Insistir em estruturas hierárquicas rígidas pode ser um erro

Por Diogo Alarcão, Gestor

Ao ler Mintzberg sobre as organizações que não têm cúpulas e bases (“Tops and Bottoms”), e depois de ouvir um frade dominicano dizer que na Ordem dos Pregadores o líder é apenas “o primeiro entre iguais”, questionei-me se é possível ser-se líder sem estar no topo da organização e sem ter um título associado a uma função de chefia ou direção.

A resposta parece-me clara. Sim, é possível.

Ao longo da vida tenho conhecido pessoas que se revelaram verdadeiros líderes nas organizações apesar de formalmente não terem equipas a reportar a si. E como são capazes de o fazer? Desde logo, através do exemplo e coerência no pensamento e ação. Essas pessoas estão, de forma natural e muitas vezes discreta, na primeira linha sempre que é preciso resolver uma crise, ultrapassar um obstáculo, encontrar uma solução para um qualquer problema ou, pura e simplesmente, para dar a mão e ajudar quem precisa. Ao fazê-lo são exemplo para outros, conquistam prestígio, tornam-se respeitáveis aos olhos dos seus pares, são influentes, contribuem para o bem comum, são relevantes para a organização… em suma, lideram e são vistos como líderes.

Conheci também pessoas que se tornaram verdadeiros líderes e promoveram importantes processos de transformação, nomeadamente na estrutura organizacional e na cultura da empresa, apesar de não terem reportes hierárquicos formais (muito habitual em estruturas matriciais). Fizeram-no sendo coerentes nas opiniões e atitudes que tomaram, mas também porque compreenderam que a liderança se exerce mais pela influência do que pelo exercício da autoridade. Essas pessoas raramente invocam o seu poder formal para fazer valer as suas opiniões e ouvem mais do que falam, para além de terem uma preocupação genuína e constante em estar próximo das equipas para as compreenderem e “sentirem”. Por último, mas não menos importante, veem o seu papel na organização como de serviço ao próximo, relegando para segundo plano as suas próprias carreiras e objetivos. Curiosamente (ou não!), são pessoas que geralmente têm excelentes percursos profissionais.

O que têm em comum estes dois tipos de pessoas? A capacidade de se verem como iguais aos outros e, se por alguma circunstância, um dia são investidos do poder formal de liderança nunca esquecerem que apenas são “os primeiros entre iguais”.

Pode o leitor perguntar-se qual a relação com a ideia defendida por Mintzberg. Pois bem, parece-me que organizações assentes em estruturas hierárquicas formais têm menor propensão para verem surgir no seu seio os líderes que acabo de descrever. Quanto mais presa uma organização está a processos decisórios e canais de comunicação assentes em estruturas hierárquicas formais, maior será a propensão para um exercício da liderança autocrático e maior será o fosso entre as chamadas cúpulas e bases. Hoje em dia, esse afastamento pode ser fatal na gestão do capital humano que, como sabemos, é fator crítico de sucesso de qualquer organização.

Não pretendo com isto dizer que a solução passa por modelos holocráticos. Apenas defendo que há espaço para encurtar as distâncias entre os diferentes níveis hierárquicos o que, aliás, tem vindo a ser adotado por muitas organizações na última década. E, mais importante, há espaço para flexibilizar as estruturas hierárquicas formais através de adoção de modelos comportamentais que promovam o exercício da liderança pelo exemplo e incentivem as pessoas em encontrarem o seu propósito na organização independentemente da função que exercem e da estrutura em que estão inseridos.

As organizações que insistirem em modelos hierárquicos rígidos e formais terão, muito provavelmente, maior dificuldade de adaptação e menor agilidade. Pelo contrário, acredito que as organizações que conseguirem libertar-se dessa rigidez estarão a dotar-se de ferramentas que lhes permitirão promover a inovação, estar mais atentas às tendências de mercado, ser mais ágeis do que os seus concorrentes, antecipar tendências, construir culturas mais inclusivas, promover o bem-estar dos seus colaboradores e potenciar o seu capital humano.

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