É (ou ambiciona ser) jogador profissional de poker? Sabe que impostos recaem sobre os ganhos?

A tributação do jogo em Portugal foi alvo de diversas alterações ao longo dos anos e assenta, maioritariamente, na tributação das entidades exploradoras e numa visão dos ganhos obtidos resultarem da sorte, fruto dos chamados “jogos de fortuna ou azar”. A Rogério Fernandes Ferreira & advogados reuniu informação sobre o tema.

 

Os ganhos provenientes dos Jogos e Apostas Online em Portugal são tributados, segundo as regras definidas no RJO, na esfera das entidades exploradoras, e não na esfera individual do jogador. As entidades exploradoras estão sujeitas ao Imposto Especial sobre o Jogo Online – e não sujeitas a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), nem a Imposto do Selo –, que é cobrado, mensalmente, pelo Instituto do Turismo de Portugal, I.P., através da sua Comissão de Jogos e do seu Serviço de Regulação e Inspeção de Jogo.

Este imposto, especial, incide sobre a receita bruta da entidade exploradora à taxa de 25%, integrando a referida receita bruta o valor cobrado a título de comissões cobradas ao jogador.

A visão de que o poker é um jogo de fortuna ou azar conduz à exclusão da conceção da figura do jogador profissional de poker como sujeito passivo de imposto, uma vez que a própria natureza dos jogos de fortuna ou azar não se coaduna com a geração de rendimentos de forma periódica e regular. No entanto, não é possível, à partida, excluir definitivamente a tributação destes rendimentos regulares obtidos pelo jogador profissional de poker online.

Efectivamente, o carácter abrangente da norma de incidência dos rendimentos profissionais ou empresarias (categoria B), prevista no Código do IRS, pode conduzir ao entendimento de que os rendimentos auferidos pelo jogador profissional de poker estão incluídos no âmbito de aplicação dessa norma e, como tal, sujeitos a IRS.

Ora, para se concluir sobre a sujeição a tributação destes rendimentos, é necessário determinar se existem fundamentos para considerar que tais ganhos resultam de uma actividade profissional ou empresarial do jogador, de uma sua fonte habitual de rendimentos, que deverão, concomitantemente, ser sujeitos a tributação, em sede de IRS, como rendimentos.

Poderá sustentar-se que, no poker, os ganhos de um jogador têm origem na sorte, nomeadamente nas cartas que o jogador tem disponíveis versus as dos outros jogadores, e que a eventual perícia do jogador não é determinante na obtenção de ganhos que resultam em rendimentos tributáveis. Neste caso, não poderia entender-se estarmos perante rendimentos de atividades profissionais ou empresariais, pois o carácter determinante da obtenção do ganho não reside em qualquer esforço, capacidade ou ato do beneficiário dos rendimentos.

Contrariamente, poderá argumentar-se que o jogador profissional de poker não obtém os ganhos do jogo com base na sorte. Tais rendimentos são resultantes do desenvolvimento de várias capacidades técnicas e cognitivas, do estudo e da aplicação do seu tempo, as quais permitem melhorias na habilidade e na perícia com que o jogador consegue obter as suas vitórias, mormente online, sobre os adversários.

Esta tem sido, aliás, uma tendência, notória, em crescente expansão, com o surgimento de estudo e formação no jogo do poker e, também, no desenvolvimento de determinadas técnicas que apresentam resultados evidentes na esfera de actuação dos jogadores profissionais.

Ora, nesta vertente, verifica-se que a perícia, a habilidade e as skills do jogador de poker são essenciais para os jogadores atingirem o final dos torneios, nos quais são apresentados prémios significativos (existem torneios com valor de primeiro prémio mínimo garantido de USD 1.000.000).

Parece, pois, poder existir uma base de fundamento para sustentar que o poker não é, afinal, um jogo de fortuna ou azar, podendo, antes, ser qualificado como um jogo de habilidade e de estratégia, envolvendo a aplicação de capacidades, de conhecimentos e de tempo, com carácter de habitualidade, que são geradores da (quase) totalidade dos rendimentos dos jogadores, o que permitirá o respetivo enquadramento fiscal na categoria dos rendimentos empresariais e profissionais (B) do IRS.

Se assim fosse entendido, os jogadores profissionais de poker que aufiram rendimento bruto anual até 200 mil euros estariam abrangidos pelo regime simplificado, ficando obrigados à contabilidade organizada no caso de excederem esse valor. Os rendimentos seriam, então, sujeitos às taxas gerais de IRS, variáveis entre 14,5% e 48% (acrescidas da taxa adicional de solidariedade, variável entre 2,5% e 5% para os rendimentos superiores a 80 mil e 250 mil, respectivamente).

Permanecem dúvidas, porém, sobre se os jogadores profissionais de poker seriam enquadráveis em alguma das actividades a que se refere o (artigo 151.º do) Código do IRS e em que medida lhes seriam aplicáveis os coeficientes do regime simplificado.

Em qualquer caso, a declaração destes rendimentos, em sede de IRS, não é verificada, facto não ajudado pela falta de clareza do legislador quanto à tributação em causa.

Deveria ser, de todo o modo, clarificada a natureza de actividade do poker, como jogo de capacidade ou de habilidade ou como mero jogo de sorte ou azar, de forma a melhor se poder determinar a inclusão dos rendimentos auferidos pelos jogadores profissionais, uma vez que os jogadores amadores, pela própria natureza, ocasional, dos seus ganhos, permaneceriam não abrangidos pela norma de tributação.

Tendo sido constituído pelo Governo, através do Despacho n.º 978/2019, de 28 de Janeiro, o “Grupo de Trabalho para a Avaliação do Regime de tributação dos Jogos e Apostas Online, e do Regime de Exploração e Prática das Apostas Hípicas Mútuas de Base Territorial”, a Rogério Fernandes Ferreira & advogados ser este o momento adequado para clarificar este ponto e para estabelecer, com carácter mais definitivo, o quadro tributário aplicável aos jogadores profissionais de poker.

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