Alvaro Covões e Jorge Rebelo de Almeida concordam: Não se pode esperar pela vacina nem fechar o que é seguro. «Sem empresas não há economia»
Na XX Conferência Human Resources, Álvaro Covões, fundador e director-geral da promotora de espectáculos Everything is New, e Jorge Rebelo de Almeida, fundador e presidente do segundo maior grupo hoteleiro português, o Grupo Vila Galé, falaram sobre a importância das empresas – e das pessoas – na retoma da economia. E de como isso depende de não nos fecharmos em casa.
Por Ana Leonor Martins | Fotos Nuno Carrancho, NC Produções
A “Conversa de Líderes” foi moderada por Ricardo Florêncio, CEO do Multipublicações Media Group, que começou por destacar a necessidade de promover a retoma da economia, pois «sem consumo não há empresas, sem empresas não há economia e sem economia não há país». Para isso é preciso confiança, «o que não é fácil conseguir pois muitas vezes as mensagens que nos chegam são contraditórias: por um lado diz-se às pessoas para ficarem em casa, por outro apela-se ao consumo». E, assim, a primeira pergunta é perfeitamente como conseguir, nas empresas, promover a confiança, neste contexto.
Ressalvando que toda a sua vida tem sido um optimista, «até porque chover no molhado não adianta», Jorge Rebelo de Almeida reconhece que os contornos da actual pandemia tem dificultado a passagem de mensagens de confiança, por toda a tremenda imprevisibilidade que a rodeia. E também por isso – e porque não gosta de ser injusto – considera que é preciso alguma contenção nas críticas, pois os políticos não têm um papel fácil, «ter de tomar decisões em cima da falta de conhecimento, desde logo da doença».
Ainda assim, e sendo que, felizmente não estamos em guerra e as infraestruturas continuam intactas, não percebe como se pode recomendar que «fiquemos escondidos, se o que se pretende é que as organizações estejam a trabalhar. As organizações têm que ter líderes, e os líderes têm que dar o exemplo, ainda que isso seja penoso e mais difícil.» Mas acredita que o seu papel é continuar a fazer coisas. E é isso que tem feito no Vila Galé, que nunca parou. Inclusive abriu novas unidades hoteleiras e ampliou outras. «E com vantagens também, porque havia mais disponibilidade das pessoas e mais empenho para resolver as coisas.» Para além disso, «temos que assumir que muito dificilmente vamos ter rapidamente uma vacina que resolva a situação. Não temos outro remédio senão aprender a conviver com o vírus. Temos que ir para a rua, obviamente que com cuidado e com todas as medidas de segurança.»
Para além da hotelaria, e também ligada ao Turismo, está o sector dos espectáculos, que teve uma redução brutal de actividade, «de 85 a 100%», concretiza Álvaro Covões. O que temos feito internamente é fundamentamente trabalhar para o “day after”. Existe uma oportunidade grande para nos prepararmos. Acredito que os testes rápidos podem ser o futuro. Neste momento só se está a testar quem tem sintomas e isso não é solução. Foi o que se fez na Fórmula 1 este fim-de-semana, na zona VIP, permitiu aumentar a segurança e que as pessoas interagissem de outra forma, mais descontraída. Na área dos espectáculos, estamos a desafiar o Governo precisamente para isso, para este plano B, caso não se encontre vacina nem tratamento, de fazer testes rápidos nos locais. Isto tem que ser o futuro, temos que encontrar soluções para que a vida volte ao normal. Sem economia não há nada. E o sector privado é que é a base da sociedade, quem produz a riqueza», fez notar.
Por outro lado, ambos estes sectores funcionam como escape para as pessoas. Mas, se não houver confiança, não vão. Jorge Rebelo de Almeira concorda mas ressalva que essa imagem de confiança não pode passar por «coisas balofas e ocas. Não basta dizer “venham à vontade” e por isso, apesar de já termos um nível muito elevado de higiene e segurança, reforçamos. Queremos que as pessoas sintam essa nosso preocupação e cuidado.» Por outro lado, o presidente do Grupo Vila Galé defende que às vezes também é preciso ter bom senso e desdramatizar. «E o facto de as mensagens nem sempre serem claras também não ajuda.»
