Tribunal reconhece pela primeira vez contrato de trabalho de estafeta de plataforma digital

É uma decisão inédita em Portugal após a entrada em vigor, em Maio de 2023, das novas regras do trabalho em plataformas digitais. A empresa ainda pode recorrer, avança o Pblico.

 

Pela primeira vez em Portugal, um tribunal reconheceu o vínculo laboral de um estafeta de uma plataforma de entregas. A sentença do Tribunal do Trabalho de Lisboa, com data de 1 de Fevereiro, deu como provado que o estafeta era um falso recibo verde e devia ter um contrato de trabalho sem termo com a Uber Eats. A empresa assegura que ainda pode recorrer.

As novas regras do trabalho em plataformas digitais entraram em vigor em Maio de 2023, prevendo indícios específicos que permitem reconhecer o vínculo dos estafetas e de outros prestadores de serviços que operam neste sector.

Surge na sequência da acção desenvolvida pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) durante o Verão e que, no caso em concreto, encontrou indícios de que o estafeta estava em situação ilegal, devido à existência de “uma prestação de actividade aparentemente autónoma, mas prestada em condições análogas à de contrato de trabalho”.

Notificada pela ACT para regularizar a situação, a empresa não integrou o trabalhador, tendo o processo sido remetido para o Ministério Público, que deu início a uma acção especial de reconhecimento de contrato de trabalho.

O Tribunal do Trabalho de Lisboa deu agora como provados cinco dos seis indícios da existência de contrato de trabalho previstos no artigo 12.º-A da Lei 13/2023.

O juiz conclui que a Uber Eats fixa unilateralmente o valor dos montantes a pagar ao estafeta pelas entregas que efectua, exerce o poder de direcção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do estafeta, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da actividade.

Além disso, revela o Público, a plataforma digital «controla e supervisiona a prestação da actividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da actividade prestada, nomeadamente através de meios electrónicos ou de gestão algorítmica», assim como «restringe a autonomia do prestador de actividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à utilização de subcontratados ou substitutos».

«Tal prestação desenvolvia-se no âmbito de plataforma digital, mediante a outorga de um contrato de parceiro de entregas independente, mas em que, inter alia, a plataforma controla a actividade do prestador; restringe a sua possibilidade de aceitar ou recusar tarefas; fixa a retribuição para o trabalho efectuado», resume o tribunal, concluindo que «o desenvolvimento dessa relação é de verdadeiro contrato de trabalho».

«Nestes termos julga-se a acção procedente e, em consequência, reconhece-se a existência de um contrato de trabalho, sem termo», com a Uber Eats, «com início em 1 de Maio de 2023», lê-se na sentença.

A empresa foi contactada pelo jornal, mas garantiu que «ainda não recebeu qualquer notificação» do tribunal, abstendo-se por isso de fazer qualquer comentário nesta fase.

 

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