Francisca Brito Pereira, NOS: «Não se inova nem se transforma sem a coragem de fazer diferente»

Francisca Brito Pereira, head of Learning and Development da NOS, partilhou na 23.ª edição da Conferência Human Resources a maneira como a organização promoveu uma transformaçao cultural, tendo como “motor” os seus líderes.

 

A caminhada da NOS rumo ao leadershift começou em 2019, no âmbito de uma reflexão estratégica da empresa, que a levou a ter a ambição de liderar a experiência do cliente no digital assente no melhor talento. Tendo esta ambição em mente, a empresa questionou-se sobre a cultura que deveria ter para concretizar esta estratégia. Para obter uma resposta, a NOS efectuou uma análise interna, revela Francisca Brito Pereira. «Com ela, percebemos que precisávamos de uma cultura que nos trouxesse mais flexibilidade, mais autonomia, mais espaço para errar, mais acção e mais agilidade». Assim, a NOS iniciou, em 2020, a sua transformação cultural, que teve início com a concepção de um novo propósito, visão, missão, valores e comportamentos.

«Mas, como todos sabem, uma cultura não se faz por decreto», sublinha, «pelo que começámos por questionar quem seria o motor desta transformação, tendo de imediato a noção de que seriam as nossas e os nossos líderes». Ciente de que os negócios não se fazem de convicções, a NOS foi ao mercado perceber se existiam provas que sustentassem esta nova convicção. «No início de 2020, já sabíamos que as transformações são cinco vezes mais prováveis de serem bem-sucedidas quando os líderes são o modelo da mudança», acrescenta, «50 a 70% do clima da equipa é impactado pela chefia directa, e 83% das organizações afirmam ser importante desenvolver todos os níveis de liderança, mas apenas 5% o fazem, acabando por escolher apenas um dos níveis». Em Março de 2020 irrompe a pandemia, com impactos significativos não só no negócio, mas também na Gestão de Pessoas. «A nível do negócio, teve um enorme impacto na transformação digital», refere. «Estima-se que a pandemia COVID-19 acelerou em três anos a digitalização na interacção com clientes e em sete anos o volume de oferta de produtos ou serviços que são total ou parcialmente digitais, e que o processo de robotização do trabalho foi 40 vezes mais rápido do que aquilo que se esperava.»

 

Esta nova realidade trouxe uma pressão acrescida sobre os líderes, ao nível dos desafios que a gestão de equipas acarreta. Francisca Brito Pereira destaca três que considera mais importantes. «Desde logo, o engagement das equipas, com quase metade dos líderes a referir que gerir relações é o maior desafio em trabalho remoto e híbrido, algo particularmente preocupante quando se fala das novas contratações, pois sabemos que 56% das novas contratações podem sair da empresa nos dois anos seguintes», começa por enumerar a head of Learning and Development da NOS. O segundo grande desafio é o desgaste com a síndrome do “always on”. «A Microsoft contabilizou as reuniões, por isso sabemos que, desde o início da pandemia até agora, houve um aumento de 252% em tempo semanal gasto em reuniões do Teams.» Mas não foi só isto que aumentou; o mesmo aconteceu às horas extra, onde se verificou um aumento de 28%.

Hoje, as pessoas têm diferentes necessidades no que diz respeito à flexibilidade. «Provavelmente, já existiam antes da pandemia, mas foram por ela evidenciadas», sublinha. «73% dos colaboradores dizem agora que querem manter opções de trabalho flexível, e 53% declaram ser mais provável priorizarem o seu bem-estar face ao trabalho do que antes da COVID-19.»

As necessidades das pessoas mudaram. «Será que a liderança acompanhou essas mudanças?», questiona. «Mais de 50% dos managers sentem que a liderança não está preparada para estas novas necessidades.»

