A felicidade organizacional… na Administração Local

Desenvolver uma cultura de felicidade organizacional é uma decisão estratégica.

Por Maria Canoa, técnica superior de Recursos Humanos na Administração Local

 

A felicidade organizacional surgiu integrada nas áreas de estudo que procuram relacionar os dados da felicidade como variável mensurável, com as variáveis convencionais da gestão e da economia, e, pode ser definida como o conjunto de comportamentos que gera uma perspectiva estratégica na organização, na qual é possível constatar o envolvimento da liderança e dos trabalhadores, formando uma extensão do conceito de saúde ocupacional.

Desde a sua génese que o ser humano tem no trabalho a forma de alcançar os meios de subsistência e de satisfazer as necessidades primárias, o que o tornou uma acção natural, necessária e a origem dos recursos sociais, materiais, emocionais e psicológicos.

A felicidade no trabalho é um dos temas incontornáveis da actualidade. Do que se ouve e lê, as pessoas querem ser felizes, e querem ser felizes no trabalho e com o trabalho, tornando-a uma matéria próxima da gestão de pessoas, partindo de uma abordagem económica e tendo nas organizações o seu campo de estudo privilegiado, através dos indivíduos que a estas se encontram vinculados.

O estudo “A Felicidade Organizacional na Administração Pública Local” desenvolvido no âmbito académico a partir da questão: “Existe felicidade no trabalho nos trabalhadores na administração local?”, inspirado no conceito Happy Place, procurou conhecer a felicidade organizacional nos doze municípios que integram a Comunidade Intermunicipal do Oeste.

Da revisão da literatura da especialidade foram deduzidas quatro hipóteses e para recolha de dados foi lançado um inquérito, através da aplicação do questionário Happiness Works com dois objectivos subjacentes: a identificação dos factores que geram felicidade, quer na função, quer na organização.

Da concepção do questionário numa escala de tipo Likert de cinco pontos, o resultado do nível de Felicidade Organizacional obtido (3,4) resultou da média da soma das médias dos níveis obtidos da Felicidade na Organização (3,2) e da Felicidade na Função (3,5), o que no domínio da concordância se pode considerar um resultado positivo – Existe Felicidade no Trabalho! – mas que é potencialmente – “Indeciso”.

Dos resultados da análise concluiu-se que a insatisfação com o estatuto remuneratório é um motivo significativo para a saída dos trabalhadores das suas organizações, e, sem nos alhear de que o emprego público garante em parte, segurança e estabilidade, a confirmação surge com o reforço de que os trabalhadores, claramente, não querem mudar de organização.

Concluiu-se que os trabalhadores procuram, através do trabalho, realizar a dimensão que é ter um trabalho com sentido de propósito e significado. Circunstâncias que tenderão a desenvolver o bem-estar psicológico e uma ligação afectiva no contexto organizacional, mas em que a dissonância entre os valores comunicados e os vividos na organização, é intolerável.

O significado do trabalho demonstrou-se uma necessidade para os trabalhadores. Nutrido pelo desempenho e pelas condições em que se realiza, confirmaram-se os aspectos da dimensão eudemónica da felicidade no trabalho. Assim, sendo esta dimensão holística nas organizações um novo paradigma na área da gestão e da liderança, e, como muito do bem-estar no trabalho depende da liderança que aqui se concluiu estar a ter um efeito negativo, confirmou-se como significativa a necessidade do reforço das capacidades de gestão e liderança para promoção da felicidade organizacional.

Este trabalho de investigação começou por se centrar em ideias e conceitos, e transformou-se na vontade de formar uma intervenção pública com o sentido de valorizar e reforçar a autoestima dos trabalhadores públicos, atingidos pela imagem dos serviços a que dedicam o seu trabalho, interessados em serem úteis à sociedade, conscientes de serem um recurso estratégico, capazes de contribuir para o sucesso colectivo e para uma sociedade que valoriza a eficiência e o mérito.

A importância da gestão de pessoas em ter uma visão holística do ser humano reside no conhecimento de que o estudo das emoções melhora a compreensão do comportamento organizacional. Nas realidades que se vivem nas autarquias locais, seja pela necessidade de serem mais atractivas como empregadoras, seja pela gestão da descentralização de competências e integração nos seus mapas de pessoal dos trabalhadores dos organismos cujas competências passam para a sua gestão, aumentando significativamente, num curto espaço de tempo o número de trabalhadores e integrando novas situações de outras culturas organizacionais, os trabalhadores não devem ser considerados uma despesa, mas sim um investimento,  porque é nesta distinção que  se reconhece que o desempenho dos trabalhadores é determinante para as organizações atingirem os seus objectivos.

É impossível melhorar a prestação do serviço público com uma gestão centrada nos destinatários, até porque se a falta de motivação e satisfação dos trabalhadores públicos é um dos sintomas mais sérios do estado de doença da Administração Pública, sem prejuízo das excepções, este sintoma impacta sobretudo na forma como os serviços funcionam.

Perante a limitação de instrumentos na Gestão de Pessoas para o desenvolvimento estratégico no contexto organizacional pelas suas características baseadas na padronização regulamentar e emergente do direito público, cujo expoente máximo se encontra na designação singular de “o regime da função pública”, é urgente a administração local conhecer-se, definir-se e capacitar-se.

O município é o principal agente de desenvolvimento local com uma actuação significativa para o desafio da territorialidade e, em muitas regiões, é o principal empregador, o que é interessante na perspectiva de que o nível de importância que os trabalhadores atribuem a uma função, depende da imagem existente da função.

Em grande parte, a Gestão Autárquica permanece inalterada há anos, baseada em modelos de gestão por vezes pouco objectivos e que são difíceis de mudar, mas, no futuro, o sucesso reside numa actuação que coloca em primeiro lugar, não o poder, mas as pessoas, em que uma perspectiva em priorizar uma dimensão pública da felicidade e da sua contribuição para o que é comum, será imperativa.

Serão precisos autarcas que compreendam e aceitem que o maior desafio da sua governação é a felicidade e o bem-estar das pessoas. E um aspecto determinante para este papel social é o facto de os trabalhadores da administração local, com contrato de trabalho em funções públicas, serem simultaneamente munícipes.

(Santos, M. F. C. C., (2022) “A Felicidade Organizacional na Administração Pública Local”, http://hdl.handle.net/10400.26/42968)

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