
Mesa de debate. Um futuro do trabalho repleto de oportunidades (com alguns – grandes – desafios)
O último painel da 29.ª Conferência Human Resources juntou Alexandra Brandão (Nova SBE Executive Education), Pedro Sousa (Randstad) e Irene Rua (Doutor Finanças), numa conversa com Pedro Rocha e Silva (LHH/DBM Portugal), sobre desafios e oportunidades do futuro do trabalho: desde humanos com superpoderes (IA) à, por vezes, falta de foco e agilidade, passando pela importantância da adaptabilidade e de temas como a intergeracionalidade, diversidade e inclusão e bem-estar, até, claro, à nova forma de encarar o trabalho.
Pedro Rocha e Silva, director da LHH/DBM Portugal, começou por enumerar algumas tendências que já estão a (e irão) marcar o futuro do trabalho: desde as de origem tecnológica, como a IA, a realidade virtual e o trabalho remoto; passando por aquelas com base mais económica, como o crescimento da gig economy; às de ordem social, com temas de saúde mental e bem-estar, equilíbrio multigeracional e envelhecimento.
Que impacto vai ter a IA na força laboral, «vai ser IA versus humanos ou IA com humanos»? Para Alexandra Brandão, guest speaker da Nova SBE Executive Education, a IA vai dar superpoderes aos humanos. «Não vejo outra maneira de olhar para isto que não seja IA com humanos. É um complemento que nos vai dar superpoderes, porque existem variadíssimas tarefas que vamos conseguir ser muito mais eficientes», como análise de grandes quantidades de dados.
Contudo, destacou que «há competências que nunca vão deixar de fazer parte dos humanos e são aquelas que vão ser de facto diferenciadoras da maneira como somos capazes de abordar estes problemas», como a inteligência emocional, liderança e empatia, a resolução de problemas, a capacidade crítica, a criatividade, a curiosidade, a inovação. Mesmo na área de Recursos Humanos, referiu o «talent marketing» e a «capacidade de termos uma análise muito mais massiva de quais as competências que precisamos, quais as que temos, onde é que as pessoas se podem formar e novas áreas de desenvolvimento».
Ainda assim, a seu ver, nas organizações, por vezes, falta foco e agilidade na forma como endereçam essas temáticas. «Se as empresas não são capazes de identificar quais são os casos de uso estratégicos, pode acontecer que “o já está não passou pela nossa empresa”.»
Ao abordar o tema do trabalho remoto, recordou o ano de 2020, em que «numa semana, pusemos milhares de colaboradores a trabalhar em casa, de maneira eficiente e descobrimos que era possível» e, apesar do grande debate à volta do tema, deu dois exemplos de startups internacionais, «uma localizada em Portugal que dava suporte a todo o mundo e tal não seria possível sem a possibilidade trabalho remoto», e «uma outra com grandes planos de expansão, que não passariam por Portugal, devido à rigidez laboral».
«As ferramentas estão lá, sabemos que somos capazes, sabemos que os colaboradores conseguem responder, sabemos que as empresas conseguem organizar», mas subsistem desafios, concluiu.
Seguidamente, o moderador quis saber qual o impacto da IA na criação e distribuição de empregos. «Estudos recentes apontam que, de facto, vai existir uma degradação líquida do número de empregos», partilhou Pedro Sousa, Sales Management director da Randstad Portugal, explicando que é expectável que a IA vá ocupar alguns, mas muito focado em tarefas rotineiras e sem valor acrescentado, mas, por outro lado, «vai aumentar a procura de outras skills ou outras actividades, nomeadamente na saúde, educação, tecnologia».
E realçou a responsabilidade das empresas e de todo o ecossistema «na conversão, no upskill, no reskill destas pessoas» e de que forma podem ajudar os profissionais, «porque continuamos e vamos continuar a ter uma lacuna de competências». Com competências técnicas que «vão ter uma data de validade muito curta e os profissionais vão ter de ter esta necessidade de se reinventarem e adaptarem», o foco na contratação estará na competências humanas, «o pensamento crítico, a criatividade, a resolução de problemas, o trabalhar em equipa», além das competências técnicas. «Só assim conseguiremos que este crescimento seja positivo e sustentado para todos», defendeu.
