Afinal, há insubstituíveis: o poder do que é difícil de mensurar

Por Joana Carvalho, autora do livro “Seja o CEO da sua Carreira”

 

Vivemos tempos em que tudo é mensurável: produtividade, desempenho, engagement, satisfação. As empresas procuram métricas para quase tudo o que conta. Mas há coisas que contam e não se medem. O impacto de quem inspira, a confiança que une equipas, a energia que transforma contextos, tudo isso escapa às folhas de cálculo. E, no entanto, é o que sustenta a cultura, o propósito e o sentido de pertença. É nesse território invisível que habitam os insubstituíveis.

Diz-se muitas vezes que “ninguém é insubstituível”, é uma daquelas frases que soam como verdades universais, dita com a mesma leveza com que se afirma que “a vida continua”. E, de facto, as empresas continuam, os cargos são preenchidos e os e-mails não param de chegar e de ser respondidos. Mas quem já experienciou a saída de alguém verdadeiramente marcante sabe que algumas ausências se sentem de outra forma. Não se trata apenas de produtividade ou desempenho, mas de cultura, energia e identidade.

Estudos de comportamento organizacional, como os de Edgar Schein (2010) sobre cultura corporativa, mostram que certas pessoas funcionam como guardiões vivos dos valores e práticas de uma empresa, mantendo a coesão e a consistência do grupo. Há profissionais cuja partida muda o ambiente, as conversas e, por vezes, até o rumo de uma equipa, existem pessoas que não são apenas competentes, são essenciais. São aquelas que unem equipas, inspiram ideias e fazem com que todos queiram ser melhores e quando partem, deixam um silêncio, não só por fazerem falta nas tarefas, mas acima de tudo por fazerem falta na alma do grupo. Esses são os insubstituíveis, não porque mais ninguém possa desempenhar o mesmo cargo, mas porque ninguém o fará da mesma forma. A psicologia organizacional sugere que este tipo de impacto está ligado ao capital social individual, a rede de relacionamentos, confiança e influência que uma pessoa constrói ao longo do tempo.

Os insubstituíveis carregam a cultura sem precisar de a nomear, são a memória viva das equipas, os guardiões dos “porquês”, aqueles que lembram o que faz a empresa ser quem é. Sabem ouvir, desafiar e cuidar, muitas vezes tudo num único gesto. Quando alguém sai, a perda não é apenas de competências, mas de conexão humana, de coerência, de identidade. E é por isso que o maior erro das empresas é acreditar que pessoas se substituem como peças de um puzzle, lugares podem ser ocupados, e que o impacto, a confiança e a energia que essas pessoas criam não se substituem. Estudos sobre modelos de liderança transformacional (Bass & Avolio, 1994), mostram que líderes capazes de inspirar, motivar e desenvolver os outros transcendem as tarefas e deixam legados que perduram muito além da sua presença formal.

Cada um de nós deve ser o CEO da sua carreira, liderar o próprio caminho com clareza, consciência e propósito, mas ser o CEO da sua carreira vai além de planear os próximos passos, é conhecer o seu valor único, aquilo que o torna relevante, distinto e, sim, insubstituível no contexto certo. Não se trata de vaidade, mas de identidade, é sobre perceber o que deixamos além das tarefas: como fazemos os outros pensar, crescer e acreditar. No mercado em constante mudança, ser insubstituível não é ser indispensável, é ser memorável. É garantir que, mesmo após a saída, algo do que construímos continua vivo. As teorias de gestão de talentos de Dave Ulrich (1997) reforçam esta ideia ao sublinhar que o verdadeiro valor de um profissional reside não apenas no que faz, mas no impacto duradouro que gera, o chamado capital humano estratégico.

Às empresas, deixo a reflexão: sabem quem são os vossos insubstituíveis? E, mais importante, sabem porquê? Reter talento não é apenas uma questão de incentivos, é de reconhecimento, escuta e sentido de pertença.

Aos profissionais, pergunto: se amanhã deixasse o seu lugar, o que ficaria? Uma função por preencher ou uma marca que continua?

Ser o CEO da sua carreira é também isso, construir um legado que não cabe numa descrição de funções, porque os insubstituíveis não são os que mais falam, são os que mais transformam. E, quando partem, deixam algo maior do que um vazio, deixam saudade. Afinal, há insubstituíveis. E talvez não haja maior prova de impacto do que essa.

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