A improdutividade versus a formação: um olhar sobre as micro e PMEs em Portugal

Portugal enfrenta desafios significativos no campo da produtividade e formação profissional, especialmente no contexto das Micro, Pequenas e Médias Empresas (PME). Este artigo examina a relação entre a improdutividade das empresas associado à falta de formação adequada dos seus gestores e os seus impactos económicos e sociais.

Por Manuel Sacramento, gestor de clientes na COPS

 

O cenário da produtividade e o défice de formação em Portugal

As Micro e PME desempenham um papel vital na economia portuguesa, representando 78% da totalidade do emprego no nosso país, um número significativamente superior à média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

No entanto, apesar da sua importância, Portugal tem vindo a registar um declínio bastante significativo e preocupante no ranking da produtividade situando-se actualmente como o terceiro país com menor índice de produtividade da União Europeia. Esta tendência é preocupante, uma vez que a produtividade é um dos indicadores cruciais para o crescimento económico e sustentável das empresas e por sua vez do País.

A improdutividade tem colaborado significativamente para que Portugal seja ultrapassado no seu PIB per Capita  pelas economias da Estónia e da Letónia. Sendo actualmente o sétimo país com menor Produto Interno Bruto (PIB) per capita da União Europeia.

A falta de formação e qualificação dos quadros de chefia é apontada como um dos principais impulsionadores da nossa improdutividade. O Observatório das Desigualdades destaca que as qualificações dos portugueses, especialmente nas chefias superiores e intermédias, estão abaixo da média europeia. Mais de um terço dos líderes e gestores de PME em Portugal possuem apenas a escolaridade básica obrigatória, prejudicando a capacidade de tomada de decisões informadas e eficazes.

 

Fuga de jovens talentos

Os jovens acabados de formar em Portugal não encontram salários, estabilidade, motivação e reconhecimento que os leve a permanecer no nosso País, sendo grande parte deles induzidos a procurar alternativas de trabalho fora do nosso País. Quando acabam os seus cursos, 70% destes jovens são aliciados em Portugal com vencimentos inferiores a 1000€ por mês, enquanto no estrangeiro facilmente iniciam uma carreira profissional com mais de 2000€ ou 3000€ por mês, além dos baixos impostos e muitas outras regalias que não encontram na maioria das empresas portuguesas.  Outros factores, além da baixa remuneração, têm colaborado igualmente para esta fuga de jovens formados. Dos elevados impostos à habitação, associado ao sentimento de pertença europeia, são os motivos que mais levam os jovens abandonar o nosso País.

Cerca de 70% dos jovens desempregados em Portugal, entre os 20 e os 34 anos, estão mais predispostos do que qualquer outro jovem da União Europeia a mudar de país como forma de procurar um início de carreira profissional digna e bem remunerada. Este valor é bastante expressivo comparativamente à média europeia, que é de cerca de 50%.

Este aumento significativo na fuga de jovens formados para o estrangeiro tem levado a uma dificuldade acrescida na renovação de quadros qualificados em muitas das PME.

Esta tabela é bastante significativa relativamente à dificuldade dos jovens em Portugal. Somos o País da União Europeia onde os jovens saem em média com 33,6 anos da casa dos seus pais.

Desafios no sector de segurança privada

Segundo dados estatísticos, existe uma lacuna significativa na formação das chefias do sector de segurança privada em Portugal. De acordo com um levantamento realizado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), apenas cerca de 30% dos gestores e directores no sector de segurança privada possuem formação académica ou na área da segurança.

Esta estatística é alarmante, uma vez que a competência técnica e a compreensão das nuances da segurança são factores fundamentais para a tomada de decisões acertadas na gestão da empresa. Além de que ser um bom e experiente conhecedor na liderança operacional do sector da segurança privada, não implica ser um bom conhecedor em áreas tão complexas como, a gestão, recursos humanos ou área financeira.

