![](https://hrportugal.sapo.pt/wp-content/uploads/2021/03/cartos_zezoes.jpg)
Trabalho: local para onde vamos ou algo que fazemos?
Por Carlos Sezões, Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders
Qual o modelo de trabalho que praticam aqui? Quantas vezes tenho de ir ao escritório por semana? É regra geral ou flexível por equipas? São estas as questões que se ouvem em inúmeras entrevistas de trabalho, nestes tempos disruptivos. De facto, a transição do trabalho presencial para remoto nas fases críticas da pandemia, na maioria das funções profissionais de gestão de conhecimento, trouxe a flexibilidade para o foco da atractividade de uma organização. Ou, como diríamos numa linguagem mais técnica, para o centro do seu EVP (Employer Value Proposition). O “teletrabalho” já não é um ingrediente sofisticado acessório, para mostrar modernidade, mas passou a ser uma componente incontornável e requisitada por todos. Voltar a um paradigma de trabalho presencial total não me parece opção viável ou remotamente interessante, para qualquer organização, empresarial ou outra.
Claro que isto traz desafios a vários níveis, para as organizações. Primeiro, a gestão dos fluxos de trabalho e da colaboração (intra e inter-equipas) sem a habitual sincronia de tempo e espaço. Em empresas com os processos de trabalho estruturados, está questão técnica é, talvez, a mais facilmente resolúvel. Um segundo nível, mais complexo, será a questão da liderança. Muitos líderes estão a enfrentar sérias dificuldades em manter o mesmo impacto nestes novos contextos híbridos. Os rituais de gestão presenciais escasseiam em detrimento dos remotos e as mais-valias desejadas de feedback, alinhamento e motivação não são conseguidas de forma tão óbvia. Um terceiro nível é ainda mais premente: a consolidação da cultura e a consequente coesão da organização. Efectivamente, é extremamente difícil (para não dizer impossível) construir os vários “layers” de cultura com uma conexão apenas digital. Crenças, valores, artefactos, normas, hábitos e comportamentos não se conseguem consolidar entre equipas que praticamente só se encontram em modo digital. Isto é bastante visível quando, em muitas empresas, se notam as diferenças na senioridade dos colaboradores. Profissionais que já tinham construído laços e relações de confiança ao longo de vários anos, no mundo pré-pandemia conseguiram, mau grado as dificuldades, manter a coesão das equipas e os níveis de eficácia colectiva. Já muitos dos que entraram nas organizações nos últimos 2 anos, passando frequentemente meses sem verem “ao vivo” os seus colegas, sentem as naturais dificuldades na sintonia com os outros e com a organização.
Ora os desafios para cada profissional são também imensos. Darem o seu contributo individual para a resolução dos problemas e desafios atrás mencionados é uma tarefa, só por si, hercúlea. Mas também gerir da melhor forma este espaço de liberdade e responsabilidade, na óptica do seu tempo e do seu espaço, da sua produtividade individual e deste novo nível de integração entre vida profissional/ pessoal/ familiar.
Sabendo de antemão que existirão ainda inúmeras funções profissionais ainda sem possibilidade de trabalho remoto (exemplos clássicos em áreas como a construção, o atendimento comercial, a agricultura ou a exploração mineira), a digitalização e a automação crescente não permitirão que o tempo volte atrás. O trabalho será cada vez algo que se fará, com um propósito e outputs bem definidos, independentemente do local. Os escritórios serão cada vez menos os locais do sacrifício diário ritualizado, da jornada de 7 ou 8 horas, para serem espaços de conexão, colaboração, debate estratégico, criatividade e inovação. Por enquanto. A história segue dentro de momentos.