Cadeiras e pessoas, códigos de barras ou a gestão do talento

Por Catarina Horta
Directora de Recursos Humanos da ANA Aeroportos de Portugal

Se todo o mobiliário e equipamento de uma empresa está devidamente identificado, por que é que não existe a mesma dedicação em relação às pessoas?

Todas as cadeiras das salas das empresas têm uma etiqueta com um código de barras. Todas. Mesmo as mais insignificantes. E isso é algo que me irrita profundamente. Porquê? Porque significa que alguém teve o trabalho de codificar essa cadeira numa lista, de a valorizar naquele momento e estimar a sua depreciação no tempo. Também houve o trabalho de imprimir uma etiqueta com o código de barras, que associará a cadeira à informação e, claro, o trabalho de colocar a etiqueta na cadeira. E, afinal, porque me irrita?

Porque em muitas empresas este trabalho e empenho é feito em relação a cadeiras, outro mobiliário e equipamento, mas não existe a mesma dedicação em relação às pessoas. Não defendo que as pessoas tenham etiquetas; defendo que devemos olhar para o talento na organização de uma forma desassombrada, apreciá-lo e atribuir- -lhe um valor para a organização.

A melhor metodologia que conheço para o fazer é o People Review. Chamemos- lhe assim, chamemos-lhe balanço humano, ou chamemos-lhe o que quisermos. O importante é haver um momento no ano em que cada gestor revê o talento da sua equipa e aprecia o desempenho, as competências e o potencial. Costumo chamar a este trio os três pilares do talento. No caso do desempenho é importante rever o cumprimento de objectivos naquele ano, e ao longo do tempo, e perceber qual é o perfil de desempenho de cada colaborador. Pode ser sempre um overachiver, pode ser alguém estável, com anos de desempenho acima do esperado, pode ser alguém com um perfil de desempenho inconstante.

Em paralelo, há que olhar para as competências, ou seja para os comportamentos que são usados. Podemos estar na presença de um overachiever, sempre acima do esperado no cumprimento dos objectivos, mas com uma atitude individualista e sem olhar a meios para atingir fins. Se o desempenho mede o que se atinge, as competências modelam como se atinge.

E, finalmente, há que falar do potencial – o terceiro pilar do talento, e porventura o mais difícil de medir. Podemos simplesmente avaliar a capacidade de progressão de cada pessoa – pode subir hierarquicamente (quantos níveis), pode assumir outras funções, pode ter missões mais complexas. Também podemos escolher um modelo de avaliação de potencial; estes modelos são tipicamente baseados em competências preditivas de sucesso futuro. Costumo usar o da YSC, que avalia drive, judgement e persuasion. Mas há mais, evidentemente.

É, então, isto o people review? O balanço humano? Digamos que esta avaliação por parte das chefias é só a base de um verdadeiro people review. Porquê? Porque permite fazer uma reflexão sobre cada uma das pessoas da equipa, de preferência de forma colegial e participativa, entre várias chefias da mesma área. Nestas discussões calibram- se avaliações, revêm-se posições, estabelecem-se planos de carreira e de desenvolvimento, discutem-se sucessões. São, na minha opinião, os momentos mais importantes da gestão do talento, com chefias e recursos humanos. Devem acabar com um plano de acção simples e pragmático, para que todos o possam seguir nos 365 dias à volta do sol que virão, e para que o possam rever no 366.º dia.

Confesso que gosto tanto desta metodologia de gestão do talento, aparentemente tão simples, mas infelizmente não tão disseminada quanto desejável, como me irritam com os códigos de barras nas cadeiras. A primeira é um investimento de tempo poderoso e, a segunda, uma minudência burocrática.

Artigo de opinião publicado na Revista Human Resources n.º 89 de Março de 2018.

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