Tendências 2021: Flexibilidade de pessoas ou pessoas flexíveis?

Com as mudanças ocorridas no mercado de trabalho como consequência da pandemia, seja nos modelos de organização, seja pela necessidade de novas competências ou pela crise económica que está a fazer o desemprego disparar, muitas são as dúvidas sobre como será o mundo do trabalho quando as restrições impostas pela COVID-19 já não existirem. E parece existir uma palavra incontornável: flexibilidade.

 

Por Sandra M. Pinto

 

Em mais um pequeno-almoço debate organizado pela Human Resources, este online devido aos condicionalismos impostos pela COVID-19 –, a reflexão proposta foi: “Tendências 2021 – Flexibilidade de Pessoas ou Pessoas Flexíveis? Parece inquestionável que – hoje mais do que nunca –, é crucial para o sucesso das organizações que estas tenham nas suas fileiras profissionais comprometidos, mas que possuam a capacidade de se adequar a um ritmo acelerado de mudança. Do mesmo modo, exige-se maior flexibilidade ao mercado, mas até que ponto a lei o permite? Para dar resposta, convidámos várias sociedades de advogados, sem esquecer a vertente empresarial, dando duas perspectivas de uma mesma realidade. Participaram os especialistas: Madalena Caldeira, sócia contratada da Abreu Advogados, Maria da Glória Leitão, sócia coordenadora da área de Laboral da Cuatrecasas, Nuno Ferreira Morgado, sócio e coordenador da área Laboral da PLMJ, Nuno Troni, director da Randstad Professional, Patrícia Calvário, directora de Recursos Humanos da Essilor, e Rui Valente, partner da Garrigues.

Como mote para a discussão, Nuno Troni fez uma apresentação trazendo vários dados sobre a flexibilidade (ou falta dela) no mundo de trabalho, identificando algumas tendências para o presente ano. E começou por constatar que o confinamento que aconteceu em Março de 2020 teve vários impactos. Desde logo, a utilização do trabalho remoto, que já existia, mas não de forma massiva nem na maioria das empresas, obrigando a uma nova forma de trabalhar. E gerir. Período de adaptação passado, o que podemos esperar de 2021?

Flexibilidade parece ser a palavra de ordem. Sendo que flexibilidade é «a qualidade daquilo que é flexível, que se dobra ou verga facilmente, sem partir», o responsável faz notar que, «hoje, há situações em que estamos sob muita pressão e fora da nossa zona de conforto». Na apresentação que se seguiu, abordou a flexibilidade da perspectiva de quatro grandes dimensões: horários de trabalho; funções; local de trabalho; e modelos de contratação.

 

Dados para reflexão: os profissionais
Em Portugal, 80% dos inquiridos consideram que a pandemia afectou a sua estabilidade profissional, «um valor muito acima da média europeia, de 62%», sublinha Nuno Troni. Já relativamente ao impacto negativo no dia-a-dia do trabalho, a média na Europa é superior à média nacional, e no que respeita à possibilidade de perder o emprego, cerca de metade dos inquiridos, tanto em Portugal como na Europa, considera que o seu empregador o vai ajudar a encontrar um novo emprego. «Não deixa de ser curioso, porque a utilização de Outplacement em Portugal é muito inferior à europeia, até porque, em muitos países, e em algumas condições, a sua utilização é obrigatória, enquanto no nosso país está dependente exclusivamente do facto de a empresa querer ou não oferecer este serviço aos colaboradores», faz notar o director da Randstad Professionals.

O tema da estabilidade profissional destaca-se em Portugal porque «sempre foi um driver muito importante de atracção e retenção de talento, tanto para mudar como para ficar na empresa. Se olharmos para o Índice de Mobilidade, verificamos que em 2018, 2019 e início de 2020, vinha a subir. Mas quando entrámos em confinamento, começou a baixar, e hoje observamos que há muito mais receio de mudar profissionalmente», sublinha Nuno Troni. «Actualmente, os profissionais não querem mudar tão facilmente de emprego.»

Por outro lado, «a escassez de talento continua, com as competências em falta antes da pandemia a continuarem em falta, isto tanto para funções operacionais como para funções qualificadas». O estudo apresentado pela Randstad revela que, em Portugal e na Europa, cerca de metade dos inquiridos considera que vai ser dificil contratar, «até porque há muito mais pessoas desempregadas, mas, de forma simultânea, o número de pessoas ilegíveis a desejar fazer uma mudança profissional tem vindo a descer, algo que é normal em períodos de crise económica». Isto traduz-se numa maior dificuldade em identificar candidatos nos processos de recrutamento.

Outro indicador que tem vindo a sofrer uma subida exponencial é o número das ofertas rejeitadas. «Os candidatos fazem todo o processo de recrutamento, mas quando chegam à altura da decisão, quando é submetida uma oferta, muitas vezes optam por não aceitar.»

Sobre a flexibilidade na contratação, verifica-se que Portugal «é o segundo país da Europa com maior utilização do modelo contrato a termo, com 17%, sendo o primeiro país a Espanha, com 24,3%». Já no que respeita à utilização de profissionais que estão a trabalhar através de empresas de trabalho temporário, a percentagem é, no plano global, relativamente baixa. «Em Portugal, é de 1,1%, ou seja, entre as pessoas que estão com contratos a termo (17%), só 1,1% estão com contrato através de agências de trabalho temporário.».

Na ordem do dia tem estado também o tema do worklife balance, que ganhou uma nova perspectiva com o teletrabalho obrigatório. Sobretudo, levanta-se a questão dos horários. Nuno Troni revela que, «tanto em Portugal – 67% – como na Europa – 71% –, a maioria das pessoas sentiu muita flexibilidade por parte das empresas, que deixaram os seus colaboradores alterarem os seus horários de trabalho para poderem gerir as suas responsabilidades familiares». Onde se encontra uma diferença grande entre Portugal e a Europa é na expectativa que as empresas têm de poder contactar o colaborador fora das horas de trabalho. «Esse número é muito superior em Portugal – 71% contra 58% na Europa –, e aqui entra em equação o direito a desligar.»

O equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal sempre foi um critério de atractividade relevante em Portugal. Dados da Randstad mostram que 52% (mais elevado que na Europa – 47%) dos inquiridos consideram que é o critério mais importante, tanto para mudar de emprego como para ficar no emprego actual. Surge em segundo lugar, porque em primeiro continua o critério dos salários e dos benefícios (66%). «Relativamente à Europa, estamos muito estáveis em 2020 face a 2018 e 2019, pelo que estamos expectantes relativamente aos dados de 2021, para verificar se isto é uma tendência que se vai manter ou não», partilha Nuno Troni.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Março (nº.123) da Human Resources, nas bancas.

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