Economista comenta efeitos que aumento do salário mínimo em 2021 teria em Portugal

O economista João Cerejeira considerou, em entrevista à Lusa, que é “difícil” comparar os efeitos dos aumentos do salário mínimo entre 2013 e 2018 e um possível aumento em 2021, em contexto mais adverso.

 

«Fazer a transposição para um contexto em que estamos numa fase recessiva do ciclo económico é difícil», disse o professor da Universidade do Minho (UM) à Lusa, numa referência a um documento de trabalho (working paper) que elaborou juntamente com os economistas Fernando Alexandre, Pedro Bação, Hélder Costa e Miguel Portela.

O documento em causa, que aguarda validação e publicação como artigo científico, avaliou os efeitos dos sucessivos aumentos do salário mínimo nacional entre 2013 e 2018.

«Eu diria que o paper é válido num contexto de ciclo económico que foi consistente. Desde 2013, foi de crescimento [da economia] e diminuição do desemprego», disse João Cerejeira quando questionado se se poderia cenarizar as consequências do aumento do salário mínimo para 2021.

O economista refere que, «quando o salário mínimo sobe, não afecta de igual forma todas as empresas, como é evidente», dado que «as de grande valor acrescentado, ou muito produtivas, regra geral pagam salários acima do salário mínimo, portanto o salário mínimo não tem qualquer efeito».

A análise do documento versou sobretudo sobre as chamadas empresas zombie – companhias «com elevado stress financeiro», que podem ser mais impactadas pelo aumento do salário mínimo.

«Ou seja, empresas que tecnicamente ou contabilisticamente estariam falidas, mas muitas vezes, por razões até de morosidade dos processos de falência, ou do não reconhecimento como perdas por parte das entidades bancárias, acabam por vir refinanciando as dívidas», e assim continuando no activo.

Segundo João Cerejeira, «o contributo mais interessante do paper é avaliar até que ponto esse aumento de salário mínimo fez acelerar a saída do mercado dessas empresas menos produtiva», sendo «a grande conclusão» a de que a subida do salário mínimo impulsionou a saída do mercado dessas empresas.

«Dado que estamos a analisar um período de crescimento da economia e diminuição do desemprego, a partir de 2013 até 2017, o que verificámos é que as empresas que mais foram impactadas pelo salário mínimo, foram aquelas em que o crescimento do emprego foi mais lento», adiantou.

De acordo com o economista, «o efeito do salário mínimo, por ter aumentado os custos de produção e tirado alguma competitividade a esse tipo de empresas, faz reduzir o crescimento do emprego», salientando que nunca se fala de redução do emprego, mas sim «em redução do crescimento do emprego».

«Depois temos também um efeito nos lucros que vai no mesmo sentido, como é de esperar», acrescenta, argumentando que «se não houver capacidade das empresas de transferir o aumento de custos para os seus preços, as margens reduzem-se e os lucros também», prossegue.

Questionando-se sobre «se isto é bom ou é mau», o professor da UM destaca que ao saírem do mercado de trabalho, as empresas zombie «libertaram recursos produtivos para mão de obra que pudesse ser aproveitada para empresas que estavam em crescimento», acabando também por «libertar o mercado para empresas mais eficientes».

João Cerejeira reconhece, no entanto, que não foi analisado «o que é que acontece aos trabalhadores que eventualmente perdem os empregos por essas empresas terem acabado» ou se houve algum tipo de reorganização nas empresas zombie.

No entanto, remetendo para um seu antigo trabalho de doutoramento, João Cerejeira afirmou que «a subida do salário mínimo induz a empresa a investir mais em capital, e também a substituir menos qualificados por trabalhadores mais qualificados, dado que o preço relativo entre uns e outros se altera».

O académico alerta que «já estamos a verificar um aumento de falências na área da restauração», algo que não está a ser provocado pelo aumento do salário mínimo, mas ao adicionar mais custos «é algo a acrescer à equação que não é favorável».

«A procura, nestes sectores, aumentou durante o período da expansão, e agora está a diminuir», adverte, mencionando ainda o caso «do turismo, da restauração e até de alguma indústria exportadora» como possíveis áreas de risco.

Questionado sobre se o lay-off pode servir como atenuante momentânea para os efeitos do aumento do salário mínimo num futuro próximo, Cerejeira respondeu que «é sempre visto como uma medida temporária».

«Pode adiar algumas decisões de encerramento, mas para contrariar o efeito da subida do salário mínimo não é o mais indicado», assegurou.

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