Considerando que se tem assistido a um crescimento generalizado da gig economy, mas também de «uma nova geração, que tem um pensamento e aborda o mercado de trabalho de uma perspectiva completamente diferente daquilo que era até agora», o director da Randstad acredita que, no que diz respeito aos vínculos contratuais, terá de haver uma reflexão e uma revisão, porque «à data de hoje, há um conjunto de regras que já não fazem sentido nem para os profissionais, nem para as empresas».
A esse propósito, Pedro Rocha de Silva aludiu a um estudo da LHH Internacional, que mostra que «72% dos colaboradores pensam, ou repensam os seus planos de carreira no máximo de quatro em quatro meses». Para Irene Rua, Chief People Officer do Doutor Finanças, é precisamente esse tipo de posicionamento que exige às «organizações olhar para as suas pessoas, num mercado de trabalho que traz a reboque uma transformação digital inequívoca». E considera que uma empresa competitiva, «que tem a capacidade de atrair e de fidelizar o melhor talento, deve olhar para estes pilares: os avanços tecnológicos, os modelos de trabalho e tudo o que tem que ver com diversidade, equidade e inclusão e ainda o bem-estar».
A CPO realçou que as lideranças têm de olhar para a inteligência artificial – expressão que, a seu ver, deveria ser «inteligência aumentada» – enquanto parceiro estratégico. «Cada vez mais as lideranças têm de perceber que tomar decisões fundamentadas, baseadas em factos, não é uma coisa secundária e vários estudos sustentam que empresas que o fazem têm uma melhor capacidade não só de atracção, mas também de fidelização de talento.»
Chamou também a atenção para a adaptabilidade, expressão mencionada em várias intervenções ao longo da manhã. «Acho que já não existe lugar à resistência à mudança, porque o mundo está aí e a mudança faz parte dele.» Uma vez que «já liderámos de uma forma, estamos a liderar de outra e a forma como vamos liderar no futuro vai também ser diferente», as lideranças têm de entrar numa «versão 5.0», em que «a colaboração não é de todo facultativa e é muito mais do que gerir pessoas, é inspirar pessoas a serem a sua melhor versão».
Não esquecendo o tema da intergeracionalidade, compatibilizar as exigências tanto das novas gerações como dos profissionais mais sénior será igualmente desafiante, admitiu Pedro Sousa. Assistimos à entrada no mercado de trabalho uma geração nova que encara o trabalho de uma perspectiva diferente. «Para eles é tudo muito rápido e imediato. Querem ver o filme, não precisam de ir ao videoclube, vão à Netflix. Uma música é a mesma coisa, querem fazer uma receita, em dois minutos vêem o vídeo e está feito. Quando chegam à sua primeira experiência de trabalho, esperam algo deste género e quando não é, ficam frustrados.»
A seu ver, o grande desafio das lideranças e das organizações para gerir estas novas gerações e, ao mesmo tempo, as gerações mais velhas que têm a experiência e conhecimento consolidado é «trabalhar aquilo que já é feito muito numa perspectiva comercial: a personalização», ou seja ter um plano de carreira definido para cada pessoa, em função das competências que pretende desenvolver, das lacunas que possa ter identificadas, dos estágios da vida em que se encontra e onde poderá querer ir, «sempre com uma visão muito desprendida de “vou investir neste talento, quero fazê-lo crescer e se o perder amanhã, não há problema, porque é bom sinal, fiz o investimento e tive o retorno».
Para terminar, Pedro Rocha e Silva quis saber para que lado da balança pendiam: desafios ou oportunidades? Irene Rua assumiu-se “team oportunidades” sem hesitar e Alexandra Brandão vê o copo não meio cheio mas sim a transbordar. «Para mim, desafios com muitas oportunidades», respondeu Pedro Sousa. «Estamos num momento muito interessante, e se me fosse dada a possibilidade de escolher outro momento no tempo para estar, escolheria este.»