Gestão de talento: Desafios para empresas e colaboradores
A gestão de talento apresenta hoje grandes desafios às empresas, que têm de aliar a transformação do mercado do trabalho, com a coexistência entre várias gerações, à sua própria transformação.
Na Randstad o recrutamento e selecção e a gestão de talento têm de ser feitas em duas frentes. Por um lado, os colaboradores para a própria empresa; por outro, os que são seleccionados para trabalhar em empresas clientes. Lígia Mendes, Talent Acquisition Manager de Outsourcing da Randstad, falou com a Human Resources Portugal sobre estas duas realidades distintas.
No caso da Randstad é preciso encontrar talentos não só para o contexto interno, mas também para as empresas vossas clientes. Num e noutro caso, como asseguram o fit perfeito?
Antes de iniciar o processo de identificação de talento, seja para integração interna ou em empresas nossas clientes, realizamos um trabalho prévio que assenta em dois pilares, fundamentais na nossa organização: o colaborador e o cliente. Os nossos profissionais de recrutamento e selecção são treinados para a avaliação de candidatos e têm a vantagem de poder trabalhar com centenas de clientes diversos, que procuram talentos diferentes. Em relação ao cliente, a Randstad aposta em conhecê-lo, as suas culturas, modos de funcionamento e expectativas, antes de avançar para um processo de recrutamento e selecção. É este conhecimento que vai permitir desenvolver conceitos como o da persona – definição do nosso candidato ideal para a função – e ferramentas que permitam reconhecer e comunicar com este candidato ideal. Podemos ainda referir que, actualmente, faz parte do nosso processo a identificação de competências que serão muito úteis no momento de rápida transformação que se vive nas empresas, nas quais a tecnologia tenderá a substituir o humano nas tarefas mais básicas. Destas competências fazem parte a flexibilidade cognitiva, a criatividade, a autoconfiança, a capa- cidade de liderança e a inteligência emocional e social.
Como têm evoluído as expectativas, quer das pessoas em relação às empresas, quer das empresas em relação às pessoas?
Acredito que estas expectativas, embora com uma evolução positiva, ainda se posicionam em níveis diferentes. As gerações mais novas – millennials e a mais recente geração Z – têm tendência a valorizar a progressão na carreira, sendo que esta poderá ser entendida não só como uma progressão clássica, mas também como a possibilidade que a empresa oferece de transitar entre projectos e acrescentar experiência ao currículo. Paralelamente, tendem a valorizar a transparência na comunicação, a justiça na
distribuição das recompensas e a possibilidade de conjugarem trabalho e prazer no exercício das suas funções. As empresas, no entanto, continuam com um foco na procura do candidato totalmente comprometido com a marca e com o projecto, que procura estabilidade e que demonstra valorizar a oportunidade. Estas expectativas elevadas em relação ao compromisso do candidato apenas pecam, em grande parte dos casos, porque as empresas se preocupam pouco em comunicar a sua proposta de valor.
São frequentes os anúncios de emprego que se limitam a mencionar descritivos de funções, não contendo qualquer benefício para o colaborador para além do salário. Graças à tecnologia e à era da informação em que estas gerações de candidatos cresceram, o primeiro reflexo destes jovens é o de procurar informação sobre a reputação da empresa, as suas práticas e os benefícios que oferece aos colaboradores.
Nas empresas de menor dimensão e muito dinâmicas, é frequente assistir- -se a um desajuste menor de expectativas. Estas empresas tendem a valorizar a criatividade, a capacidade de adaptação a novos projectos e a capacidade de trabalhar em equipa e com diferentes tecnologias. Se estes factores parecem ajustar-se na perfeição à expectativa das referidas gerações, é na capacidade de formar os colaboradores com menos experiência e de os apoiar na sua progressão que começam os problemas.
Ouve-se muitas vezes as empresas dizerem que há um desajuste entre o tipo de colaborador que se procura e aquele que o mercado oferece. Onde está o problema? Nos candidatos, nas universidades, nas próprias empresas…
Nunca poderá afirmar-se que existe apenas uma origem para este problema. Se, por um lado, os candidatos procuram actualmente uma empresa que os desafie e lhes permita somar conhecimentos, as empresas revelam alguma dificuldade em desenvolver e comunicar propostas de valor que atraiam e retenham o talento que precisam. As universidades, por seu lado, precisam também elas de compreender melhor o ecossistema em que estão inseridas e de promover o desenvolvimento e a valorização das competências pertinentes para a sobrevivência deste mesmo ecossistema.
Não são as notas obtidas na faculdade que farão a diferença na entrada no mundo do trabalho, mas sim a facilidade de relacionar-se, a inteligência emocional, competências digitais, experiências diferentes que tenham permitido o contacto com outras realidades e pessoas, pós-graduações e cursos fora da área da licenciatura. A Universidade ainda não consegue acompanhar a velocidade da transformação do mundo do trabalho, o que torna vital o desenvolvimento de cada vez mais sinergias com o tecido empresarial.
Voltando ao candidato, é importante que este perceba que, assim que se lança na procura de emprego, as empresas têm hoje muito mais meios à sua disposição para perceberem quem é, o que fez, o que faz, o que pretende fazer. É por isso importante que, por um lado, os candidatos construam a sua imagem digital, na qual comuniquem claramente a sua proposta de valor para as empresas; e, por outro, mantenham o foco em viverem diferentes experiências que lhes permitam diversificar as competências que têm a oferecer às empresas. E isto nem sempre é uma realidade. A percentagem de jovens que não estuda nem trabalha, em Portugal, segundo dados do INE, era de 10,1% no último trimestre de 2018. Ora, como também sabemos, o conceito de gap year, em que os jovens param estas actividades para desenvolverem experiências como voluntariado ou viagens, que lhes permitem ganhar ou desenvolver competências, ainda é pouco explorado pelos jovens portugueses. Assim sendo, a grande maioria destes 10,1% de jovens, não fazia efectivamente nada pela sua carreira, no final de 2018. E isto é preocupante e alvo de análise num currículo, tornando-se num factor que desvaloriza o candidato.
Leia o artigo na íntegra na edição de Junho da Human Resources.