanto têm previsto para 2022? Quantas pessoas têm actualmente e quantas querem ter no início do ano?
Actualmente, a Vila Galé tem cerca de 1.100 colaboradores em Portugal e 1.400 no Brasil. Nas épocas altas, estes números têm sempre algum aumento. Mas as necessidades também dependerão do comportamento da procura decorrente da evolução da situação pandémica.

 

Diria que actualmente é mais dificil atrair ou reter talento?
Havendo uma maior procura por parte das empresas, o que é preciso é continuarmos sempre a trabalhar e a inovar para criar programas, propostas, condições de trabalho, de desenvolvimento profissional e de progressão na carreira que sejam atractivas para os colaboradores.

 

Quais os argumentos da hotelaria, e em particular do Vila Galé, como empregador?
Na Vila Galé temos propostas que consideramos bastante atractivas como descontos e ofertas em alojamento até 65% e de até 50% nos serviços do grupo para colaboradores e familiares, prémios anuais de produtividade e seguro de saúde logo após o primeiro ano de integração na empresa. Mas também ofertas no aniversário dos colaboradores, bónus de noites nos hotéis Vila Galé consoante a antiguidade na empresa e vantagens exclusivas junto de parceiros da área da saúde e bem-estar, cultura, ensino, electrónica de consumo.

Há ainda várias iniciativas ao nível da formação continua, hipótese de mobilidade entre Portugal e o Brasil e oportunidades de progressão na carreira, bem como ofertas flexíveis e de acordo com a disponibilidade de cada um, a tempo inteiro ou em regime de part-time. A Vila Galé já foi várias vezes considerada uma das melhores empresas para trabalhar no sector do Turismo e também temos várias distinções na vertente de Recursos Humanos.

 

Nomeadamente quanto estão a recrutar no Brasil, o que torna o nosso país apelativo?
O mais atractivo será desde logo poder ter uma experiência profissional noutro país, de conhecer uma cultura diferente, novos métodos de trabalho e de adquirir mais ferramentas – comportamentais, linguísticas, culturais, profissionais.

 

Que tendências perspectiva para o sector da hotelaria a curto-prazo?
A nossa previsão é que a recuperação para níveis pré-pandemia não aconteça antes de 2023.

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