Seis etapas para implementar (com sucesso) a gamificação nas organizações

A gamificação tem vindo a assumir-se como uma forte tendência nas organizações, tendo em vista impulsionar os seus negócios. Mas o desenvolvimento de uma estratégia neste âmbito é um processo complexo. Do desenho à implementação, há uma estrutura conceptual que pode servir como guião para o fazer com sucesso.

 

Por Mário Pinto, coautor do livro “Gamificação Aplicada às Organizações e ao Ensino”, e professor da ESMAD – P.Porto e investigador na área da gamificação, entre outras e Ricardo Queirós, coautor do livro “Gamificação Aplicada às Organizações e ao Ensino”, é professor da ESMAD – P.Porto e investigador na área da gamificação, entre outras

 

O primeiro objectivo da gamificação nas organizações passa por potenciar comportamentos que acrescentem valor e, consequentemente, vantagem competitiva. Desencadear comportamentos desejáveis nos colaboradores, clientes, ou potenciais clientes, no contexto de um determinado ambiente de negócio é, muitas vezes, a chave para o sucesso. Reconhecer, medir e recompensar esses comportamentos são acções que motivam os diversos intervenientes nos processos de negócio para darem o seu melhor, se superarem, reterem talentos ou fidelizarem os seus clientes.

Efectivamente, nos dias de hoje, a gamificação tem vindo a assumir-se como uma forte tendência nas organizações, tendo em vista impulsionar os seus negócios. Um estudo recente da MarketsandMarkets refere que o mercado da gamificação deve crescer de nove biliões de dólares em 2020 para 30,7 biliões em 2025. Para este crescimento contribui o facto de os millennials (geração que nasceu entre 1981 e 1996 e que cresceu a acompanhar o desenvolvimento dos jogos) corresponderem a cerca de 75% da população activa mundial. Tratando-se de uma geração criada com computadores e jogos, é natural que a gamificação contribua para impulsionar o envolvimento e a motivação destes colaboradores.

O desenvolvimento de uma estratégia de gamificação numa organização é um processo complexo, que envolve pessoas, processos e tecnologia. Como qualquer processo, exige alguma formalização, que servirá de base para guiar o processo sustentado do desenho e implementação de um ambiente gamificado.

Vejamos então uma descrição sucinta de cada uma das fases deste modelo conceptual:

 

1. Definir os objectivos do projecto
Um processo eficaz para esta etapa é juntar um conjunto de pessoas representativo da organização que englobe todos os tipos de utilizadores do ambiente a gamificar, listar os possíveis objectivos de forma concreta e priorizá-los de acordo com as suas necessidades.

Comece por listar todos os objectivos potenciais que pretende alcançar com a aplicação da gamificação. Envolva as pessoas que considera serem as mais pertinentes e representativas da organização. Tente ser o mais preciso possível e não se preocupe se a lista se estender em demasia, pois, provavelmente, será encurtada nos próximos passos.

Os objectivos podem ser muito variados e envolver diferentes públicos-alvo. Priorize os objectivos, procure remover as redundâncias e procure fundamentar os objectivos delineados.

 

2. Delinear comportamentos do público-alvo
Depois de definidos os objectivos a atingir com a gamificação, é altura de definir o que se pretende que os utilizadores façam (comportamento) e como será feita essa medição (métricas). Sendo assim, na segunda tarefa, é necessário descrever o comportamento esperado do público-alvo. Aqui, a pergunta principal é: Como é que eu espero que o público-alvo aja durante e depois do projecto? Nesta fase, é necessário especificar as tarefas a desempenhar, definir as métricas de sucesso para todas as tarefas, assim como estabelecer as formas de medir essas mesmas métricas.

 

3. Descrever os utilizadores
Um dos aspectos cruciais no processo de desenho e de implementação de uma estratégia gamificada consiste no estudo prévio dos perfis dos seus futuros utilizadores. Isto é, consiste na análise do público-alvo em termos de perfil, faixa etária, expectativas, motivações, tipos de comportamento, hobbies, etc.

O perfil de um utilizador é uma combinação de vários factores que influenciam o uso do sistema por parte do mesmo e que vão desde o estilo de uso, o seu background, a sua capacidade de aprendizagem e resiliência, a sua motivação, até às suas expectativas e objectivos. Só assim será possível envolvê-los de forma adequada.