Há que saber separar as áreas de actuação e reconhecer que um gestor de empresas necessita igualmente de um bom líder operacional do sector para conseguir realizar o seu trabalho com resultados concretos, tal como um líder operacional da segurança privada necessita de um gestor para o desenvolvimento da empresa. É crucial a existência de um trabalho de equipa com uma comunicação aberta onde exista clareza e abertura para discutir ideias. Trabalhar em conjunto para alcançar metas comuns.

Na gestão de qualquer empresa é crucial a elaboração de um plano anual de negócio a curto, médio ou longo prazo no qual sejam apurados os Value Drivers (variáveis de desempenho que afectam os resultados de um negócio), fundamentais para a estratégia de desenvolvimento das empresas. É através deste plano de negócio que são projectados os objectivos, as metas atingir, a gestão de recursos, o propósito da empresa e até a forma como a mesma deve ser gerida.

É importante uma análise cuidada do modelo de negócio a implementar e perspectivas do mercado, para definir correctamente estes factores-chave. Os desvios das metas devem ser sempre alvo de uma análise rigorosa e bastante cuidada com os apuramentos de causa aos seus desvios e a implementação de medidas para sua correcção. Caso contrário, pode tornar-se num acumular de dívidas e situações críticas sem qualquer controlo. Isto são medidas de gestão que implicam a existência de uma equipa de colaboradores bem formados e também conhecedores da área operacional e comercial.

 

O dumping social para a obtenção de lucros:

A falta de formação profissional e neste caso ética profissional de muitos dos “gestores” das empresas de segurança privada (mais de 70% das 72 empresas existentes), tem levado habitualmente à prática do dumping social a níveis nunca anteriormente vistos em Portugal.

O dumping social é objecto de frequente discussão no direito laboral português.  A sua aplicação visa reduzir os custos dos serviços de segurança e vigilância humana, utilizando mão-de obra mais barata através da redução dos direitos laborais dos vigilantes e da habitual fuga ao pagamento de impostos. A sua finalidade no sector da segurança privada está muito centrada nos baixos valores da contratação pública que representam uma elevada parcela do mercado (cerca 60%), conseguindo as empresas desta forma um crescimento da sua quota de mercado, angariando novos clientes com valores abaixo do seu custo real. Esta postura deve-se não só à falta de formação como de fiscalização adequada a nível nacional.

 

Sugestões e recomendações

Para abordar a improdutividade e a falta de formação, é essencial adoptar uma abordagem multifacetada:

  • Investimento em formação: as PME e Micro empresas devem priorizar a formação contínua de seus gestores, abrangendo áreas como gestão financeira, análise de custos, estratégia, ética profissional e liderança. Isso permitirá decisões mais informadas e um melhor planeamento.
  • Incentivos à permanência de jovens talentos: é crucial criar um ambiente atraente para jovens talentos, oferecendo salários mais competitivos, estabilidade e oportunidades de crescimento em Portugal. Isso pode ser alcançado por meio de parcerias entre o sector público e privado.
  • Implementação de boas práticas no sector de segurança privada: o sector deve estabelecer padrões rigorosos de formação e ética, promovendo a profissionalização e a melhoria da qualidade dos serviços.
  • Profissionalização dos supervisores de segurança privada. é urgente a criação desta categoria profissional obrigando a uma formação específica.
  • Aumento significativo na fiscalização das empresas de segurança privada. Impedindo as práticas de dumping social. Dar início à fiscalização com as equipas multidisciplinares constantes na lei 46/2019 de 8 Julho.
  • Regulamentação da lei 46/2019 de 8 Julho e aplicação das medidas criadas para o controlo das más praticas laborais.
  • A criação de valores mínimos sustentáveis na contratação pública.
  • Elaboração de relatórios de avaliação dos serviços prestados pelas empresas na contratação pública. Impedindo dessa forma que empresas incumpridoras voltem a concorrer.
  • Apoio à gestão eficiente: as empresas de segurança privada devem adoptar práticas de gestão eficientes, incluindo a elaboração de planos de negócios detalhados, análise de custos, implementação de centros de custo e estratégias de pricing adequadas.
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