Mais educação não está a traduzir-se em melhores salários, revela estudo da Fundação Calouste Gulbenkian

O prémio salarial que mais um ano de escolaridade representa para um trabalhador português está a reduzir-se para as novas gerações, num sinal de que a melhoria das qualificações da população portuguesa pode não estar a ser totalmente aproveitada pelo mercado de trabalho. Esta é uma das conclusões de um estudo, promovido pela Fundação Calouste Gulbenkian, dedicado a avaliar as diferenças e semelhanças entre gerações na sua interacção com o mercado de trabalho em Portugal.

 

De acordo com a publicação, o estudo, inserido no projecto dedicado à Justiça Intergeracional, foi realizado pelo professor da Nova SBE e ex-secretário de Estado do Trabalho, Pedro Martins, e verifica como é que evoluíram entre 1986 e 2018 indicadores como os salários, as prestações sociais ou as horas trabalhadas em oito gerações diferentes. A primeira geração é a que inclui as pessoas nascidas entre 1920 e 1929 e a última, as pessoas nascidas entre 1990 e 1999.

O autor encontra, como já tinha sido assinalado por estudos anteriores, a existência, para todas as gerações, de um prémio salarial que é conquistado pelos trabalhadores com maior grau de escolaridade. No entanto, esta análise por gerações revela igualmente que esse prémio se está a tornar menor para as gerações mais recentes.

«O contributo da escolaridade para a melhoria dos rendimentos individuais do trabalho é muito mais significativo para os trabalhadores das gerações mais antigas do que para aqueles nascidos nas últimas décadas, nomeadamente nos anos 80 e 90», diz o estudo.

A publicação revela ainda que segundo os resultados apresentados, para a geração nascida nos anos 1950, o prémio salarial da educação ascende a 9,1%, enquanto na geração nascida nos anos 1990 não passa dos 4,8%. Em declarações aos jornalistas, na apresentação do trabalho, o autor reconheceu o efeito que o alargamento da percentagem da população com mais anos de escolaridade pode estar a ter neste indicador, mas destacou o facto de o prémio encontrado nas gerações mais jovens ser mais baixo do que o detectado noutros estudos realizados no Reino Unido, avançando com outras explicações para o fenómeno, como o facto de o modelo de crescimento económico do país se estar a basear em sectores de actividade que valorizam pouco o nível educativo dos trabalhadores.

A existência de dificuldades acrescidas para as novas gerações na sua relação com o mercado de trabalho é encontrada noutras áreas. O estudo verifica, sem surpresa, que o peso dos contratos a termo é bastante superior nas gerações mais jovens, sendo que há sinais de que estes vínculos tendem a persistir mesmo à medida que estes trabalhadores, agora jovens, vão envelhecendo.

Segundo a publicação, os apoios sociais que o Estado disponibiliza durante a vida activa de um trabalhador, nomeadamente através do subsídio de desemprego, de doença ou de parentalidade, o estudo verifica que estes são «absorvidos em grande medida por trabalhadores mais velhos, o que afecta negativamente a equidade intergeracional no trabalho e na protecção social».

Enquanto a geração nascida nos anos 1940 recebe, em subsídios, um valor correspondente a 68,8% das suas contribuições, a nascida nos anos 1980 recebe apenas 21,6%. Este resultado faz com que Pedro Martins se questione se «o subsídio de desemprego não estará a ser usado como uma ponte entre o trabalho e a aposentação».

O estudo regista ainda o impacto que as condições económicas registadas no momento da entrada no mercado de trabalho têm nos níveis salariais registados por um trabalhador ao longo de toda a sua carreira. De acordo com os números encontrados, uma taxa de desemprego cinco pontos percentuais mais alta no momento da entrada no mercado de trabalho pode representar um salário médio 5% mais baixo ao longo da carreira.

Este resultado constitui uma dificuldade acrescida para as gerações mais recentes, que entraram no mercado de trabalho em décadas com taxas de crescimento médias mais baixas do que as anteriores. E representa um obstáculo muito significativo para aqueles que tiveram o “azar” de procurar o seu primeiro emprego durante uma das recessões que Portugal atravessou.

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