E se a cor dos seus olhos fosse determinante para o sucesso da sua carreira?

Quando a professora primária e socióloga Jane Elliott, em 5 de Abril de 1968, se viu perante a difícil missão de explicar aos seus alunos em Riceville, estado norte-americano de Iowa, porque é que Martin Luther King Jr. tinha sido assassinado no dia anterior, optou por desafiar a turma para um “exercício” que consistia em separar e dar um tratamento diferenciado aos alunos com base na cor dos seus olhos.

 

Por Ricardo Martins, CEO na CEGOC

 

As crianças de olhos azuis receberam reforço positivo como sendo mais inteligentes, bonitas, asseadas e importantes, enquanto as crianças de olhos castanhos foram sujeitas ao tratamento contrário, criticadas ou simplesmente ignoradas. Algumas semanas mais tarde, os papéis inverteram-se, para que todos pudessem sentir “na pele” os dois lados desta experiência social. Os resultados?…quando ignorados ou tratados como “inferiores”, os alunos demonstraram maior tendência para manifestar medo e insegurança, baixa autoestima e dificuldade em completar exercícios relativamente simples, enquanto que se reconhecidos como mais inteligentes, bonitos e até “superiores”, os alunos tenderam para uma atitude mais autoconfiante, mais dominante, um tanto ou quanto sobranceira, mas mesmo crianças habitualmente dóceis e meigas começaram a assumir posturas mais mesquinhas e arrogantes em relação aos colegas. Começaram a surgir disputas, até aí nunca vistas e rapidamente se instalou a noção de hierarquia, poder e direitos. De repente, estimulados por um microcosmo assente na diferença, crianças normais começaram a ter comportamentos típicos de adultos discriminadores e discriminados. O documentário “The Eye of the Storm”, vencedor de um Emmy e baseado nesta experiência de Jane Elliott, gerou polémica e um chorrilho de críticas pela “crueldade” da experiência à qual esta sujeitou as crianças. A resposta dela ao mundo foi… “Experimente viver assim o resto da vida”.Anos depois, continua a ser desafiante e por vezes polémico falar de diversidade e inclusão (D&I) no contexto de trabalho, especialmente quando só vivenciámos um dos lados da história. Ou quando não possuímos empatia suficiente para “vestirmos a pele” do outro e vermos para além dos rótulos – sejam eles de base étnica, religiosa, política, de género, de orientação sexual, ou qualquer outro. O estudo internacional “Diversidade e inclusão nas organizações: desafios e competências de uma transformação cultural”, realizado recentemente pelo Grupo CEGOS junto de 4007 colaboradores e 420 directores e responsáveis de RH (D/R RH) de Portugal, Espanha, França, Alemanha, Itália, Reino Unido e Brasil demonstra que infelizmente ainda muito há por onde melhorar. Apesar de mais de 70% dos colaboradores afirmarem compreender claramente os conceitos de diversidade e inclusão, 82% confirmam ter testemunhado situações de discriminação e 63% admitem ter sofrido na pele pelo menos uma forma de discriminação devido ao seu aspeto físico, idade, género (este sobretudo!) ou origem étnica e cultural.

Embora movimentos internacionais como #TimesUp#BlackLivesMatter#MeToo ou #LGBTQIA+ ecoem nas nossas consciências e ajudem a “despertar” as organizações para a necessidade de reconhecer e repudiar comportamentos discriminatórios, nomeadamente em contexto laboral, o estudo sublinha que apenas 49% dos colaboradores se veem como “promotores” da diversidade na sua organização e 11% como seus “defensores ativos”. Os restantes 36% dizem-se “indiferentes” ou “céticos”, o que demonstra que em termos de D&I ainda temos um (longo?) caminho a percorrer.

A dar-nos algum alento, o facto de tanto colaboradores como DRH’s encararem as gerações mais novas e os seus líderes como os grandes aliados e “guardiões da inclusão e diversidade”. Parece haver mesmo uma revolução geracional em curso: Baby Boomers e Geração X versus Millennials/Geração Y e Geração Z.

O barómetro deixa claro que são os profissionais mais jovens (18-34 anos), os gestores e os mais trabalhadores qualificados quem que mais facilmente percebem (e combatem!) a discriminação no ambiente laboral, em contraste com os colaboradores mais seniores (50-64), os não-gestores e os trabalhadores menos qualificados, que se revelam mais apáticos e até permissivos nesta matéria.

Estas novas gerações, que o World Economic Forum estima representarão mais de 50% da força de trabalho mundial em 2025, são mais proativas em relação às causas que apoiam. Cresceram em plena voracidade digital e por isso têm uma perceção mais global, interconectada e plural do mundo, caraterísticas que as levam a ser mais sensíveis a ambientes de trabalho onde sejam permitidas práticas discriminatórias – tanto que, se tivessem de mudar de emprego amanhã, 84% escolheriam o seu novo empregador baseadas no critério da inclusão.

Dados como estes devem levar-nos a encarar a D&I nas organizações de forma radicalmente diferente. Promover a D&I é muito mais do que contratar e integrar colaboradores que pertencem a minorias. É garantir processos de onboarding e formas de integração que assegurem que todos se sentem elementos valorizados, numa equipa vencedora, a fazer um trabalho com um propósito relevante, num ambiente de confiança, com capacidade de alcançar o seu máximo potencial, independentemente das suas características físicas ou identitárias.

É elevar a combinação de diferentes talentos, experiências, ideologias e perspetivas a um novo patamar de diversidade cognitiva, invisível aos olhos, sim, mas que põe diariamente em marcha um ciclo virtuoso capaz de trazer mais criatividade, agilidade, inovação, competitividade e valor às equipas e organizações que forem capazes de o ver.

Antes de partirmos todos de férias de verão, desafio-o a ler este estudo internacional, disponível gratuitamente para download no site da CEGOC, não apenas porque, baseado em dados recolhidos e analisados criteriosamente por especialistas na matéria, dá voz a um conjunto de tendências emergentes em Portugal e no resto do mundo, mas sobretudo porque o pode encorajar a repensar a sua visão nestas matérias para o futuro, motivando-o a si e aos outros à sua volta para a acção.

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