Paulo Silva, SIVA: A cultura enquanto factor de atractividade e retenção
Paulo Silva, director de Recursos Humanos da SIVA, destaca «se a empresa tiver uma boa reputação, se for guiada pelos valores certos e tiver uma cultura atractiva –incluindo aqui a proposta de valor –, os talentos aparecem naturalmente e vão querer permanecer enquanto se sentirem realizados (não será para sempre)». Leia a sua análise aos resultados do XXXIX Barómetro Human Resources.
«Hoje, quando falamos com jovens profissionais, percebemos que, para a maioria deles, está fora das suas expectativas construir toda uma carreira profissional num contexto com o qual não se identificam e no qual não existam oportunidades de aprendizagem e crescimento, mesmo que a vertente da compensação financeira e benefícios seja muito competitiva. Vários estudos já mostraram que os factores de motivação, sobretudo nos profissionais abaixo dos 35 anos, não se resumem à variável financeira ou benefícios.
No top 5 só se encontra um factor relacionado com a vertente da recompensa – o reconhecimento –, e nem sequer ocupa o primeiro lugar. O US Bureau of Labor Statistics afirma que a permanência média no emprego para os colaboradores da faixa etária dos 55-64 anos é de 9,9 anos, sendo só de 2,8 anos para os colaboradores da faixa etária dos 24-34 anos. Os colaboradores mais novos – os millennials e os da geração Z – querem novas oportunidades de crescimento e novas experiências. Não estão tão agarrados ao conceito de estabilidade como as gerações anteriores. Mesmo sabendo isto, a maioria das abordagens das empresas ao tema da retenção continua a ter por base a compensação financeira.
Várias vezes ouço colegas comentar, desiludidos, que fizeram um enorme esforço para implementar programas de retenção, mas com impacto prático muito aquém do esperado. Na minha opinião, isso acontece porque se implementam programas cheios de lógica e muito atractivos do ponto de vista conceptual, mas que carecem de análise prévia das verdadeiras causas do problema que se quer resolver. Nem todos somos motivados pelos mesmos factores. Mas a retenção de colaboradores não tem de ser um drama. As pessoas vão continuar a seguir os seus interesses e mudar de projecto/carreira para terem acesso a outros contextos e outras aprendizagens.
Muitas vezes, os colaboradores saem porque simplesmente existe uma oportunidade demasiado boa para deixar passar, porque querem mudar de função/carreira, ou porque querem mudar de geografia. Nem sempre a razão tem a ver apenas com a insatisfação no projecto actual. Existem muitos talentos neste mundo global. Se a empresa tiver uma boa reputação, se for guiada pelos valores certos e tiver uma cultura atractiva –incluindo aqui a proposta de valor –, estes aparecem naturalmente e vão querer permanecer enquanto se sentirem realizados (não será para sempre).
O fenómeno actual que se designa “The Great Resignation” não deve, na minha opinião, ser interpretado à margem do contexto actual que a sociedade vive devido à pandemia. Existem alguns factores contextuais que poderão ajudar a explicar este aumento das demissões. A procura de emprego foi colocada em pausa durante a pior fase da pandemia, a favor da segurança do emprego, e quando a situação estabilizou foi reactivada. A permanência em teletrabalho, com a família, serviu para reflectir sobre a vida e algumas pessoas descobriram novos interesses e novas vocações que os levaram a querer fazer uma transição de carreira.
Noutros casos, a desconexão emocional com a empresa e os colegas, provocada pelo trabalho remoto prolongado, levou à necessidade de simplesmente quererem mudar. Em épocas de grande instabilidade generalizada, como a que temos vivido, que geram mudanças na forma como trabalhamos e nos relacionamos nas organizações, julgo que a melhor ferramenta para manter os colaboradores envolvidos no projecto da empresa será uma cultura assente em valores éticos e íntegros e que seja uma declaração inequívoca de quem somos e do que temos para oferecer.»
Este testemunho foi publicado na edição de Janeiro (nº.133) da Human Resources, no âmbito da XXXIX edição do seu Barómetro. Está nas bancas. Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.