«Tendo em conta a nossa convicção interna e estas evidências externas, começámos em 2021 o desenho do novo caminho de liderança», relembra. A primeira coisa que a NOS fez foi perceber «onde é que estamos, para depois perceber onde é que queremos chegar». Estas foram as duas questões que a organização colocou: “Que cultura de liderança temos na NOS?” e “Que cultura de liderança queremos ter no futuro?” Quando se tornou claro a cultura de liderança que a empresa queria para o futuro, a organização precisou de perceber os princípios que devem fazer parte deste novo perfil de liderança e os comportamentos que alimentam esses princípios. «Para dar resposta, fizemos uma auscultação interna profunda com grupo de enfoque a mais de 100 pessoas na organização, um survey aos nossos colaboradores com uma taxa de resposta de mais de 50%, e uma análise às tendências externas.»

Feito isto, a organização chegou aos princípios do líder da NOS. «Estas não são palavras simples — são palavras criadas por nós e fizemo-lo por dois motivos: primeiro, porque não queríamos que fosse mais uma palavra, queríamos que os nossos líderes se lembrassem de quais são os princípios da liderança, e segundo porque percebemos que liderar não é um tema linear, pode muitas vezes ser um tema complexo e de gestão de paradoxos.» Desta forma, a responsável destaca dois princípios: «a “cooperança”, que junta a palavra confiança com a palavra cooperação, e reflecte o nosso empenho em trabalhar num ambiente de confiança na organização, com enfoque na segurança psicológica; e o segundo é “riscoragem”, coragem de arriscar, pois sabemos que não se inova nem se transforma sem a coragem de fazer diferente, por isso olhamos agora para o erro de uma forma diferente, vendo-o como parte de uma jornada de aprendizagem e não como algo catastrófico».

Com estes princípios clarificados, era chegada a altura de fazer o lançamento do leadershift, mas em que consiste exactamente?

«É um movimento cujo objectivo é promover o desenvolvimento e a capacitação dos líderes na NOS», esclarece. Tem a designação de movimento porque a organização quer que seja algo contínuo, «é isto que queremos para o desenvolvimento das nossas lideranças». É um movimento de transformação das lideranças composto por três eixos. «Comunicação: foco no awareness e no engagement com a criação de um manifesto que passa a mensagem do que queremos dos nossos líderes, de um kit de leadershift que não é mais que o conjunto de vários exercícios de auto-reflexão e de reflexão em equipa, e das leadershift talks.»

O segundo eixo é o assessment, com foco no autoconhecimento. «Queremos que as pessoas, no final deste processo, consigam dizer que sabem onde estão e o que precisam de fazer para se desenvolverem e chegarem onde querem estar.» Integrado neste eixo, Francisca Brito Pereira destaca alguns aspectos: «É para todos os 550 líderes da NOS e é um assessment 360, ou seja, tem quatro ângulos de observação e o desenvolvimento como objectivo.»

O terceiro eixo é a capacitação, com foco no desenvolvimento. «Queremos que as pessoas consigam dizer: aprendo e coloco em prática aquilo que aprendo, pois temos de ter sempre em conta que o leadershift foi criado segundo a lógica do fazer.» Para concretizar este eixo, a NOS disponibilizou o livro de John C. Maxwell, “Leadershift: The 11 Essential Changes Every Leader Must Embrace Hardcover”, e avançou com uma iniciativa de coaching individual ou de grupo e com uma formação.

O que espera a NOS do movimento leadershift?

«Queremos ter líderes que conseguem responder melhor às necessidades actuais, não só do negócio, mas também das pessoas», esclarece, «esta é, no fundo, a razão de ser do leadershift.» Mas a NOS pretende ainda ter líderes comprometidos com o seu processo de desenvolvimento e mais motivados. «Em simultâneo, acreditamos e queremos que este projecto não tenha impacto apenas nos líderes», reforça, «queremos também equipas mais alinhadas e eficientes, e uma organização mais ágil, corajosa e equilibrada (uma empresa mais saudável, com pessoas mais felizes).»

Em jeito de conclusão, Francisca Brito Pereira assinala um último ponto: os factores que a NOS acredita serem os mais críticos para o sucesso do movimento leadershift.

«Aqui surge, desde logo, o envolvimento de todos os líderes ao longo do processo. Depois surge a necessidade de uma comunicação regular e próxima, seguida da inclusão de vários ângulos de observação (360), do foco no desenvolvimento versus foco na avaliação, da personalização e da qualidade dos parceiros», termina.

 

Texto: Sandra M. Pinto | Foto Nuno Carrancho

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