Não temos trabalhadores, mas pessoas que trabalham connosco
Insegurança, inteligência artificial e trabalho remoto – três temas que vão marcar 2024. Num contexto de incerteza, de uma coisa não há dúvidas: as pessoas são o recurso mais desafiante de gerir numa organização, representando um crescendo de relevância e desafio para os gestores.
Por Cátia Sá Guerreiro, professora da Área Académica de Factor Humano na Organização e Ética da AESE Business School
O final do ano foi marcado por entrevistas a potenciais participantes que iriamos encontrar nas nossas salas de aula logo no início de 2024, em algum dos programas da AESE, a ter início em Janeiro. Há uma pergunta incontornável neste primeiro contacto: “O que procura neste programa?” As respostas têm sido convergentes com uma das que escutei de alguém que estará brevemente nas nossas aulas: “Certamente que beneficiarei com a sistematização do conhecimento nas mais variadas áreas da gestão, mas… o que hoje mais interpela é a Gestão de Pessoas.”
Sem qualquer reserva, defendo que “a pessoa” é o recurso mais desafiante de gerir numa organização, representando um crescendo de relevância e desafio para os gestores, que nos procuram para aperfeiçoarem as suas competências. Sempre o foi, e hoje é-o de forma ainda mais evidente. E não digo “pessoa humana”, um erro de linguagem certamente, pois só se pode ser pessoa sendo humano, porquanto não há pessoas não humanas. Mais ainda, também rejeito que sejamos ”indivíduos”, mesmo que disso nos apelidem frequentemente. Somos sujeitos de relação e em relação – é isso ser pessoa. E é justamente este ser pessoa que atravessa desafios concretos no tempo presente, que têm de ser encarados com realismo e pragmatismo.
Vivemos tempos e contextos de insegurança, tanto a nível nacional como internacional. Um mundo assolado por guerras em vários quadrantes, com tudo o que isto implica na vida dos países, das famílias, de cada pessoa. Situações de instabilidade política com o impacto evidente e com as quais não gastarei linhas deste artigo. A incerteza sobre tantos temas essenciais impede que a pessoa se sinta segura de o ser, fazendo da insegurança uma realidade que trazemos para 2024, tantas vezes mascarada de atributos que a escondem.
Assim, às empresas coloca-se a obrigatoriedade de construir, providenciar e oferecer segurança às suas pessoas. Temos a convicção de que as empresas que consigam potenciar e garantir a segurança pessoal serão bem-sucedidas. Como? Apostando, por exemplo, no combate ao isolamento dos seus colaboradores, e na confiança como um valor fundamental, e nunca acessório, para relações interpessoais saudáveis. Garantindo apoio, companhia, interesse pela pessoa, a quem deixarão de chamar de “recurso humano”. Uma circunstância concreta a que assistimos é que esta pessoa, que quer ser mais que um recurso, procura hoje formação e conhecimento em matérias de desenvolvimento pessoal. E, pensemos um pouco, não será isto um sinal da procura de resposta para combater pessoalmente a insegurança? A insegurança sobre quem sou, o que valho, quais os meus talentos, quais os pontos fortes a potenciar e os fracos a desenvolver – estratégias de desenvolvimento pessoal que façam de mim, no dia-a-dia, a pessoa que de facto sou.
Se os temas anteriores estão a ferver de urgência, há outro que não pode ser ignorado. Um tema que, por um lado, gera curiosidade e interesse por ser desconhecido, inovador, promissor, embrião com um potencial que não conseguimos definir claramente; por outro lado, um tema que levanta questões éticas, até morais, de gestão de tarefas e até de empregabilidade. Quem me lê já acertou – a inteligência artificial. Também esta matéria será essencial com os dois atributos que a assistem – a inovação e a incerteza – e os impactos para as já referidas pessoas que trabalham.
A terceira componente para 2024 soma-se às duas anteriores, sublinhando ainda mais a importância das pessoas que trabalham. Transportamo-la dos dois anos anteriores, impactou no pós-pandemia, tem desafiado aqueles que, no quotidiano das empresas, gerem pessoas. Um tema que regressa este ano, mas que, na nossa óptica, ganhará com um justo equilíbrio na sua abordagem. Falo do trabalho remoto e dos novos modelos de trabalho. O ano será de ajustamentos, uma vez que estas matérias já entraram na nossa reflexão e tenderão a ganhar solidez e consistência. Que consigamos tratar estes temas, convergindo para o equilíbrio necessário e desejável para cada pessoa e cada empresa.
Este artigo foi publicado na edição de Fevereiro (nº. 158) da Human Resources, nas bancas.
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