Ray Dalio e a Liderança pelo exemplo

Por Carlos Sezões, Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders

 

Já perdi a conta às correntes, teorias e modelos de liderança que o século XX e as primeiras décadas deste turbulento século XXI produziram para o mundo da gestão. Nada de mais natural. A complexidade do ser humano, suas necessidades, motivações e expectativas e a sua imprevisibilidade de comportamento num qualquer sistema social, torna o tema da Liderança controverso, apaixonante e que, certamente, nunca será um assunto encerrado.

Muito já se falou, por exemplo, de liderança transaccional, mais focada no processo e no controlo, em que o líder dá e pede algo em troca, no que será essencialmente uma gestão de expectativas e um modelo de recompensas para os seguidores. Já muito se falou do líder transformacional, que aposta numa mobilização emocional e numa mudança disruptiva do meio em que está inserido, desafiando o status quo, cuja principal missão será conquistar as pessoas para esta missão, conferindo-lhe um propósito. Também já foi bastante aprofundada a liderança situacional (o modelo de Paul Hersey e Ken Blanchard), que age sobre as pessoas conforme o seu nível de maturidade de competências e motivação.

Todas as abordagens são bem-vindas e úteis, conforme o contexto. Eu próprio utilizo muitas delas em projectos de executive coaching, quando conduzo programas de desenvolvimento e aperfeiçoamento “one-to-one” com gestores empresariais, ou mesmo em team coaching – desenvolvendo dinâmicas das equipas de gestão. Sejam as questões-chave da motivação/ mobilização, da delegação e empowerment, do estímulo à colaboração, dos processos de tomada de decisão, as “terapêuticas” assentarão em muitos destes modelos conceptuais e nos respectivos guidelines comportamentais.

Mas, quando me perguntam, em contextos empresariais (de consultoria) ou académicos, qual a abordagem mais simples e eficaz de liderança, não tenho dúvidas em responder “liderar pelo exemplo”. Ser exemplo é ter uma conduta que personifique os valores pelos quais nos batemos. Que consubstancie o caminhar de uma estratégia que queremos ver assumida por todos. Que demonstre uma luta intensa, por vezes vista como obsessiva, por objectivos ambiciosos.  Ser líder pelo exemplo significa não estar apenas a gerir o dia-a-dia, a assegurar os processos correntes, de olhar constantemente para o lado e para trás e ver se todos concordam connosco. Liderar pelo exemplo significa olhar em frente, ter uma visão de longo prazo. Mostrar a todos onde podemos chegar, em conjunto, e qual o papel de cada um. Significa estimular o compromisso emocional e a participação. Significa encarar, analisar e ponderar os riscos e tomar decisões com firmeza e sentido definido – explicando sempre os critérios ou valores subjacentes. É saber o momento de meter as “mãos na massa” e descer das cúpulas da decisão para o “campo de batalha” das operações, respirando o mesmo ar de quem, na base, se assegura que a estratégia se concretiza em acções e iniciativas concretas.

E porque trago Ray Dalio, fundador da Bridgewater Associates, para este breve texto? Talvez porque ele personifica, como poucos, o que escrevi atrás. Sendo um dos líderes empresariais mais influentes a nível global, teve um trajecto tumultoso, nada linear, pontuado por realizações fantásticas e fracassos estrondosos. Proveniente da típica classe média americana, hoje, com 72 anos, pode orgulhar-se de ter construído um dos maiores fundos de investimento do mundo. No seu recente livro “Principles”, Dalio partilha as suas linhas e princípios de actuação – de vida, de gestão de investimentos e de liderança de equipas. Princípios de Verdade, diagnosticando sempre “o que” aconteceu, “porquê” aconteceu e aprendendo com os erros.  Princípios de abertura e “transparência radical”, assumindo feedbacks francos e autênticos, sem “paninhos quentes” – e exigindo o mesmo para si, na relação com os outros. Ou o foco nas “Relações Significativas”, que se consolidam quando, numa equipa, todos podem falar abertamente sobre tudo o que é importante, aprender em conjunto e entender a necessidade de responsabilização recíproca, para alcançar a excelência, não se contentando com o razoável.

Em suma, à luz desta perspectiva, é essencial que o líder seja um catalisador de emoções, gerindo o seu próprio ego com equilíbrio, numa atitude de humildade e autenticidade, que sirva de exemplo a todos os que, à sua volta, procuram uma referência. Muito simples, mas na minha óptica, a abordagem mais impactante e eficaz.

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