Saúde Mental: precisa-se!

Opinião de Catarina Quintela, director of Corporate Solutions na Porto Business School

A Saúde Mental é um tema que se tem vindo a intensificar na literatura dos últimos anos. Já todos sabemos que vivemos tempos desafiantes: saímos de uma pandemia, entramos numa guerra, estamos numa guerra e surge outra, e por aí adiante. Como também sabemos, este contexto trouxe desafios à vida das pessoas e, consequentemente, das empresas, das organizações e dos negócios que dificilmente se conseguem evitar.

Passamos a maioria do nosso tempo activo no local de trabalho (diferente de “a trabalhar”), razão pela qual o assunto tem vindo a ser cada vez mais discutido no mundo corporativo.

Lembro-me que, não num passado muito distante, falar de saúde mental era tabu e preconceito… Agora, o tema está na agenda, muitas vezes num nível estratégico, das empresas. Mas o problema é exactamente esse: estar na agenda não significa estar nas práticas, no dia-a-dia… Os discursos ainda estão, na generalidade dos casos, distantes das práticas.

Trocando a ordem da expressão, podemos afirmar que à mulher de César não basta parecer, é necessário começar a ser e é necessário provocar mudanças de comportamento nos diferentes planos.

No plano organizacional, passa por desenvolver uma cultura que valoriza a saúde mental e que cria um ambiente de trabalho mais saudável e positivo, o que implica promover o trabalho em equipa, a colaboração e a empatia entre os colegas. A lógica top-down funciona sempre como um catalisador preponderante para aquilo que se quer ver acontecer.

Ao mesmo tempo, passa por dar ferramentas aos colaboradores para lidarem com diferentes esferas da vida como o sono, o exercício físico, o equilíbrio da vida pessoal e profissional, a parentalidade, o foco da atenção, etc, e por definir um conjunto de boas práticas (por exemplo, não ser possível marcar reuniões fora do horário laboral ou seguidas).

No plano das lideranças é importante que o dia-a-dia revele preocupação com o colaborador enquanto pessoa, o que passa por dedicar tempo a conhecer a equipa além da esfera profissional. Os líderes devem demonstrar empatia, apoiar a procura de equilíbrio entre vida pessoal e profissional, promover um ambiente de trabalho positivo e oferecer suporte emocional podem contribuir para o bem-estar mental dos colaboradores.

Acrescento que a comunicação e feedback construtivo são também aspectos fulcrais na saúde mental. Estudos evidenciam que líderes que têm uma comunicação aberta e transparente contribuem para reduzir a incerteza e a ansiedade nos colaboradores. Isto, por sua vez, pode melhorar a saúde mental no local de trabalho.

Por último, no plano individual é importante assumir a importância das diferentes esferas da vida (pessoal, social, familiar, profissional, parental, comunitária) na saúde mental e trabalhar o autoconhecimento com o propósito de definir prioridades na alocação do tempo. Depois é preciso coragem para tomar decisões, assumindo as consequências.

Viver condicionado pelo Calendário do Outlook, sem tempo para nada não faz de um colaborador melhor. Pode apenas significar que não sabe gerir prioridades. Se fizermos a pergunta: o que acontece se não fizermos a tarefa “x” hoje? Vamos ficar surpreendidos, porque, na maioria das vezes não vai acontecer nada. E, muitas vezes, os ganhos de ter dedicado o tempo a outra actividade revelam-se bem superiores.

Estas mudanças trarão certamente inúmeros benefícios às empresas dos quais destaco a retenção de talento, pois empresas que cuidam da saúde mental dos seus colaboradores tendem a reter talento por mais tempo e a redução de custos, uma vez que investir na saúde mental no trabalho pode ajudar a reduzir os custos associados a problemas de saúde mental, como licenças médicas e tratamentos. E os custos do presentismo.

Cuidar da saúde mental no trabalho não deve ser apenas uma questão de compaixão, mas também uma estratégia para melhorar a qualidade de vida dos quadros e o desempenho da empresa. Promover um ambiente de trabalho saudável e equilibrado é uma responsabilidade partilhada.

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