Para tal surgiram, ao longo dos anos, várias taxonomias para classificar tipos de utilizadores em contexto de jogos e ambientes gamificados. Uma das mais populares é a taxionomia de Marczewski , que propõe seis tipos de utilizadores: empreendedor, socializador, filantropo, “espírito livre”, disruptor e jogador.

Dos seis tipos de utilizadores, quatro (empreendedor, socializador, filantropo e “espírito livre”) são intrinsecamente motivados pelo domínio (mestria), conexão, objectivos (propósito) e autonomia. Estes utilizadores movem-se sobretudo por factores intrínsecos, tais como a realização pessoal e o prazer da execução das tarefas. Os dois restantes tipos de utilizador (disruptor e jogador) são extrinsecamente motivados pela mudança, descoberta (disruptor) e pelas recompensas que possam receber após a conclusão de tarefas ou actividades (jogador).

 

4. Definir os ciclos de actividade
Um dos grandes objectivos ao aplicar a gamificação num sistema é potenciar a motivação dos seus utilizadores, de forma que estes realizem actividades para concretizar um determinado objectivo alinhado, por exemplo, com a missão de uma empresa.

Nesta quarta tarefa, são definidos os ciclos de actividade no projecto. Trata-se de uma tarefa muito importante, pois o progresso através de um ambiente gamificado não deve ser visto como um percurso meramente linear. Não é assim nos jogos (pelo menos, ao nível global) e não deve ser assim em ambientes gamificados. Caso contrário, teríamos apenas uma série rígida de etapas.

A acção num ambiente gamificado é feita através de ciclos de actividades. Existem dois tipos de ciclos que podem ser desenvolvidos:

Ciclos de envolvimento: descrevem, a um nível micro e interactivo, o que os utilizadores fazem, porque o fazem e o que o sistema faz em resposta;

Ciclos de progressão: fornecem uma perspectiva macro sobre a jornada do utilizador, organizada por um conjunto de desafios intermédios, de modo a que esta atinga um objectivo final.

 

5. Destacar a importância da diversão
No contexto da gamificação, a diversão é definida como o envolvimento prazeroso do utilizador. Um dos maiores erros de quem desenha e implementa a gamificação é esquecer (ou negligenciar) este aspecto, em detrimento do objectivo final. Este é um erro comum que pode ter consequências a médio prazo no que toca ao aumento do descontentamento e tédio dos utilizadores. O objectivo é tornar as tarefas consideradas desagradáveis ou rotineiras em algo mais satisfatório.

Uma forma de aferir se o sistema tem este componente de diversão associada, é fazer a si mesmo as seguintes perguntas: os utilizadores participariam no sistema voluntariamente? Se não houvesse nenhuma recompensa extrínseca oferecida, eles ainda estariam dispostos a participar? Se a resposta for não, deve pensar sobre o que pode tornar o sistema mais divertido.

Esta componente de diversão pode socorrer-se de elementos como narrativa, fantasia, desafio, descoberta, entre outros, que estimulem o interesse e o envolvimento dos utilizadores finais.

 

6. Definir as ferramentas apropriadas
A última tarefa tem como objectivo escolher as melhores ferramentas para o projecto gamificado, para automatizar os processos nele contidos. Nesta fase, o objectivo é aplicar as mecânicas e os elementos de jogos mais adequados, para que as dinâmicas que são desejáveis para o ambiente a gamificar correspondam aos tipos de utilizadores previamente identificados.

Este alinhamento entre os objectivos a alcançar, o perfil de utilizadores que temos pela frente, e a tipologia de elementos de gamificação a implementar é muitas vezes a chave para o sucesso de uma estratégia gamificada, numa organização.

Por exemplo, para um utilizador com perfil jogador, desafios com recolha de pontos e obtenção de badges podem ser elementos adequados; já para um utilizador com um perfil socializador, podem ser mais efectivos elementos e dinâmicas como partilhas em grupos sociais, gostos ou comentários. Um utilizador empreendedor, por exemplo, poderá sentir-se mais envolvido por missões, desafios, progressão por níveis, entre outros.

 

Este artigo foi publicado na edição de Agosto (nº.140)  da Human Resources, nas bancas.

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