Jorge Rebelo de Almeida sublinhou dois temas que considera fundamentais: a consciência de que temos que fazer alguma coisa para sair desta crise melhor – «é a lei da compensação» -, reinventar qualquer coisa pois há sempre espaço para melhorar; e o Estado reconhecer que não há desenvolvimento económico sem as empresas. «Às vezes parece que estão a discutir coisas de outro mundo e há uma grande desorganização.»
Álvaro Covões concorda que, em primeiro lugar, o Estado devia falar a uma só voz, e isso não acontece. Por outro lado, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) decreta normas e depois não acompanha nem fiscaliza. E defende que não é no recolher obrigatório que está a solução pois quem quiser vai comprar álcool às sete da tarde e junta-se com os amigos numa casa, sem regras nenhumas. Seria preferível ter os espaços abertos, pois esses seguem regras. Dá um exemplo: «Em Agosto, quando reabriram os corredores aéreos tivemos uma invasão britânica e estávamos preparados para isso. Cumpriram-se as regras e mesmo com milhares de turistas não houve surtos. Os surtos estão a acontecer em casa, onde não há regras. É contraditório, o que é seguro é que estão a fechar. As festas ilegais vão continuar a acontecer. Tem é que se alargar o espectro do que é vigiado.»
Perante a pergunta sobre o que deve ser feito, já a pensar em 2021, Jorge Rebelo de Almeida não tem dúvidas: «Como em qualquer situação difícil, a fórmula mais básica e simples funciona – temos que continuar a trabalhar, mais e melhor. A necessidade aguça o engenho. E por isso estamos a reformular processos. Numa situação como esta, temos que nos convencer que não é o António Costa que vai dar a resposta, temos que ser todos nós. Muita gente achou que pandemia era tempo de férias, de não fazer nada. Mas não é. Temos que lidar com isto. E ir para a rua, ao cinema, ao teatro, às lojas… Porque é que já se está a dizer que não vai haver Natal? Se formos para novo confinamento, não sei como vamos sair disto.»
O responsável lembrou ainda que o Turismo toca todos os sectores, não só a hotelaria. «Se está tudo dimensionado para receber 27 milhões de pessoas, se não vierem, não de vai comprar comida, por exemplo. Os brasileiros estão doidos para vir para cá, mas não podem. Temos que promover a confiança, com segurança e rigor. E admitir que temos que fazer melhor. O objectivo deve ser sair desta crise pandémica mais bem preparados para os tempos difíceis que se avizinham.»
No lado dos espectáculos, foi lançado recentemente o movimento #culturaésegura. «Já se realizaram milhares de espectáculos e não houve surto nenhum. Com regras, o risco reduz quase em 100%», acredita o CEO da Everything is New. «O papel das empresas é incentivar ao consumo, em segurança.»
Álvaro Covões destacou ainda que o digital, que foi quem ganhou neste contexto. «Estamos a ser bombardeados para fazer tudo online, mas ao fazer isso está a destruir-se a economia.» E alertou: «Portugal está a perder competitividade, porque o nosso lay-off não apoio as empresas a 100%, continuaram a ter custos. E para ultrapassar a perde de competitividade é preciso ter actividade, ou seja, que as pessoas consumam, que vão a restaurantes, a espectáculos. Temos que fazer mais do que os outros países da Europa e estamos a andar para trás.»
Em relação a 2021, o responsável revela que está a trabalhar para a reabertura. E o país devia estar a fazer o mesmo, para ganhar a “corrida aos turistas” que vai acontecer quando isto passar. «Devíamos estar a definir a estratégia para 2021, para que quem está doido para viajar tenha Portugal no mindset.»