
Os seus colaboradores estão a pedir ajuda para estudar? Que bênção! Aproveite e pague
Por Carlos Hernandez Jerónimo, director do Executive Master em Gestão de Programas e Projetos do ISCTE Executive Education
Estou no momento a entrevistar vários candidatos para o mestrado executivo de Programas e Projectos no ISCTE Executive Education. Para minha surpresa, são já três os alunos que assinalaram, muitos não o fazem por vergonha ou reserva, que vão ou estão a ponderar pedir crédito à banca para se inscreverem no mestrado, sendo que dois deles pediram à empresa ajuda no financiamento parcial ou total e obtiveram resposta negativa. Questionei se tinha a ver com o curso e as respostas foram semelhantes, indicando que não se tratava do curso, a empresa é que não tem essa política ou não foi concedida no caso em concreto.
Não consigo parar de me questionar se as empresas e empresários que todos os dias escuto a reclamar que é difícil contratar porque não há pessoas com as skills adequadas ou são demasiado caras, são as mesmas que estão a negligenciar o olhar atento para dentro e a desperdiçar oportunidades únicas. Tento ser isento e olhar na perspectiva do empresário, eliminando alguns vieses, mas no final a conclusão, com menos emoção e mais racionalidade, mantém-se. Um colaborador que está preparado para contrair um crédito, que pretende estudar nove meses, oito horas por semana e em horário pós-laboral, com a exigência e rigor de uma universidade conceituada como o ISCTE, quer mais do que apenas progredir. Quer transformar. Um em cada dez pode ter a visão, o conhecimento e a capacidade de trazer à empresa novas abordagens que melhoram o modelo operativo, desafiam o modelo de negócio e inspiram inovação real. E basta um. Ignorar este tipo de sinal é desperdiçar esse 1%. É o pescador que não cuida da rede, mas espera voltar para casa com peixe. Aqui aplicam-se bem as velhinhas, mas sempre actuais, palavras de Henry Ford: “Pior do que formar um trabalhador e ele sair, é não o qualificar e ele ficar.” Mais do que nunca, colaboradores que pedem ajuda para estudar são uma bênção. Há que aproveitar… e pagar.
As empresas podem adoptar estratégias eficazes para garantir que o investimento em formação académica traga benefícios para ambas as partes. Uma solução passa por cofinanciar os estudos com base na antiguidade, função ou desempenho do colaborador, associado a um acordo de permanência pós-formação. Também é possível alinhar os trabalhos académicos com os desafios da empresa, aproveitando os projectos dos alunos para resolver problemas reais e gerar soluções práticas. Outra abordagem viável é pedir aos colaboradores que repliquem internamente o conhecimento adquirido, multiplicando o impacto da formação e garantindo que beneficia um grupo mais alargado. Nenhuma destas ideias exige grandes departamentos de RH ou orçamentos milionários. Bastam pequenas decisões: apoiar um curso, pedir a um colaborador para partilhar o que aprendeu ou incluir a formação no plano anual da empresa.
Embora estas estratégias não sejam novas, muitos empresários continuam a não aplicá-las, alegando custos incomportáveis. Contudo, num contexto em que cresce o número de portugueses a trabalhar para o estrangeiro, este tema deveria merecer atenção política. Apesar de existirem apoios públicos, como incentivos fiscais, programas do IEFP e o Cheque-Formação, estes são pouco abrangentes e têm limitações significativas. O Fundo Social Europeu também contribui, mas de forma segmentada e com fraca integração com o meio académico.
São vários os estudos que apontam que a valorização dos colaboradores está intimamente ligada à capacidade das empresas se reinventarem. A maioria das pessoas não quer apenas um salário. Quer sentir que tem impacto, que pode propor melhorias, que pode desafiar o status quo. Um colaborador que vê a sua empresa investir no seu desenvolvimento sente-se empoderado para pensar estrategicamente, propor novas soluções e elevar o desempenho colectivo.
Não tenho dados estatísticos, mas nos cursos executivos em que tenho responsabilidade, percepciono que apenas um quinto dos alunos é financiado pelas suas empresas. Os restantes suportam o custo na esperança de se valorizarem profissionalmente, muitas vezes fora da empresa actual. E quem sabe se entre os nove que saem e o um que fica, não está exactamente aquele que pode redesenhar a forma como operamos, servimos clientes ou inovamos produtos? Esse 1% com visão pode valer mais do que qualquer corte de custos.
Como líderes, temos de decidir: queremos manter tudo como está, ou queremos apostar num futuro em que, por vezes, um simples pedido para estudar é o início de algo maior?