COVID-19. Há novas regras. E destas vez há multas (e até prisão) para quem não cumprir
A situação epidemiológica em Portugal, originada pela doença COVID-19, tem vindo a exigir do Governo a implementação de medidas extraordinárias com vista à prevenção da sua transmissão. As situações de incumprimento levaram à revisão do regime sancionatório.
Por Nuno Cardoso, associado coordenador da Telles
Apesar da tendência actual de evolução da situação epidemiológica, verifica-se que os novos contágios decorrem, frequentemente, de situações de incumprimento das normas de distanciamento físico, em especial em eventos que implicam a aglomeração de pessoas.
Tornou-se necessário, portanto, associar o incumprimento das disposições que visam assegurar a adoção de práticas sociais adequadas à aplicação de sanções administrativas com efeito predominantemente dissuasor.
Com efeito, o facto de terem ocorrido incumprimentos a estas regras evidenciou revelar-se essencial a criação de um regime sancionatório que assegure o escrupuloso cumprimento pela população em geral das medidas que são indispensáveis à contenção da infecção, como são, por exemplo, o dever de manter o distanciamento físico e as medidas destinadas a evitar as concentrações de pessoas, cujas actuais limitações são as de 20, 10, ou 5 pessoas, consoante a situação declarada no local seja, respectivamente, de alerta, contingência ou calamidade.
No indicado contexto, considerando que:
(i) a Lei .º 27/2006, de 3 de Julho, na sua redacção atual, que aprova a Lei de Bases da Protecção Civil, não contém um quadro contraordenacional que seja instrumental ao bom cumprimento das medidas que nele vêm previstas e;
(ii) a circunstância de o artigo 62.º de tal diploma habilitar o Governo a definir contraordenações que sejam necessárias a assegurar o cumprimento dos deveres previstos na regulamentação dos estados de alerta, contingência e calamidade;
Foi ontem publicado o Decreto-Lei n.º 28-B/2020, de 26 de Junho, que estabelece um novo regime contraordenacional aplicável ao incumprimento dos deveres estabelecidos por declaração das situações de alerta, contingência ou calamidade, assim como ao incumprimento dos artigos 12.º e 13.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, na sua redacção actual.
Nos termos do referido diploma legal e enquanto perdurarem as situações de alerta, contingência ou calamidade, com fundamento na situação epidemiológica provocada pela doença COVID-19, encontram-se previstos os seguintes deveres a que estão sujeitas as pessoas singulares e colectivas:
(i) a observância das regras de ocupação, permanência e distanciamento físico nos locais abertos ao público, definidas nas declarações das respetivas situações de alerta, contingência ou calamidade;
(ii) a obrigatoriedade do uso de máscaras ou viseiras para acesso ou permanência nos espaços e estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços, nos edifícios públicos ou de uso público onde se prestem serviços ou ocorram atos que envolvam público, nos estabelecimentos de ensino e creches, no interior de salas de espetáculos, de exibição ou de filmes cinematográficos ou similares e, ainda, nos transportes coletivos de passageiros;
(iii) a suspensão de acesso ao público dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas que disponham de espaços destinados a dança ou onde habitualmente se dance;
(iv) o cumprimento dos horários de funcionamento dos estabelecimentos de comércio a retalho ou de prestação de serviços definidos nos termos das declarações das respectivas situações de alerta, contingência ou calamidade;
(v) a não realização de celebrações e de outros eventos que impliquem uma aglomeração de pessoas em número superior ao definido nas declarações das respectivas situações de alerta, contingência ou calamidade;
(vi) o cumprimento das regras de fornecimento, venda e consumo de bebidas alcoólicas estabelecidas nas declarações das respectivas situações de alerta, contingência ou calamidade;
(vii) o cumprimento das regras relativas aos limites de lotação máxima da capacidade para o transporte terrestre, fluvial e marítimo;
(viii) o cumprimento das regras relativas à restrição, suspensão ou encerramento de atividades ou separação de pessoas que não estejam doentes, meios de transporte ou mercadorias.
A fiscalização do cumprimento destes deveres competirá à Guarda Nacional Republicana, à Polícia de Segurança Pública, à Polícia Marítima, à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica e às Polícias Municipais.
O novo regime sancionatório entrará hoje em vigor e prevê que o incumprimento dos referidos deveres integrará a prática de uma contraordenação, sancionada, a titulo de dolo, com:
- coima de € 100,00 a € 500,00, no caso de pessoas singulares
- e de € 1.000,00 a € 5.000,00, no caso de pessoas colectivas.
- Prevê-se, ainda, que se o incumprimento for imputável a título de negligência, os referidos montantes serão reduzidos em 50%.
Após a notificação da infracção, realizada pela entidade com competência para o processamento da contraordenação, poderá o infractor proceder ao imediato pagamento voluntário da coima, que, neste caso, será fixada pelo mínimo.
No caso de o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contraordenação, será o infractor sempre punido a título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a contraordenação praticada e que serão, consoante o caso e pelo período de tempo estritamente necessário à reposição da legalidade:
- o (i) encerramento provisório do estabelecimento e
- a (ii) cessação de actividades e a determinação da dispersão da concentração de pessoas em número superior ao limite permitido por declaração de situação de alerta, contingência ou calamidade, declaradas ao abrigo da Lei de Bases de Protecção Civil.
Se a autoridade competente advertir uma pessoa singular ou uma pessoa coletiva de que a desobediência a qualquer um dos deveres que acima se expuseram constituirá crime, quem faltar à obediência devida será sancionado:
- com pena de prisão até um ano ou com uma pena de multa até 120 dias, sendo que a pena de multa em que incorrem as pessoas singulares oscilará entre o montante mínimo de € 50,00 e o montante máximo de € 60.000,00 e a pena de multa susceptível de ser aplicada às pessoas colectivas encontra-se compreendida entre o montante mínimo de € 1.000,00 e o montante máximo de € 1.200.000,00.
Por sua vez, no caso de desobediência a ordem legitima de dispersão de reunião pública dada pela autoridade competente e com advertência de que a desobediência constituirá crime, os cidadãos intervenientes nessa reunião incorrerão:
- na prática de um crime de desobediência a ordem de dispersão de reunião pública, punível com pena de prisão até um ano ou com uma pena de multa até 120 dias.
O tipo penal não incluirá, portanto, a ordem dada pessoalmente a um interveniente da reunião pública para dela se afastar. Esta ordem com um destinatário individual estará antes sujeita à tutela penal do crime de desobediência simples, punível igualmente com pena de prisão até um ano ou com uma pena de multa até 120 dias, sendo que a pena de multa em que incorrem as pessoas singulares oscilará entre o montante mínimo de € 50,00 e o montante máximo de € 60.000,00.
Porto, 27 de Junho de 2020