Trabalharíamos se não nos pagassem por isso? Sugestão para os empregadores

Por Isabel Moço, coordenadora e professora da Universidade Europeia

Talvez a pergunta pareça inusitada, mas a verdade é que é uma pergunta que deveríamos colocar-nos todos os dias e sobretudo agora, face às mais recentes e dramáticas voltas do mundo. Qual a razão que leva, cada um de nós, a sair das suas casas, a afastar-se diariamente durante várias horas do seu círculo íntimo, a dar o melhor de si e até a aceitar coisas com que discorda? As respostas que cada um de nós obtém, deveriam nortear-nos a vida, e talvez se pudesse resumir numa só questão – Trabalharíamos se não nos pagassem por isso?

O trabalho tem que ser algo mais significativo do que uma mera transação, tem de valer muito mais do que aquilo que recebemos em troca do nosso contributo para a empresa. Mas estamos longe disso, e se é certo que as organizações não são feitas (só) à medida das necessidades e expectativas das suas pessoas, pois têm um desígnio para cumprir, também é certo que é muito fácil encontrar pessoas descontentes, desconfortáveis, insatisfeitas e até em sofrimento por terem de “suportar” um emprego com que não se identificam, uma cultura em que não se enquadram (até enquadrariam se fosse a que está nas paredes, nos powerpoints e nos anúncios, mas não aquela em que vivem a cada hora, em cada frase ou olhar) . No entanto, cada vez também é mais frequente encontrar pessoas para quem o trabalho não é só uma obrigação e conseguem dele tirar prazer e satisfação. E nestes novos loucos anos 20, é com emoção que vemos que esta pergunta – Trabalharíamos se não nos pagassem por isso?   – não faz sentido nenhum para os milhões de pessoas que se mobilizam em solidariedade de guerra.

Desde muito jovens que somos determinados com padrões de sucesso, quer a nível social em geral, quer a nível profissional em particular. Este simbolismo de referencia, por exemplo em relação ao valor das profissões, faz com que hoje tenhamos um panorama de escassez em alguns domínios profissionais (por exemplo, profissões tradicionais como seja um eletricista, um mecânico, uma costureira,…) porque há uma determinada expectativa a marcar o percurso profissional que deve ser seguido. Recordo a conversa com o pai de uma estudante de secretariado, médico com uma história familiar de 5 gerações na classe, e que dizia “veja o desgosto da família”. Mas se a filha está feliz e é mesmo isso que deseja, porque não? Viver contrariada e “fazer” por alguma outra razão que não a sua felicidade é, por princípio, completamente errado.

Eventualmente não serão muitos os empregadores que não estejam atentos à escassez de recursos que é característica do mercado atual, aos desafios de se conciliar multiculturalidade e várias gerações, de se acomodarem atitudes distintas face ao trabalho como as dos mais jovens, a necessidade de permanentemente aprender, desaprender e reaprender, entre outros fenómenos, acentuados por este recente e angustiante movimento “The Great Resignation” – Porque saem as pessoas das empresas, mesmo sem ter alternativa de emprego? Que procuram? O que julgam estar a ganhar e a perder? E sobre os que ainda ficam, por que motivos continuam? Nos últimos anos evoluímos décadas nas práticas de relação homem-trabalho-empregador, mas muito vai continuar a mudar, quer para o lado do empregador, quer para o lado do trabalhador. Então, talvez valesse a pena perguntar porque é que as pessoas “cá” trabalham, com frontalidade, honestidade e transparência – talvez não haja muitas surpresas, mas isso só pode significar que estamos em tempos de mudar qualquer coisa.