Está numa empresa onde todos tratam o chefe por senhor doutor ou senhor engenheiro? Provavelmente está no sítio errado, porque a formalidade desumaniza (e endeusa)

Devemos “chamar as coisas pelos nomes” mas não precisamos de arranjar nomes de coisas para quem tem nome. Principalmente quando quem tem nome está à nossa frente – ou melhor, ao nosso lado, como numa equipa. Especialmente quando queremos valorizar precisamente quem está ao nosso lado, no mesmo barco – e, se formos inteligentes, devemos querer sempre.

Por Rui Pinto, CEO e Business Pain Killer da Delta Soluções

 

Desafio:

Relembre-se de uma reunião com um cliente ou parceiro e que tenha estado presente com um ou mais elementos da sua equipa: tipicamente, o(s) “técnico(s)”.

Como apresentou esses seus colegas de equipa (independentemente da posição hierárquica relativa)? Descuidou-se e, sem querer, nem disse o nome? Apresentou apenas «o técnico responsável pela implementação do projecto»?

Existe muita burocracia e formalidade que reforça o uso dessas nomenclaturas, especialmente na administração pública, mas não deixam de ser rótulos, mais ou menos pomposos, que, na essência, tornam as pessoas em classificações que derivam do contexto delas:

É licenciado? É um técnico superior.

Tem um conhecimento forte numa determinada área? É um técnico especialista.

Atende os clientes? É um operador de caixa.

Tudo certo, mas não precisamos de tirar essas classificações do quadro de pessoal para o mundo real – aquele onde pessoas, com nome, estão frente a outras pessoas, também com nome.

Porque é que alguma vez alguém pensou que referir-se a alguém como «operador de caixa» é sinónimo de profissionalismo? Porque é que alguma vez alguém pensou que chamar «técnico» a um responsável criativo ou a um programador, numa reunião com um cliente, é mais apelativo, atractivo, profissional ou credível que apresentá-lo pelo nome e pelo que ele representa?

Trabalho diariamente, de forma mais próxima, com o Hugo, a Beatriz, o Edgar, o Luís, o Pedro, o Rafael e o Ivo. Os meus clientes nunca conheceram técnicos nem equipas técnicas. Todos conhecem «o meu colega [nome], nosso mestre de [área/tecnologia]».

Num registo semelhante, também ficam desconfortáveis quando recebem um email de uma entidade e não vem assinado por quem o escreveu, mas, ao contrário, algo como «equipa de apoio ao cliente»? Eu fico – acredito que muitos de vós também. Se por um lado, a formalidade desumaniza, por outro, em sentido oposto, é uma ferramenta usada para criar distância.

Se entra num novo local de trabalho e todos tratam o “chefe” (reforço o termo “chefe”) por «senhor Dr.» ou «senhor Eng.º», está, com alguma probabilidade, na organização errada.

Há organizações que não desumanizam, mas procuram endeusar os superiores. Queremos mesmo estar numa organização onde, subconscientemente, sentimos que, se estivermos distantes do poder, não temos valor para dar uma sugestão para melhoria (de qualquer tipo)?

Tudo o que fazemos passa uma mensagem (consciente ou não). Há pequenos detalhes que transmitem desconsideração pela pessoa que está, cara a cara, a lidar com um cliente/parceiro da nossa organização. Se não respeitamos nem valorizamos os nossos, na nossa própria casa, que mensagem passamos a potenciais clientes e parceiros?

 

«Sim, quero factura – Obrigado, Paula.»

(foto com autorização da Paula, que tem sempre uma atenção especial – onde parece à partida que não há espaço para isso – que nos faz sentir em casa)

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