Afinal, a empresa pode ler os emails pessoais dos colaboradores? Se for do computador (ou telemóvel) do trabalho, podem. Há no entanto uma ressalva

A questão é recorrente, a empresa pode ler emails pessoais? Independentemente do que dizem a lei europeia ou as instâncias de cada país, a chave da questão reside na política do empregador, por um lado, e no bom senso das partes envolvidas, por outro. O Ekonomista explica.

 

Os trabalhadores foram advertidos, em 2016, pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos que os seus superiores, a partir dessa altura, iriam poder ler legalmente os seus emails pessoais.

A decisão partiu do princípio de que o trabalhador viola a política da empresa ao usar o computador do trabalho para fins pessoais, e a entidade patronal teria, por isso, o direito de verificar se este estava a realizar efectivamente o seu trabalho.

De acordo com a decisão, os patrões podem monitorizar as mensagens que o colaborador envia apenas durante o horário de trabalho. Esta regra aplica-se não só ao computador do seu trabalho como ao telemóvel da empresa.

No entanto, mais recentemente, o mesmo tribunal decretou que as empresas são obrigadas a dar conhecimento de que estão a monitorizar os empregados. O trabalhador terá de ser avisado ou notificado da possibilidade de a sua empresa poder ler os seus emails pessoais ou outras comunicações, de forma clara e com antecedência.

De facto, o artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos está directamente relacionado com o direito ao respeito pela vida privada e familiar, referindo o seguinte:

«Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros.»

 

Em Portugal, a empresa pode ler os seus emails pessoais?
No nosso país, a Comissão Nacional de Protecção de dados impõe regras muito restritivas à monitorização das comunicações, mesmo aquelas feitas pelos colaboradores de uma empresa no seu horário de trabalho e usando os meios da empresa.

O colaborador tem de ser, obrigatoriamente, informado pela empresa de que está a ser «monitorizado». Além disso, a empresa é obrigada a ter um regulamento interno sobre a sua política de monitorização das comunicações dos colaboradores e estes têm de saber da sua existência.

 

O que diz o Código do Trabalho relativamente a este assunto?
Como sabemos, os tempos evoluem, mas a verdade é que decisões como esta, parecem cada vez mais improváveis em Portugal. De facto, o Código do Trabalho defende a reserva da intimidade da vida privada através do artigo 16º.

Além de salvaguardar que o trabalhador e o empregador devem respeitar os direitos de personalidade de ambas as partes, refere ainda que cabe a ambos guardar reserva quanto à intimidade da vida privada.

Não esquecendo que «o direito à reserva da intimidade da vida privada abrange quer o acesso, quer a divulgação de aspectos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes, nomeadamente relacionados com a vida familiar, afectiva e sexual, com o estado de saúde e com as convicções políticas e religiosas.»

Por outro lado, o artigo 17º do Código do Trabalho está totalmente relacionado com a Protecção de Dados Pessoais e refere que o empregador não pode exigir a um trabalhador que preste informações relativas à sua vida privada, salvo quando estas sejam «estritamente necessárias e relevantes para avaliar a respectiva aptidão no que respeita à execução do contrato de trabalho e seja fornecida por escrito a respectiva fundamentação».

A verdade é que os tempos estão a evoluir e há decisões que parecem improváveis em Portugal. Contudo, a legislação laboral portuguesa defende os chamados «direitos de personalidade dos trabalhadores» – proibindo assim práticas intrusivas por parte dos empregadores.

Por exemplo: a lei diz que o trabalhador goza do «direito de reserva e confidencialidade relativamente ao conteúdo das mensagens de natureza pessoal e acesso a informação de carácter não profissional que envie, receba ou consulte, nomeadamente através do correio electrónico».

Assim, o empregador pode estabelecer regras de utilização dos meios de comunicação, sobretudo dos emails, mas está proibido de aceder ao conteúdo das mensagens de teor pessoal que o trabalhador receba ou envie. Aliás, isto será assim mesmo que os meios utilizados sejam propriedade da entidade patronal e ainda que, por exemplo, o trabalhador utilize o email da empresa.

Este princípio só poderá ser quebrado, excepcionalmente, quando existam interesses mais importantes, como no caso de suspeita de prática de crimes em que exista um mandado que permita o acesso.

Sempre que exista algum tipo de controlo ou monitorização (como já referimos), os trabalhadores deverão ser informados de forma antecipada.

Restrições impostas às empresas portuguesas
Para a sua empresa poder ler os seus emails pessoais, tem de obter uma autorização da Comissão Nacional de Protecção de Dados, que sugere sempre estratégias não invasivas de monitorização.

Em algumas empresas, a opção para evitar usos pessoais de meios da empresa tem sido bloquear certos domínios de internet ou o download de software.

Registos em newsletters e download de aplicativos
Independentemente do que diz a lei, é sempre aconselhável que sempre que se registe em algum site, ou em alguma newsletter ou noutro serviço que não esteja directamente relacionado com o seu trabalho, use o seu email pessoal e não o da empresa.

As empresas deverão ter políticas bem definidas, se possível descritas nos contratos de trabalho, que detalhem exactamente o que é permitido fazer com os seus dispositivos de trabalho como os computadores e os telemóveis e o que não é.

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